opinião

Visão do Correio: O peso dos impostos

Correio Braziliense
postado em 20/08/2021 06:00

A decisão da Câmara dos Deputados de adiar a votação do Projeto de Lei 2.337/21, que modifica as regras do Imposto de Renda, por falta de acordo, mostra que o tema está fugindo ao propósito inicial do Ministério da Economia de simplificação tributária na segunda parte da Reforma Tributária. O projeto sofre resistência de empresários e de prefeitos e governadores e não atinge a promessa de isentar rendimentos de pessoa física até o limite de cinco salários mínimos (cerca de R$ 5,5 mil), feita pelo presidente Jair Bolsonaro na campanha das eleições de 2018. As mudanças, que isentam quem recebe até R$ 2,5 mil por mês, reduzem o imposto das empresas por um lado e institui tributo sobre dividendos. O alívio para o contribuinte pessoa física é bem-vindo, mas tem implicações que travam a proposta e expõem distorções na relação entre os entes federados e a União.

Com a correção da tabela do IR das pessoas físicas, há redução no bolo arrecadado, o que afeta repasses aos fundos de participação de estados e municípios. Já para as empresas, o risco é uma sobrecarga fiscal para as micro e pequenas, que são a grande maioria dos empreendimentos brasileiros. Com uma carga tributária próxima a 35% do Produto Interno Bruto e um emaranhado de leis para algumas dezenas de impostos e contribuições, não resta dúvida de que uma reforma tributária é mais do que urgente no Brasil.

Mas, da forma como está sendo encaminhado, o projeto dá margem para reivindicações legítimas de empresários e entes federados. Nas contas da Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite), o projeto pode retirar R$ 16,5 bilhões dos cofres estaduais e municipais. A perda maior é para Minas Gerais, que ficará sem R$ 1,416 bilhão, com impacto mais forte nos cofres municipais. Para aprovar o projeto, a equipe econômica acena com recursos para os municípios. O gesto, criticado até por parte da própria equipe econômica do governo, expõe uma distorção grave do pacto federativo brasileiro. Pacto que vem sofrendo um processo de esvaziamento da autonomia financeira dos entes federados e de concentração de receita fiscal nas mãos da União.

Esse processo acentua a dependência de estados e municípios de repasses do governo federal, seja por convênios, seja por emendas parlamentares. A Constituição de 1988 transferiu para estados e municípios uma série de serviços, mas sem destinar recursos novos e apenas mantendo a fonte a partir dos fundos constitucionais. O problema é que esse bolo era dividido a partir do recolhimento do Imposto de Renda e do Imposto de Produtos Industrializados, que compõem os fundos constitucionais, mas, a partir da década de 1990, a Receita Federal criou várias contribuições, que hoje têm peso na arrecadação e que não entram na divisão com estados e municípios.

Com empresários, prefeitos e governadores brigando por recursos tributários (para pagar menos de um lado e arrecadar mais de outro), o projeto pode ser modificado no Legislativo e não resultar em uma simplificação. O que se espera é que Executivo e Legislativo cheguem a um consenso que represente alívio e simplificação para os contribuintes e preserve os repasses de recursos para os entes federados, para que estes não fiquem ainda mais dependentes da boa vontade de Brasília ou dos parlamentares na hora que precisaremm de dinheiro para arcar com as responsabilidades impostas pela legislação. A reforma corre o risco de se tornar um remendo. E não é disso o que o país precisa.

 

 

 

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