Minha filha, de 9 anos, pediu para a levarmos a uma livraria. Queria comprar um livro de “menina grande”, que pudesse ler por vários dias. Não queria mais as histórias infantis curtinhas, lidas em alguns minutos. Logo eu lembrei que tinha, em casa, Malala — A menina que queria ir para a escola, de Adriana Carranca, escrito especialmente para o público infantojuvenil.
Sugeri a leitura a ela e aproveitei para fazer uma pequena explanação sobre quem era a garota que quase foi assassinada, simplesmente, porque queria estudar. E que, hoje, é uma ativista da educação reconhecida em todo o mundo. Contei como era difícil ser mulher em alguns países que vivem sob o regime de movimentos radicais fundamentalistas, como o Talibã.
Isso me fez refletir sobre a sorte que minha filha tem, inclusive, de podermos conversar sobre isso. Apesar de toda a desigualdade social e dos problemas educacionais que enfrentamos, as meninas brasileiras podem ler o que quiserem, vestir o que bem entenderem e escolher e perseguir seus sonhos.
Entre as cenas chocantes, vindas de Cabul, desde que o Talibã retomou o poder no Afeganistão, uma me chocou mais profundamente. Na tentativa desesperada de salvar os próprios filhos de um futuro temível, mães escalavam uma cerca no aeroporto para entregar suas crianças a militares norte-americanos, na esperança que elas pudessem deixar o país. Quem é mãe ou pai pode tentar entender o tamanho dessa dor.
Em outro vídeo que rodou o mundo, uma jovem afegã, de tranças e com jeito de recém-saída da adolescência, tenta conter o choro: “Tenho de enxugar as lágrimas para ser capaz de fazer esse vídeo”, dizia. Para logo complementar: “Ninguém se importa conosco. Nós morreremos lentamente na história. Não é engraçado?”.
Não. Não é engraçado. É trágico que, em pleno século 21, ainda tenhamos que assistir, impotentes, a cenas como essa. O mais terrível é saber que nem sempre foi assim, que, graças a consecutivas guerras, a sociedade afegã retrocedeu muito. Raras imagens dos anos 1960 mostram mulheres passeando livremente pelas ruas de Cabul, usando minissaias. Antes do Talibã, elas não só eram livres como chegaram a representar 70% dos professores no país; 50% dos funcionários públicos e universitários e 15% do poder legislativo.
Aos meus olhos de mãe, ver o mundo se abrir para a minha filha, enquanto se fecha de modo terrível para aquela jovem afegã, é quase mais do que meu coração pode suportar. Mas a luta pela construção de um mundo melhor é feita de esperança e dor. Seguimos caminhando!
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