opinião

Artigo: Quando setembro chegar

Correio Braziliense
postado em 27/08/2021 06:00

ORLANDO THOMÉ CORDEIRO*

Agosto é o mês em que tivemos acontecimentos dramáticos na vida política brasileira. Suicídio de Getúlio, renúncia de Jânio Quadros, morte de JK, impeachment de Dilma Rousseff são alguns dos fatos marcantes que o tornaram conhecido como o mês do desgosto. Não à toa, o presidente Bolsonaro deve estar torcendo para que esses 31 dias cheguem logo ao fim.

Derrota do voto impresso, investigado no inquérito das fake news e objeto de notícia-crime por vazamento de inquérito sigiloso, ambos no Supremo Tribunal Federal (STF), retomada dos trabalhos da CPI da pandemia, inflação fora de controle, altos preços dos combustíveis, reforma tributária parada, enfim, não faltaram más notícias para ele!

Apesar disso, não se deve criar a ilusão de que Bolsonaro seja carta fora do baralho no jogo político de 2022. Mesmo com todas as pesquisas indicando um significativo aumento na sua rejeição, é notável que ainda consiga manter algo em torno de 25% de aprovação, índice suficiente para colocá-lo no eventual segundo turno caso as eleições fossem hoje.

Por outro lado, ele tem consciência de que o cenário futuro de curto prazo não indica um caminho natural de recuperação. Ou seja, será preciso criar condições para estancar a sangria na popularidade e, para isso, só tem um caminho: recuperar o protagonismo da narrativa, pautando o debate nacional.

É nesse contexto que se inserem as iniciativas de lideranças bolsonaristas retomando os ataques ao STF, cujo ato mais simbólico foi o recente pedido de impeachment do ministro Alexandre de Moraes encaminhado ao Senado Federal no último dia 20. Adicionalmente, resolveram convocar manifestações para o 7 de Setembro com uma pauta centrada na defesa do fechamento da Suprema Corte e na intervenção militar com Bolsonaro no governo. Desde então, a mídia, os partidos de oposição e as instituições da República têm se dedicado quase que exclusivamente a agir reativamente, caindo, mais uma vez, na armadilha!

Porém eles também perceberam que seu potencial de mobilização vem diminuindo. Basta ver as tais motociatas promovidas pelo presidente que não conseguiram reunir volume significativo de participantes. Por isso mesmo mudaram a tática. No lugar de estimular as manifestações simultâneas em cidades nas diversas regiões do país, resolveram concentrar os esforços em dois locais emblemáticos: Avenida Paulista e Brasília.

E, para conseguir mostrar força, estão arregimentando grupos se utilizando de instrumentos como o fretamento de ônibus nos estados, passando pela organização de grupos de militares e policiais da reserva e, como cereja do bolo, caravanas formadas pelos setores mais retrógrados do agronegócio (talvez fosse mais adequado chamar de “ogronegócio”).

Ao lado da manifestação em si, os conteúdos das convocações publicados nas redes sociais deixam claro outro objetivo, qual seja, criar um clima de medo e insegurança. E, infelizmente, tem conseguido relativo sucesso junto a muitos segmentos do campo democrático.

Como de hábito, independentemente do número de pessoas que vierem a estar presentes no dia 7, a narrativa de sucesso está construída. As redes sociais serão inundadas de fotos, imagens, textos e outras coisas mais, que procurarão demonstrar, por A+B, o estupendo apoio que o presidente tem na sociedade.

Diante disso, cabe à oposição fazer a tradução adequada, construindo uma resposta com ações bem-humoradas, minimizando o que tiver acontecido no dia 7 e reduzindo as manifestações aos reais tamanho e dimensão, sempre dirigindo seus esforços de comunicação para os setores para além da bolha bolsonarista.
Só que Bolsonaro não é bobo e sabe que não pode jogar suas fichas exclusivamente nesse movimento.

Assim, está em curso a oferta de mais quatro ministérios para indicados do Centrão, sendo dois pelos senadores e outros dois pelos deputados. Com isso, tenta enterrar qualquer possibilidade de abertura do processo de impeachment contra ele.

Porém tem um fator que ele não controla: o descontentamento da ampla maioria da população com seu governo. Tudo indica que as manifestações convocadas por MBL e Vem Pra Rua para 12 de setembro deverão ser grandes devido à adesão crescente de diferentes movimentos e setores da sociedade, além do aumento no número de pessoas imunizadas.

Claro que ainda existem segmentos reticentes em participar em razão de divergências ideológicas com os organizadores. Resta saber o que prevalecerá: a necessidade de se sair em defesa da democracia ou a mesquinhez da divisão política conjuntural. A conferir.

*Consultor em estratégia

 

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