Por EDUARDO CYRINO - Pesquisador da Embrapa Cerrados
Em meio ao cenário de crise hídrica e de constantes conflitos pelo uso da água no país, há uma necessidade urgente por ferramentas capazes de responder, com agilidade e confiança, às perguntas relacionadas ao uso da água no Brasil: Quanto? Como? E para quê? Uma das questões mais complexas está relacionada à qualidade da água. Mas o que é qualidade? Trata-se de uma definição extremamente complexa quando se refere aos recursos hídricos e está relacionada às percepções e às necessidades dos indivíduos.
Em princípio, a qualidade da água está diretamente relacionada ao uso. O primeiro ponto a se pensar é no “para quê”, pois, dependendo dessa resposta, as condições serão avaliadas sob óticas diferentes. Atualmente, a legislação brasileira dá enfoque à saúde e ao bem-estar do ser humano, bem como ao equilíbrio ecológico aquático. No entanto, defendemos que a qualidade da água deve ser observada a partir do seu uso e da ocupação do solo.
Para isso, realizamos estudos com objetivo de verificar semelhanças e diferenças da qualidade da água em diversos períodos e pontos de amostragem do Distrito Federal; reconhecer os parâmetros responsáveis pelas variações e tendências espaciais e temporais dessa qualidade; identificar as fontes de poluição de diferentes pontos de um corpo d’água.
Embora no Brasil, as principais normativas relacionadas ao tema sejam as Resoluções Conama 274/2000 e 357/2005 e a Portaria MS 05/2017 em geral, é utilizado o Índice de Qualidade de Água (IQA), proposto pela Agência Nacional das Águas (ANA), principalmente por ser simples, sintético e prático para o monitoramento rotineiro.
Apesar de ser uma ferramenta largamente utilizada, o IQA também apresenta alguns problemas e dificuldades, em especial em relação à destinação da água, já que não considera que o recurso hídrico pode ser utilizado para fins diversificados. Além disso, embora a irrigação seja a atividade apontada como responsável pelo maior consumo de água no mundo, poucos países têm normas para qualidade da água de irrigação.
Parâmetros rurais x parâmetros urbanos — Em um país como o Brasil, com dimensões continentais, é certo que condições regionais diferenciadas exigem conhecimento das características específicas daquele corpo hídrico. O que é considerado poluente em alguns casos pode ser a condição natural para outros, como, os altos teores de cálcio em regiões calcárias. Para atender essa demanda de conhecimento, nosso projeto monitorou nove pontos amostrais em três unidades hidrográficas do Distrito Federal. Os pontos foram separados em três categorias, de acordo com sua localização: áreas naturais, chamadas de nascentes; e áreas sob influência urbana; áreas sob influência agrícola.
Os resultados mostram que existe grande diferença entre os padrões de qualidade de rios em áreas urbanas (uso de solo de onde surgiu o IQA) e de rios de áreas rurais (para as quais não existe um índice próprio). As diferenças regionais ficaram bem evidentes, destacando que os rios de áreas rurais se mantêm com maior fidelidade aos parâmetros originais do rio, ou seja, aos parâmetros naturais. Observamos que os rios de áreas rurais estão bem mais próximos das condições naturais do rio do que aqueles caracterizados como urbanos, que sofrem grande influência das cidades.
Parâmetros típicos do solo da região do cerrado, como acidez e baixa quantidade de sais dissolvidos, são mantidos nesse mesmo padrão nas águas de nascentes desse bioma, ou seja, são representativos da natureza da água na região. Essas características são de grande importância quando se deseja definir um índice de qualidade para a região, já que uma alteração nesse padrão natural pode representar uma alteração de qualidade.
A presença de contaminantes ou elementos presentes em baixas quantidades nas águas naturais também precisa ser monitorada e, quando se fala de qualidade, é de suma importância estar atento para a utilização que será feita desse bem natural.
Com o estudo, foi possível entender que existe a necessidade da proposição de índices regionais na condição do Brasil. Só para a região do DF, representando o cerrado brasileiro, há necessidade de pelo menos dois índices de qualidade: um para áreas urbanas, onde há forte impacto da presença das cidades, e um para áreas rurais, onde as características naturais da água são mais preservadas, mas onde possíveis contaminantes oriundos das atividades agrícolas necessitam ser observados.
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