» FERNANDA DELGADO
Professora e pesquisadora da
Fundação Getúlio Vargas (FGV Energia)
Sempre que há elevação dos preços dos combustíveis no país aparece a tentação da solução mais fácil: o controle de preços. As mais diversas organizações, usualmente com viés estatizante, apresentam a resposta mágica de que bastaria a Petrobras reduzir os preços e os problemas se resolveriam, ignorando o arcabouço legal e a lógica econômica, além de todos os efeitos que tal medida poderia ocasionar para os investimentos no país.
Não se pode ignorar que, desde 2002, o ambiente de comercialização dos combustíveis no Brasil é de livre competição e os agentes têm liberdade para importar e exportar. Esta liberdade é garantida pela Lei do Petróleo (Lei n° 9.478/97) para todos os segmentos do mercado de combustíveis: produção, distribuição e revenda.
Dessa forma, segundo a lógica econômica, a precificação de commodities, em um ambiente de livre competição, é dada pelos balanços de oferta e demanda globais, uma vez que produtos dessa natureza são produzidos, transportados e comercializados em larga escala por todo o mundo.
Assim, o diesel produzido nos Estados Unidos pode ser facilmente transportado, comercializado e consumido no Brasil. Da mesma maneira, o petróleo produzido no Brasil pode ser facilmente transportado, comercializado e consumido nos Estados Unidos ou em outros países. Por isso, os preços dos combustíveis e das commodities, em geral, são resultado do equilíbrio dos fluxos globais, refletindo o seu real valor. É natural, portanto, que os preços dos combustíveis no Brasil convirjam para o valor do produto no mercado internacional, pois a competição é global.
O conceito de paridade não está restrito ao setor de petróleo; se aplica aos diversos tipos de commodities no mercado brasileiro, como, por exemplo, os produtos agrícolas (soja, arroz, trigo, entre outros). Ele é essencial na construção de um mercado realmente competitivo, que traduz um equilíbrio de oferta e demanda não apenas no Brasil, mas entre o Brasil e o mundo. Qualquer tentativa de interferência que não preserve a liberdade de preços em todos os elos da cadeia tem efeitos negativos conhecidos e coloca o país no atraso.
Na contramão da abertura do mercado, a prática consistente de preços defasados e controlados implica o afastamento de outros agentes, como importadores, refinadores e operadores logísticos. Essa prática pode gerar falta de sustentação econômica para a realização de importações. E os investimentos necessários para atendimento da quantidade e da qualidade exigidas pelo mercado podem não vir, o que implicaria em risco de desabastecimento, com maiores custos ao consumidor.
Pela lógica econômica de um mercado aberto, o investidor buscará o ambiente que lhe proporcione os maiores retornos. Importa destacar que a presença estatal no refino impôs ao Brasil um atraso de crescimento da infraestrutura de abastecimento na última década, especialmente por afugentar o investimento privado. Mesmo com algum esforço da Petrobras em ampliar a capacidade de refino e rotas de escoamento dos derivados, há ainda deficiência logística e déficit de derivados estruturais. Por isso, os preços de paridade de importação são elemento-chave para que, em mercado aberto, se consiga, por meio de múltiplos agentes, ampliar a estrutura existente.
Importante ressaltar também o marco legal trazido pela Lei das Estatais, lei nº 13.303 de 2016. Esta lei estabeleceu que as empresas de economia mista, como a Petrobras, devem atuar sempre de maneira equivalente a empresas privadas concorrentes, o que é, inclusive, um dos pilares do processo de entrada do Brasil no seleto grupo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
O fenômeno atual de aumento de preços dos energéticos é global, dado o descompasso entre a retomada da atividade econômica e a oferta de energia e demais insumos, impactando os índices de inflação dos diversos países. Adicionalmente, o fortalecimento do dólar em âmbito global e, em especial, no Brasil, alavanca os preços das commodities e dos combustíveis.
Portanto, para que o Brasil siga no caminho da lógica econômica saudável, os preços praticados pelos diversos agentes devem seguir a livre competição determinada pelo arcabouço legal vigente em um mercado global. Além de seguir a lei, isso manterá afastado o risco de desabastecimento do país.
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