OPINIÃO

Outubro Rosa: o PL 265/2020 e o uso da genética

Correio Braziliense
postado em 29/10/2021 06:00
 (crédito: Caio Gomez)
(crédito: Caio Gomez)

MAIRA CALEFFI - Médica mastologista, Presidente Voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama)

NATALIE ALVES - Advogada, sócia, diretora-executiva e de relações governamentais do Malta Advogados

MARIA CLARA VILLASBOAS - Cientista política e membro do Escritório Malta Advogados.

O movimento mundial de conscientização sobre o câncer de mama, conhecido como Outubro Rosa, tem direcionado a atenção da Câmara dos Deputados para os cuidados com a saúde da mulher. Nesse sentido, destaca-se, entre tantos, o Projeto de Lei n.º 265/2020, apresentado pela deputada Rejane Dias (PT/PI), em coautoria com a deputada Tereza Nelma (PSDB/AL), em que o Projeto de Lei n.º 5270/2020, da deputada Liziane Bayer (PSB/RS), tramita apensado.

As proposições, que contaram desde o início com o engajamento da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), visam atribuir ao Sistema Único de Saúde (SUS) o dever de custear a realização de testes genéticos germinativos e genômicos tumorais para fins de prevenção, diagnóstico e tratamento adequado para os cânceres de mama e ovário.

A iniciativa atenta-se aos dados apresentados pelo Instituto Nacional do Câncer (Inca), que registraram, só em 2020, mais de 66 mil novos casos de câncer de mama, o que representa cerca de 30% do total de neoplasias malignas no Brasil. Diante desse cenário, os testes genéticos germinativos se destinam a identificar mutações em genes específicos, a exemplo dos genes BRCA1 e BRCA2, os quais constituem marcadores da síndrome hereditária dos cânceres de mama e de ovário. Assim, a partir da identificação de mutações nesses genes, cuja função é impedir o surgimento de tumores mediante a reparação das moléculas de DNA danificadas, torna-se possível a adoção de medida profiláticas, como a quimioprevenção, a mastectomia, a ooforectomia — ou, então, o monitoramento frequente para detecção da doença.

A respeito disso, tem-se o emblemático caso da atriz norte-americana Angelina Jolie, que, após a confirmação de mutação genética associada a síndrome hereditária, optou pela retirada das mamas e dos ovários, reduzindo as possibilidades de desenvolvimento da doença. É de se sublinhar, contudo, que quando detectado precocemente o câncer pode ser tratado também com técnicas menos invasivas.

Os testes genômicos tumorais, por sua vez, consistem na análise do DNA ou do RNA de células tumorais, que podem disponibilizar importantes informações acerca da probabilidade de reincidência e da efetividade de eventuais tratamentos a serem indicados, garantindo, assim, tratamentos adequados aos pacientes com câncer.

Nesse sentido, vale ressaltar o estudo realizado entre agosto de 2018 e abril de 2019 pela JCO Global Oncology, no qual se constatou que, após a realização do teste genômico, 99% dos médicos expressaram ter mais confiança em suas recomendações de tratamento. Isso porque, a partir da testagem genômica específica, os médicos dispuseram de informações mais completas acerca dos tumores das pacientes e puderam recomendar o melhor tratamento, com melhor prognóstico, considerando as condições específicas de cada mulher.

Registra-se que, desde 2014, é obrigatória aos planos de saúde a cobertura para a realização de testes genéticos hereditários, algo que atrai a necessidade de que tecnologias como os testes genéticos e genômicos também estejam acessíveis aos usuários do SUS, a fim de proporcionar um sistema de saúde efetivo, justo e democrático.

Disso, ressai a importância do Projeto em questão, não apenas como ferramenta de combate às neoplasias malignas, mas também como instrumento de democratização do direito à vida, à justiça e à igualdade. Afinal, ao garantir a realização dos testes pelo SUS, pessoas que não possuem a capacidade de arcar com planos privados de saúde também terão ao seu alcance a possibilidade de realização dos testes, auxiliando na prevenção, diagnóstico e tratamento adequado.

Para mais, em relação à esfera financeira, a realização dos testes para fins de combate ao câncer demonstra um custo-benefício positivo em comparação às práticas clínicas atuais, visto que a testagem possibilita um diagnóstico precoce que, consequentemente, repercute na economia de recursos pelo SUS no tratamento da doença. A exemplo disso, cita-se o estudo científico desenvolvido junto ao Hospital Pérola Byington, no qual constatou-se que, após a realização de testes genômicos, foi identificada uma redução em despesas de tratamentos desnecessários de quase R$ 420 mil reais no hospital.

Todos esses elementos evidenciam a importância do PL 265/2020, que, em razão da sua relevância para a vida das mulheres, já foi aprovado, por unanimidade, na CMulher. Agora, a proposição aguarda a sua apreciação na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF). Como se percebe, os debates empreendidos em torno do projeto representam nobre esforço do Legislativo para concretizar políticas públicas eficazes para a salvaguarda da vida das mulheres brasileiras.

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