OPINIÃO

Novo Ensino Médio pode expulsar o jovem pobre da escola

Por VALDINEI VALÉRIO - Presidente do Instituto Promover e mestre em ciências sociais pela Universidade Nacional de La Matanza, Argentina

O Novo Ensino Médio, trazido pela Lei 13.415/2017, que alterou a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, é realidade em alguns estados e a experiência mostrou, até agora, que a aplicação prática é diferente do que se imaginava. A nova carga horária, que é de sete horas, impede que o jovem tenha uma atividade profissional no contraturno escolar, em programas de aprendizagem.

E o impacto negativo, observado por organizações que trabalham com profissionalização de jovens e os próprios envolvidos, apontam para a falta de um estudo mais aprofundado e participação de entidades que se dedicam à formação da juventude pelo trabalho, por meio da lei da aprendizagem e estágio, que tem permitido e colaborado para que o jovem permaneça na escola.

A trilha formativa de profissionalização não está pronta nem aplicável para o jovem do ensino médio, e a nova carga horária o impede de cumprir, como aprendiz ou estagiário, um período de profissionalização. Com isso, nos estados que implantaram o novo ensino médio, observou-se aumento na evasão escolar e descontinuidade nos estudos básicos.

Hoje, o que se percebe é que o jovem que desiste da escola, principalmente no ensino médio, o faz porque precisa gerar renda e não encontra oferta de vagas no período noturno. Uma pesquisa do Conselho Nacional de Juventude (Conjuve) também trouxe essa visão. E acreditamos que isso acaba prejudicando o jovem mais pobre na sua jornada de aprendizado, que não pode iniciar sua qualificação enquanto estuda e auxilia financeiramente a família.

O Estado, se valendo da nova legislação, está respaldado em construir sua forma de atuação. Mas nós entendemos que essa discussão tem de ser bem mais ampla, com a participação de organizações formadoras para a educação, para a juventude e, inclusive, das empresas que contratam os jovens, com pensamentos para além do ensino por si só, especialmente na rede pública.

Sabemos que o papel de pensar, de implementar o novo ensino médio, a partir dessa nova visão, é do Estado, no entanto ele ainda não encontrou dispositivos que possam vir de encontro com os anseios da sociedade, sobretudo com a necessidade do jovem em gerar renda. Isso significa que a lei do Novo Ensino Médio vem patrolando uma outra legislação que tem seus frutos comprovados.

E é preciso levantar uma discussão: a escola forma para o trabalho ou pelo trabalho? Porque se forma pelo trabalho, há que se agregar aquilo que existe e tem dado resultados em relação ao processo de formação de jovens para o mercado de trabalho e a permanência dele na escola. Mas não dá para acreditar que essa formação, apenas escolar, será adequada.

A Lei 10.097/2000 determina que o empregador se comprometa a assegurar, ao maior de 14 e menor de 24 anos inscrito em programa de aprendizagem, formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação. Ou seja, o empregador, ou o mercado profissional, também são responsáveis pela formação.

E o trabalho ainda contribui para que o jovem permaneça e conclua o ensino médio, melhore sua vida e ingresse no mercado de trabalho formal. E aí está uma grande diferença, porque na formação pelo trabalho tanto o Estado quanto a iniciativa privada estão participando. Na formação para o trabalho, essa função está atribuída apenas ao Estado, nem sempre preparado para exercê-la.

Sendo assim, a formação para o trabalho acaba se dando intramuros, dentro da escola, com pouca ou nenhuma participação da sociedade empresarial. E é preciso, urgentemente, que os governos brasileiros promovam a expansão da aprendizagem no ensino médio, por meio da articulação público-privada, como exemplos bem-sucedidos já observados em unidades da federação.

E para que isso ocorra, basta que toda essa situação seja colocada na mesa e rediscutida entre todos os que cuidam da educação brasileira, a fim de que uma legislação não prejudique aquilo que já demonstrou bons resultados, nem exclua ainda mais um jovem que vive marginalizado socialmente e pode perder a chance de se reerguer no futuro. O Brasil não tem mais tempo para reinventar a roda.