OPINIÃO

A hora e a vez do conservadorismo

Por Orlando Thomé Cordeiro - Consultor em estratégia

Em 15 de janeiro de 1985, nosso país encerrava o ciclo ditatorial iniciado em 1964. Naquela data, o Colégio Eleitoral consagrou a vitória da chapa Tancredo Neves-José Sarney (PMDB) sobre Paulo Maluf-Flávio Marcílio (PDS) por um placar de 480 a 180 votos e 26 abstenções. Quem não viveu aquele momento ou não conhece a história pode pensar que a oposição detinha a maioria dos eleitores. Só que não! O PDS tinha 361 votos, seguido por PMDB (273), PDT (30), PTB (14) e PT (8). O PDS tinha, portanto, maioria absoluta, mas sua chapa só teve a adesão de metade de seus partidários.

A vitória de Tancredo representou o ápice da carreira de um político, cuja história foi marcada pelo inarredável compromisso com a democracia. Extremamente habilidoso, conseguiu se viabilizar como a liderança mais preparada para realizar a transição democrática, em grande parte por seu perfil moderado e conservador. Desgraçadamente, em razão de um grave problema de saúde que o levou a óbito, não conseguiu tomar posse em 15 de março daquele ano, cedendo involuntariamente o lugar para o vice-presidente eleito.

José Sarney, também um conservador, resolve adotar uma postura mais progressista em seu governo, como forma de se legitimar perante a sociedade ainda bastante empolgada e mobilizada com o fim da ditadura. Durante seu governo, foi instalada a Assembleia Nacional Constituinte eleita em 1986 e que elaborou a Constituição Cidadã promulgada em 1988. Entretanto, a marca principal de seu mandato foi a hiperinflação que atingiu inacreditáveis 1.764,86% no ano de 1990.

Seu sucessor, eleito por voto direto em 1989, foi Fernando Collor, que reuniu no segundo turno o apoio da maioria dos setores conservadores. Apesar disso, a desastrada gestão e os escândalos de corrupção provocaram seu impeachment em 1992, levando seu vice, Itamar Franco, a assumir o cargo.

No governo Itamar foi criado o Plano Real, responsável pela vitória de Fernando Henrique Cardoso na eleição de 1994, no primeiro turno. Com perfil claramente de centro-esquerda, seu governo deu início a um período de 25 anos de governos de mesmo perfil político-ideológico. Esse ciclo só foi interrompido com o impeachment de Dilma e a eleição de Bolsonaro.

Em 2018, a candidatura de Bolsonaro, com um discurso baseado no binômio combate à corrupção e ataque à esquerda, criou um clima favorável ao surgimento de setores de direita e extrema-direita, que se mobilizaram fortemente em seu favor. Pela primeira vez na história recente do país, vimos milhões de pessoas apresentando-se como "de direita". Porém, à exceção do nicho mais radical de seguidores, o presidente acabou decepcionando parcela significativa de seu eleitorado que, atualmente, vem reprovando seu governo e declarando a intenção de não reelegê-lo como demonstram as mais diversas pesquisas.

Por outro lado, não se deve confundir o crescente desgaste do presidente com a eventual mudança no perfil majoritário na sociedade brasileira. Afinal, historicamente a esquerda liderada pelo PT, quando disputou os pleitos isoladamente, nunca obteve mais do que 30% dos votos.

Considerando a hipótese de que Lula, atualmente líder nas pesquisas, seguirá até o final com sua candidatura, o que já estamos assistindo é à luta pelo lugar de quem será seu adversário mais forte nas próximas eleições. Nesse cenário, terá mais chance de crescimento aquela candidatura que conseguir ser percebida como de oposição conservadora a Bolsonaro e a Lula. Assim devem ser percebidos os recentes movimentos em torno de Sergio Moro e Rodrigo Pacheco.

O primeiro tem se beneficiado do apoio de boa parte da sociedade à Operação Lava-Jato. Segundo avaliação de Felipe Nunes, cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e diretor da empresa de pesquisa Quaest, Moro é a terceira via mais bem colocada até o momento por atrair quem odeia Bolsonaro e Lula. Segundo ele, o ex-juiz tem potencial de chegar a 30% dos votos, podendo se cacifar como a melhor alternativa, dependendo do número de candidaturas.

Rodrigo Pacheco começa sua campanha procurando construir uma imagem de ser um novo JK. Conta a seu favor o fato de que o PSD, seu novo partido, pode viabilizar um palanque forte e amplo em Minas Gerais em torno da provável candidatura ao governo do estado do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, do mesmo partido. Claro que faltam 11 meses e muita água ainda vai rolar, mas o eleitorado conservador dará as cartas nas eleições de 2022. Depois de três décadas, chegou a hora e a vez do conservadorismo se fazer presente na nossa democracia.

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