Artigo: a falácia da privatização do refino se evidencia

Correio Braziliense
postado em 30/12/2021 06:00

WILLIAM NOZAKI - Coordenador-técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (Ineep) e professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp)

A Petrobras, na esteira da redução do preço internacional do barril de petróleo, finalmente fez um movimento de retração do preço da gasolina no último dia 14 de dezembro. A estatal anunciou uma queda de 3% do preço do derivado em todas as suas refinarias. Entretanto, essa ação da companhia não foi seguida pela Acelen, do Fundo Mubadala Capital, nova operadora da refinaria da Bahia, ex-RLAM rebatizada de Refinaria de Mataripe. O fato confirma uma percepção já apontada pelo Ineep: a privatização do refino não necessariamente significará maior concorrência e menores preços para o mercado brasileiro.

O preço do barril do petróleo, que superou a casa dos US$ 85 no final de outubro, apresentou queda no começo de dezembro, voltando ao patamar próximo de US$ 70. Esse movimento diluiu as expectativas de crescimento acelerado do preço para 2022 e deu um certo alento para aqueles que se preocupavam com maiores pressões inflacionárias para o ano que vem.

No caso do Brasil, a Petrobras repassou a queda do preço do barril em linha com a sua PPI (Preço de Paridade de Importação). A redução de 3%, embora não tenha acompanhado a redução de mais de 10% do barril do petróleo, permitiu à empresa se aproximar do preço de paridade de importação. Isso porque, nos últimos meses, a estatal vinha fazendo reajustes com um prazo mais longo, criando períodos intertemporais de descasamento com relação aos produtos importados. Essa alteração já se refletiu em algumas localidades que são abastecidas essencialmente por refinarias da Petrobras.

Caso o barril do petróleo continue com uma trajetória descendente, a Petrobras deve promover novas quedas nos preços, se não houver uma desvalorização cambial significativa. Todavia, esse movimento não está ocorrendo no caso da Bahia, onde a estatal concluiu a venda da sua primeira refinaria.

A nova proprietária, a Acelen, indicou em 15 de dezembro que não reduziria os preços dos seus combustíveis, mas, passados três dias, a refinaria anunciou um reajuste similar ao da estatal brasileira. Isso indica que a empresa dos Emirados Árabes deve seguir, de forma atrasada, o comportamento da empresa brasileira.

Com isso, ela deve esperar a consolidação dos movimentos da estatal para decidir como vai gerenciar seus preços. Isso mostra como a privatização da refinaria não deve ter nenhum impacto no preço dos derivados. Pelo contrário, a Acelen tende a mimetizar as decisões da Petrobras.

Além da demora para praticar os reajustes de preço, a Acelen já demostrou que também adotará uma nova estratégia para a refinaria, visando ampliar as margens do negócio. A empresa deixou de fornecer bunker oil para as embarcações a partir do Terminal Madre de Deus, pois o fornecimento a navios e os equipamentos para essa operação não foram incluídos no contrato de privatização.

O caso da ex-RLAM é emblemático das falácias por trás da privatização do refino da Petrobras. O ativo foi vendido abaixo do seu preço de mercado e para um fundo estatal, contrariando os argumentos que tratam as privatizações sempre como um bom negócio e as empresas estatais sempre como más instituições. Além disso, por se tratar de um monopólio regional, a nova empresa operadora deve adotar a própria política de preços e de definição do portfólio de derivados.

Por todos esses motivos, se evidencia como a privatização e a desnacionalização não levam a maior concorrência, não asseguram menores preços para os consumidores e não garantem o abastecimento do mercado interno. Esse modelo expõe o mercado brasileiro aos riscos de descoordenação, desabastecimento e inflação de combustíveis.

 

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