Alexandre Silveira - Senador por Minas Gerais, presidente estadual do PSD
O sociólogo mineiro Herbert de Souza, o Betinho, um dos maiores símbolos de cidadania do país, cunhou no início dos anos 1990 uma frase que entrou para a história: "Quem tem fome tem pressa". Naquela época, o país tinha um contingente de 32 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza. Quase 30 anos depois, era de se esperar que o Brasil, que está entre as 10 maiores economias do mundo, tivesse superado o flagelo da fome. Infelizmente, não.
O nosso Brasil, é forçoso reconhecer, adoeceu e empobreceu nos últimos anos. A grave crise econômica que atravessamos, com inflação acima de dois dígitos que voltou a assombrar, o desemprego que atinge quase 13 milhões de brasileiros e o custo de vida elevadíssimo acabaram empurrando um quarto das famílias, mais de 52 milhões de pessoas, para uma vida de pobreza ou extrema pobreza.
Portanto, não há dúvida: a prioridade absoluta do Brasil hoje é trabalhar para minimizar os impactos da crise social que estamos vivendo, consequência da crise econômica, e que tem na fome a sua face mais perversa.
Como não se chocar quando vemos filas gigantescas com pais e mães de família tentando conseguir ossos para alimentar seus filhos? Como não se indignar ao ver milhares de famílias recorrerem ao velho fogão de lenha para preparar o alimento dos filhos, pois não conseguem comprar um botijão de gás, cujo valor representa hoje, em média, 10% do salário mínimo?
Fome, miséria e dor não têm partido, não têm ideologia, não têm cor. É sofrimento. E não podemos compactuar, aceitar ou nos conformarmos com cenário tão desolador, que se agravou nos últimos dois anos por conta da famigerada covid-19, que, só no Brasil, ceifou mais de 631 mil vidas.
Não há outro caminho para a busca de soluções senão a união do país — aí incluída a classe política, empresariado, sindicatos, sociedade civil organizada e tantos outros atores fundamentais nessa batalha.
Não esperemos, no entanto, soluções simples para problemas complexos. O fato é que não podemos aguardar mais. É urgente, em primeiro lugar, que a equipe econômica do governo reconheça a grave situação do país. Não dá para continuarmos nessa ortodoxia. Temos graves desafios para enfrentar: os buracos nas rodovias, as crianças fora das escolas, as filas nos hospitais e postos de saúde, a fome, a dor de milhões de famílias carentes desse imenso Brasil. É preciso realizar os investimentos para evitarmos um caos ainda maior.
"Mas não há recursos", argumentam. Não podemos aceitar que o governo federal use 50% do seu orçamento apenas para rolagem e pagamento de juros da dívida. De janeiro a novembro do ano passado, conforme dados da Instituição Fiscal Independente, órgão vinculado ao Senado Federal, os gastos com pagamentos de juros da dívida foram de R$ 394 bilhões, o que corresponde a 5% do nosso PIB. Inadmissível. É urgente reservar mais recursos do poder público para investir nas áreas mais demandadas pela população e ajudar a fomentar o desenvolvimento.
Nossos ouvidos tiveram que escutar, nos últimos anos, a cantilena da equipe econômica falando da recuperação em V (para dizer que a economia, após uma queda acentuada, voltaria ao patamar anterior de forma muito rápida), de uma estabilidade do câmbio e de um suposto equilíbrio fiscal como fonte geradora de justiça social. Mas onde está o resultado desse discurso?
Na inflação de 10% ao ano, no preço escorchante dos combustíveis, no quilo da carne que o pobre não consegue mais comprar? Sabemos que não serão ações conservadoras na economia que resolverão os problemas do Brasil. Sabemos também que não se cura câncer com placebo e que doença grave exige, não raro, injeção na veia. A injeção na economia neste momento é investimento nos mais pobres!
Portanto, neste momento, mais do que nunca, é preciso criatividade, coragem e ousadia. Milhões e milhões de brasileiros estão passando fome e o quadro, se nada for feito, vai se agravar. E quem tem fome, como bem disse Betinho, não pode esperar.
Chego ao Senado Federal com essa missão: alertar sobre os equívocos que estão sendo cometidos e que prejudicam exatamente aqueles que mais deveriam ser protegidos; colaborar com a busca de soluções viáveis para superação célere desses gargalos; e ajudar a viabilizar um novo rumo para o Brasil, com um crescimento econômico que seja sustentável a longo prazo, para que tenhamos um país mais justo e inclusivo socialmente.
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