Opinião

Aborto: o debate sem fim

Taís Braga
postado em 23/02/2022 06:00
 (crédito:  Reuters)
(crédito: Reuters)

Antes que os críticos e os movimentos organizados se manifestem, esclareço que, sim, concordo que a mulher deve ter o direito e a assistência médica necessária, caso deseje, precise e opte por interromper uma gravidez. Por outro lado, aceito a opinião e a convicção de quem é contra essa medida, que é extrema em qualquer circunstância. O tema é controverso, sensível e difícil de levar a um consenso.

É preciso que os dois lados, contra ou a favor, compreendam que há pontos a defender nos dois posicionamentos. Por exemplo: os movimentos de mulheres acertam quando argumentam que a proibição não impede a prática e contribui para a morte de mulheres, que se submetem a vários tipos de procedimentos — desde medicamentos a objetos introduzidos no útero, passando por clínicas clandestinas. Várias outras razões são apresentadas e defendidas com muito vigor.

Da mesma forma, organizações em defesa da vida e, principalmente, grupos religiosos, são veementemente contra e alegam tratar-se de homicídio contra um ser incapaz de se defender. É preciso, além de respeitar a crença do outro, admitir que um feto não tem como se defender. Isso é óbvio.

Nesta semana, o Tribunal Constitucional da Colômbia, a mais alta corte de Justiça do país, aprovou a descriminalização do aborto, por qualquer motivo, até o sexto mês de gravidez. Confesso que a notícia me deixou perplexa. Nesse período da gestação, é possível haver um parto, e a chance de o bebê sobreviver é muito grande. Conheço pessoas que nasceram aos seis meses e vivem saudavelmente. Atualmente, com o avanço da medicina, a sobrevivência é quase certa.

A Colômbia é o terceiro país sul-americano a flexibilizar o acesso à interrupção da gravidez com assistência do sistema público de saúde. No Brasil, é proibido, mas há exceções nos casos de risco de morte da mãe, estupro ou quando o feto não tem cérebro. No Uruguai, o aborto pode ser feito até a 12ª semana ou até a 14ª em caso de estupro. Na Argentina, até a 14ª. O que se vê é que cada país define a legislação conforme a própria realidade, interesses, forças e pressões sociais, políticas ou religiosas.

Cientistas não chegaram a uma definição sobre quando a vida começa no útero — na concepção, quando o coração começa a bater ou quando o cérebro é formado. Essa certeza (ou incerteza) é a razão dos debates entre o social e o religioso. Isso, sem contar o ponto de vista legal — um feto teria direito a uma herança? E o pai do bebê, pode se posicionar? Portanto, fica claro que, ao longo dos anos, o assunto será discutido e até revisto nas sociedades.

Creio que religiosos que se posicionam contra a prática jamais se beneficiarão de uma legislação favorável ao aborto. Mas é preciso crer que uma mulher não interromperá uma gravidez se não houver um motivo muito forte para isso. O motivo dela. É importante que ela seja acolhida, orientada da melhor forma possível, que conheça as suas opções e os argumentos dos que são contra ou a favor. A decisão, no entanto, é solitária. E viverá com ela para sempre.

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