Censura

Fábio Grecchi: Dona Solange voltou

Fábio Grecchi
postado em 21/03/2022 06:00
 (crédito:  Clube Filmes/Divulgacao)
(crédito: Clube Filmes/Divulgacao)

Não vi nem pretendo ver o filme baseado no livro do apresentador Danilo Gentili. Não porque seja ruim ou porque sou terrivelmente moralista e alguns assuntos me incomodam, mas porque, realmente, não é do tipo que goste. Pelo que li nas resenhas, é uma comédia como essas americanas repletas de piadas de baixo nível, mas que funcionam, alguma escatologia e certo apelo sexual. Não tem a pretensão de entrar na lista dos filmes do ano. Quer apenas entreter, fazer rir, enfileirar grosserias, brincar com a situação.

Filmes assim têm aos montes e, até então, nunca ninguém reclamou. Porque são apenas isso: diversão — não entro no mérito do bom ou do mau gosto. Não querem educar, dar lição, fazer pensar, levar à meditação. Se formos fazer um cotejo nos canais por assinatura ou nos serviços de streaming, há filmes que, realmente, trazem imenso desconforto pelos temas que abordam. Uns o fazem com alguma poesia, mas, muitos, são crueza pura. E nem por isso foram censurados, porque é isso que o filme da história escrita por Danilo Gentili está sofrendo.

À parte o fato de que a patacoada é mais uma malandragem dos bolsonaristas para desviarem a atenção do aumento da gasolina, da inflação ascendente e de um governo que vive de fazer cortina de fumaça para questões que não resolve, onde ficam as liberdades? Sim, aquela mesma defendida pelo "presidente" e seus seguidores que, um dia, enxergaram estar sendo cerceada. Onde está o direito de manifestar opinião sobre qualquer coisa, de ofender e ameaçar ministros do Supremo Tribunal Federal, de distribuir mentiras e desinformação nas redes sociais? Onde está a liberdade de tirar as coisas de contexto, manipular e repassar aos seguidores para que viralizem para destruir reputações? Onde está o direito de inventar uma história de pedofilia sobre um inimigo político?

Por que o filme sobre a história de Danilo Gentili é tão ofensivo e pregar golpe militar, fechamento das instituições democráticas ou ameaçar não cumprir decisões judiciais não são? Isso não era direito à opinião, liberdade de expressão, até um tempo atrás?

O Ministério da Justiça classificou o filme para maiores de 14 anos. É seu direito, não a censura. Bastava elevar a classificação para 18 anos, como fez. Mas desceu o espírito de Solange Hernandes, a implacável censora dos tempos da ditadura militar. Era a guardiã da moral e dos bons costumes dos militares probos e incorruptíveis, vigilantes combatentes do comunismo.

Dona Solange reencarnou. Mais incompetente.

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