Editorial

Visão do Correio: Educação e inflação, problemas sérios

Há anos, o Brasil convive com escândalos de toda sorte, quase sempre envolvendo o Orçamento, e os casos de corrupção e tráfico de influência surgem de tempos em tempos e em todos os governos, mostrando que a palavra escrúpulos escapa do dicionário dos homens públicos no Brasil. No último episódio do descaso com recursos públicos e uso de dinheiro do Orçamento para atender a interesses particulares, um áudio atribuído ao ministro da Educação, Milton Ribeiro, mostra o mesmo, que é pastor evangélico, afirmando que entre as prioridades de destinação dos recursos do Ministério da Educação está o atendimento a "pedidos dos amigos" de outros pastores evangélicos, segundo uma solicitação feita a ele pelo presidente Jair Bolsonaro. Mais uma vez, surgem acusações de haver um gabinete paralelo, assim como o revelado na área da Saúde, pela CPI da Covid, quando um grupo de fora do ministério dava as diretrizes.

O mínimo que se espera é que o Ministro da Educação venha a público explicar o motivo pelo qual pessoas sem ligação com a pasta têm pleitos atendidos, enquanto municípios são preteridos na destinação de verbas orçamentárias simplesmente por não serem indicados, por não serem de "amigos" dos pastores ligados ao presidente Bolsonaro. Saúde e educação são áreas básicas para a maioria da população brasileira, com pesquisas mostrando que para cerca de 80% dos brasileiros, o atendimento pelo SUS é o único recurso médico. O percentual é praticamente o mesmo (81%) quando se trata de educação básica.

E é preciso lembrar que, no caso da educação, houve um corte orçamentário para este ano de R$ 739,9 milhões. Destinar recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), segundo critérios de favorecimento a grupos particulares, é desrespeito com os milhões de estudantes e professores de escolas públicas de todo o país, sobretudo os de regiões mais carentes. A política feita a partir de favorecimentos é míope e excludente e fere o artigo 37 da Constituição, que estabelece que "a administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência".

Em um apelo que ecoa do passado, depois de anos de descaso e manipulação com recursos públicos, é que, sendo o Brasil um país com imensa desigualdade social, o que se espera sempre é maior rigor com recursos arrecadados para uso em benefício de toda a sociedade. Por hora, esse rigor tem faltado no Ministério da Educação. Milton Ribeiro admitiu o contato com os pastores, mas negou ter recebido a solicitação do presidente Bolsonaro. Esse, por sua vez, não falou sobre acusação de tráfico de influência nos seus ministérios, mas sim sobre a inflação.

Com pesquisa Exame/Idea mostrando que para 57% dos brasileiros o principal problema a ser resolvido este ano é o aumento de preços, seguido do desemprego e da pobreza, Bolsonaro usou mais uma vez as estratégias de responsabilizar outros por questões envolvendo seu governo de um lado e de outro chamando a atenção para um tema no momento em que ocorre algum tipo de acusação. É preciso que o presidente assuma o papel de encontrar ou cobrar de sua equipe que encontre soluções para os problemas econômicos.

A população dá a entender que o preço de hortifrutigranjeiros expresso em dois dígitos, combustíveis caros e aumentos generalizados incomodam mais do que supostos desvios na administração pública. Não, inflação e suspeita de corrupção devem ser combatidos com atuação firme do presidente da República. Discursos não mudam a realidade; ações, sim.

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