opinião

Artigo: CEP 71.686-670

Correio Braziliense
postado em 07/06/2022 06:00
 (crédito:  PCDF/Divulgação)
(crédito: PCDF/Divulgação)

RICARDO NOGUEIRA VIANA — Professor de educação física, delegado chefe da 6ª DP

Em maio, a Polícia Civil do Distrito Federal, por meio da 6ª DP, desencadeou a Operação Finis, com o intuito de prender duas associações de criminosos que tinham uma única finalidade — se exterminarem. Os grupos se concentravam nas regiões do Paranoá e Itapoã, localidade que está em frequente pujança populacional, agregando mais de 130 mil pessoas. Nos últimos dois anos, os associados foram responsáveis por dezenas de mortos na região. Rememorando a história do DF, esse tipo de reunião de jovens — formando gangues — não é característica apenas desse local, tampouco de Brasília e também não tem a ver com poder econômico, pois investigações dessa espécie já foram encampadas por esta Polícia Judiciária em outras áreas, inclusive em nichos de classe média.

Analisando características e comportamentos dos dois grupos, verificou-se que reúnem pessoas entre 15 e 35 anos, as quais se agruparam com o intuito de defender os seus territórios e interesses. Em síntese, nenhum deles sabe dizer como a contenda começou, mas uma coisa é certa, ceifavam ou tentavam matar pessoas, por vaidade, ódio e até mesmo sobrevivência. É fato que os indivíduos estavam associados para a prática de crimes, mas ouso fazer uma subdivisão desse ilícito penal — associação criminosa, previsto no artigo 288 do Código Penal. Quando se trata de gangues, os escroques estão juntos e têm um objetivo comum, mas há a ausência de caráter econômico. Não havia aferição, tampouco repartição de lucros, mas, simplesmente, união para matar os adversários. Deve-se perguntar, como eles se mantinham? Todos tinham suas carreiras solos, ou seja, praticavam seus delitos de forma autônoma e intencional: traficavam, roubavam, receptavam e furtavam, mas não dividiam os produtos, tampouco os proveitos dos crimes com a corja.

Dos 22 homicídios consumados assimilados pela região no ano pretérito, 11 são atribuídos à malta. Curiosidade, dois deles aconteceram após o benefício da saída temporária, vulgo saidão. Em um deles, o suspeito não residia na região, ou seja, a ordem foi originada do interior do estabelecimento prisional. Interrogando um de seus membros, que detinha uma tatuagem do grupo no dedo anular direito, ele relatou de forma curiosa: "Entrou no meu CEP, a bala voa!" O algoz se referiu ao código de endereçamento postal, ou seja, os grupos pretendiam dividir as regiões do Paranoá e Itapoã em áreas e quem ultrapassasse os limites impostos era alvejado, isto é, sofria um ataque. Fosse a ação bem-sucedida ou não, haveria o revide.

Rememoro os tempos em que chefiava umas das delegacias da Ceilândia. Em 2018, uma criança de cinco anos foi morta com tiros na cabeça, após um ataque da gangue rival. Quatro indivíduos entraram de forma inopinada no outro território e efetuaram tiros em direção ao irmão da vítima. Ele também foi atingido, mas não faleceu, mas a criança, sim. Oremos! Após intenso e exaustivo trabalho de inteligência junto à investigação policial, internamos os três adolescentes envolvidos e o maior amarga o cárcere, após os 36 anos de reclusão que o júri popular lhe atribuiu. Depois desse fato, as gangues do local foram indigitadas e os malfeitores presos, o que fez com que a região do Setor O e adjacências ficassem um tempo considerável sem homicídios relacionados aos grupos rivais.

A Operação Finis cumpriu 59 mandados de prisão e 37 de buscas. Dos presos, 22 se encontravam reclusos no sistema prisional e quatro cumpriam internação no sistema socioeducativo, ou seja, eram adolescentes. Além da perfídia e crueldade, os associados mostraram que não conseguem viver em comunidade e merecem mudar de CEP, ou seja, serem enviados ao sistema prisional (CEP 71.686-670) para que, um dia, possam retornar ao convívio social de forma a não burlar valores e aprender que a paz e a vida são bens indisponíveis. A investigação também apurou o envolvimento de vários adolescentes, os quais se alvoroçavam para galgar postos dentro da associação, com o fim de perpetuar horrores. Que sejam mantidos presos!

Rogamos que permaneçam harmônicas as duas regiões administrativas, sem territórios demarcados, gangues e baixos índices de criminalidade, para que o cidadão de bem, contribuinte e sujeito de direitos, possa viver em sociedade.

 

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