Eleições 2022

Artigo: A palavra é "democracia"

Rodrigo Craveiro
postado em 02/11/2022 06:00
 (crédito: Quinho)
(crédito: Quinho)

"E daí? Não sou coveiro." "Vai comprar vacina só se for na casa da tua mãe." "Fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Nem para procriador ele serve mais." "Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre." "O erro da ditadura foi torturar e não matar." "Vamos fazer o Brasil para as maiorias. As minorias têm que se curvar às maiorias. As minorias se adequam ou simplesmente desaparecem." "Eu jamais ia estuprar você porque você não merece." "Digo mais: prefiro que (o filho) morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí." Se você conseguiu ler até aqui é porque tem estômago. No último domingo, o Brasil enviou um recado de "basta" ao homem que proferiu essas sandices, ninguém menos do que o presidente da República. Jair Bolsonaro demorou 44 horas para se pronunciar e cumprir o rito seguido por todos os países democráticos.

Mesmo após a derrota nas urnas, ele seguia com um comportamento vergonhoso, ao não admitir o revés eleitoral e ao silenciar-se por quase dois dias ante um levante absurdo de caminhoneiros bolsonaristas "revoltados" com o resultado das eleições. Líderes internacionas imediatamente aceitaram o caráter limpo e transparente da eleição, além de parabenizarem o presidente eleito, Luiz Inácio da Lula Silva. Joe Biden, dos Estados Unidos, e Emmanuel Macron, da França, não demoraram nem uma hora.

O pronunciamento de Bolsonaro, de cerca de dois minutos, ocorreu somente às 16h37 de ontem. Ao contrário do que se esperava de um líder, ele não reconheceu explicitamente a derrota. Avaliou a ocupação das rodovias como uma prática da esquerda, apesar de enaltecer o cerceamento do direito de ir e vir. Também não parabenizou Lula. "Lutamos contra o sistema", afirmou, sem explicar coisa com coisa. Coube a Ciro Nogueira, ministro chefe da Casa Civil, anunciar o início da transição para amanhã.

Enquanto Bolsonaro falava, a polícia se esforçava para retirar das rodovias os piquetes feitos pelos aliados que não compreendem o significado da palavra "democracia". O que dizer do comportamento de alguns agentes da lei, que ignoraram o valor do cargo para insuflar a revolta? O que dizer da xenofobia escrachada por brasileiros contra os nordestinos, apenas porque escolheram quem achavam melhor para o Planalto?

A vontade da maioria do povo precisa e deve ser respeitada. Arruaças e bloqueios de rodovias apenas trazem prejuízos econômicos ao país e reforçam a reputação antidemocrática do presidente ainda em exercício. É dever do chefe de Estado zelar pela ordem institucional. A instabilidade, o desabastecimento de mercadorias e a violação do direito de ir e vir, um dos mais básicos da Constituição, apenas depõem contra o mandatário e seus seguidores. Esperava-se do presidente apreço pela democracia. Coisa que ele não mostrou nem mesmo em seu discurso de ontem.

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