Eleições 2022

Artigo: Alívio e esperança

Orlando Thomé Cordeiro - Consultor em estratégia

Domingo passado milhões de brasileiros acompanharam pela TV, internet e pelas redes sociais a apuração voto a voto da eleição presidencial. Foi emocionante! Houve algumas características distintas de outros pleitos. Pela primeira vez, a abstenção entre primeiro segundo turno caiu e um candidato à reeleição foi derrotado. Vale ressaltar que os dois candidatos obtiveram uma votação recorde, comprovando o interesse e a participação expressiva da população na disputa.

Mais uma vez nosso sistema eleitoral comprovou sua confiabilidade e eficácia. O resultado foi confirmado pelo TSE por volta de 19h50, menos de 3 horas após o término da votação (e ainda tem gente com saudade do voto impresso). Ato contínuo, os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal fizeram pronunciamentos reconhecendo o resultado das urnas. O mesmo fizeram os governadores eleitos e/ou reeleitos, independentemente de quem tivessem apoiado na disputa. E ao longo da noite os mais variados chefes de Estado — de direita, de esquerda, de centro, de países centrais e periféricos — enviaram mensagens de congratulações ao presidente eleito.

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E apesar do silêncio do candidato derrotado, as tratativas para a organização do processo de transição caminhavam. Até mesmo o vice-presidente Mourão fez questão de convidar o vice-presidente eleito para conhecer o Palácio do Jaburu. Ou seja, mais uma vez as instituições republicanas continuam demonstrando sua força, apesar de muita gente ter passado os últimos anos afirmando o contrário.

Outro exemplo da importância e força da institucionalidade brasileira foi a decisão unânime do STF determinando o desbloqueio das estradas tomadas por alguns arruaceiros, incluindo a autorização para que governadores pudessem acionar as Polícias Militares.

Graças a esse cenário, o atual presidente foi obrigado a se pronunciar após 44 horas de silêncio, perdendo a aposta numa reviravolta por meio de uma grande revolta popular ou da ação das Forças Armadas que jogasse por terra o voto popular. Claro que, de onde menos se espera é que não vem nada mesmo, e o discurso foi pífio. Serviu apenas para, de forma tímida e indireta, reconhecer o resultado e sinalizar que o direito de ir e vir deveria ser respeitado, referindo-se aos bloqueios golpistas.

Quando escrevo essa coluna os noticiários indicam que as estradas já estão sendo liberadas. Portanto, agora é a hora de se olhar para o futuro, respondendo à seguinte pergunta: o que esperar do novo governo?

Um primeiro sinal positivo foi a formalização de Geraldo Alckmin como coordenador da equipe de transição, reforçando a ideia de que Lula pretende fazer um governo amplo, para além das hostes petistas. É uma confirmação do que marcou seus posicionamentos durante a campanha no segundo turno.

Já no plano internacional é alvissareiro poder presenciar a reação positiva de inúmeros governos centrais explicitando seu regozijo com a possibilidade concreta do Brasil voltar a representar um papel relevante no concerto das nações, particularmente no que tange às políticas ambientais.

Se é verdade afirmar que o resultado trouxe uma sensação de alívio para a maioria da população, é muito preocupante que o presidente atual, brandindo o lema do fascismo, tenha conseguido alcançar 58 milhões de votos.

Portanto, é imprescindível que o chamado centro seja reconstruído de modo a ter a capacidade de voltar a atrair os segmentos conservadores e de direita, compromissados com democracia, mas que desde 2018 acabaram sendo cooptados pelo bolsonarismo com base em um fortíssimo sentimento antipetista.

Isolar a extrema direita na sociedade e no Congresso Nacional é a primeira e urgente tarefa do novo governo e da sociedade. Os bloqueios nas estradas e as manifestações em frente a unidades militares ocorridos nesta semana mostraram que estão dispostos a continuar se mobilizando em torno de bandeiras antidemocráticas. Na última quarta-feira, inclusive, o presidente gravou um vídeo no qual pede o desbloqueio das estradas, mas incentiva abertamente a continuidade das manifestações cujo mote é contestar o resultado da eleição.

Assim, o desafio é conseguirmos reunir competência política e eleitoral para sermos capazes de romper essa polarização de modo que em 2026 não sejamos obrigados a escolher entre duas candidaturas de mesmas matizes. Para isso, o governo Lula precisará ter um papel absolutamente determinante. Seus movimentos iniciais após o pleito nos dão esperança de que o sucesso nessa empreitada possa vir a ser seu principal legado.