TATIANA BELLO - Gerente de Implementação do Itaú Social
A pandemia lançou novos olhares e desafios para a atuação de professores. Esses profissionais tiveram de se reinventar para ministrar as aulas remotamente e se esforçaram ao máximo para minimizar o impacto do fechamento das escolas — segundo relatório da Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil foi o país que por mais tempo esteve com as escolas fechadas. Porém os desafios não pararam com o retorno às salas de aula.
Devido às enormes diferenças socioeconômicas, nem todos os estudantes tiveram o mesmo acesso às atividades remotas e, por isso, hoje constata-se uma grande defasagem de aprendizado em uma única sala de aula. Para recuperar o que foi perdido — ou sequer aprendido —, docentes estão aumentando os esforços para cumprir os planos pedagógicos.
O quadro é grave: 34% das crianças no 2º ano do ensino fundamental não sabiam ler e escrever em 2021, mais do que o dobro do que em 2019, de acordo com o Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). Importante destacar que a recuperação do aprendizado não depende somente dos professores. As redes de ensino precisam oferecer apoio didático e pedagógico, além de estratégias de diagnóstico dos aprendizados e busca ativa dos alunos que estão fora da escola.
Além da desigualdade educacional, os professores estão lidando com outro desafio que transcende o ato de ensinar. Pesquisa do Datafolha realizada a pedido do Itaú Social, Fundação Lemann e BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) no primeiro semestre deste ano, apontou que a maior dificuldade dos estudantes no retorno às aulas presenciais diz respeito a questões emocionais. Muitos responsáveis afirmaram que os alunos estão tendo crises de ansiedade em sala de aula.
A professora Indianara Nogueira, de Campo Grande (MS), faz uma analogia ao explicar a necessidade de enfrentar as defasagens somadas às dificuldades socioemocionais dos seus alunos: "É como se agora eu fosse trabalhar com uma mochila muito mais pesada". Os professores têm extrapolado o papel de ensinar; eles estão apoiando os alunos psicologicamente e, até mesmo, em relação a questões de segurança alimentar.
Enquanto os docentes sentem que as atribuições só aumentam, relatório da Education at Glance 2021, da OCDE , mostrou que os professores dos anos finais do ensino fundamental recebem o menor salário entre 40 países. No Brasil, a média é de US$ 13,9 mil por ano, enquanto nos países membros e parceiros da OCDE analisados é de US$ 35,6 mil.
A melhoria da educação pública passa necessariamente pela valorização dos professores. Um estudo do Movimento Profissão Docente sobre os planos de carreira e salários, divulgado em setembro, demonstra que, embora tenha registrado uma melhoria dos valores, há uma curta — ou nenhuma — distância entre o salário pago aos iniciantes e àqueles já experientes, no topo da carreira.
Além de deixar mais atrativa a carreira para futuros profissionais, é preciso oferecer boas condições de trabalho para que o professor possa se preparar para as aulas e investir na sua formação continuada, conforme assegura a Lei 11.738/2008 (um terço da jornada de trabalho destinado para atividades extraclasse). O ideal seria que cada professor fosse vinculado a apenas uma escola, mas, no país, apenas 43% dos docentes do segundo ciclo do ensino fundamental tinham contratos de tempo integral em 2018; 20% trabalhavam em várias escolas (OCDE).
Ao garantir uma carreira mais atrativa e boas condições de trabalho, torna-se possível o investimento dos professores em formação continuada e, consequentemente, na melhoria da qualidade do aprendizado para as crianças e adolescentes. Durante a pandemia, 71% das famílias brasileiras passaram a valorizar mais o trabalho dos docentes (Datafolha/setembro 2021). O reconhecimento da profissão pela sociedade deve ser traduzido como prioridade máxima para os próximos governantes e legisladores para elevar a qualidade da educação pública do país.
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