Pelo menos 32 milhões de crianças e adolescentes (63%) vivem na pobreza no Brasil. Faltam-lhes renda, educação, moradia, água, saneamento básico, informação e muitas estão submetidas ao trabalho precoce. Apesar de essa dura realidade não ser novidade, ela foi agravada com pelos impactos da pandemia de covid-19, segundo a pesquisa As múltiplas dimensões da pobreza na infância e na adolescência no Brasil, realizada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), com apoio da Fundação Vale, divulgada esta semana. Os dados foram coletados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de diferentes períodos: 2019 (trabalho infantil), 2020 (moradia, água, saneamento e informação), 2021 (renda insuficiente, inclusive para alimentação) e 2022 (educação).
Chama a atenção a falta de renda para alimentação da parcela infantojuvenil. O percentual de crianças e adolescentes, cujas famílias estão abaixo da linha de pobreza, chegou a 16,1%, o maior nível dos últimos cinco anos. Assim, cresceu em 40% o número daqueles sem acesso à alimentação adequada — de 9,8 milhões, em 2020, para 13,7 milhões em 2021. As restrições impostas pela crise sanitária impactou a educação. A taxa de analfabetismo passou de 1,9%, em 2020, para 3,8% em 2022 — o dobro.
Entre os fatores que comprometem a qualidade de vida e, portanto, o futuro de crianças e adolescentes no país, o estudo do Unicef destaca o não acesso de 21,2 milhões de meninas e meninos ao saneamento básico. Parte desse contingente (3,4 milhões) está privada do consumo de água realmente potável. A carência de renda afeta 20,6 milhões e a dificuldade de acesso à informação é realidade para 6,2 milhões. A vida é extremamente difícil para 4,6 milhões que não têm moradia adequada. Outros 4,3 milhões estão fora do sistema educacional, e 3,2 milhões são vítimas do trabalho precoce.
O cenário enfrentado por 63% da população infanto juvenil mostra que as políticas públicas estão muito aquém das necessidades reais dessa parcela da população. Entre os objetivos está o de colaborar com os Poderes da República para a construção de programas e projetos que revertam essa realidade, que devem contemplar também os pais e responsáveis das camadas mais vulneráveis.
Para isso, o Unicef faz algumas recomendações às autoridades: ampliar os serviços e benefícios ao público infantojuvenil mais carente; fortalecer o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente; promover segurança alimentar e nutricional; promover a busca ativa dos que abandonaram as salas de aula, principalmente os ainda não alfabetizados; identificar aqueles que submetidos à violência do trabalho infantil; e fortalecer os mecanismos de transição dos adolescentes para o mercado de trabalho.
As crianças e jovens são o futuro do Brasil. Esse jargão, sempre presente no discurso de políticos e autoridades, está esgarçado, ante a realidade da maioria dos meninos e meninas, exibida em dados do poder público, impõe-se ao novo governo, efetivamente, construir um novo cenário. Garantir o que determina o artigo 227 da Constituição de 1988, para que as crianças e os adolescentes se tornem, efetivamente, adultos capazes de exercer, com plenitude, a cidadania e tenham formação para protagonizar o desenvolvimento do país. Esta é a mudança esperada.
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