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Opinião

Artigo: Judiciário on-line

Após cinco ou seis décadas de processos escritos, os avanços da tecnologia de informação e a necessidade de economia de espaço, tempo e dinheiro, conduziram à adoção do Processo Judiciário Eletrônico (PJE)

Pessoa com camisa xadrez de manga comprida digita em um notebook. O computador está de lado e só dá para ver as mãos da pessoa. Fundo está desfocado. -  (crédito: Burst / Unsplash)
Pessoa com camisa xadrez de manga comprida digita em um notebook. O computador está de lado e só dá para ver as mãos da pessoa. Fundo está desfocado. - (crédito: Burst / Unsplash)
postado em 28/05/2023 06:00

Por ALMIR PAZZIANOTTO PINTO — Advogado, foi presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST)

O Processo Judiciário do Trabalho nasceu na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sob o signo da informalidade. Com esse objetivo, deu preferência à conciliação. Aos juízes de primeiro grau e tribunais do trabalho foi ordenado "o emprego sempre dos seus bons ofícios e persuasão, no sentido de uma solução conciliatória" (art. 764). Alcançado o acordo, tornavam-se desnecessárias a instrução, a sentença e a corrente interminável de recursos, responsáveis pela morosidade.

A busca da informalidade permitiu que a reclamação fosse escrita ou verbal. Na segunda hipótese, seria distribuída "antes de sua redução a termo", sendo obrigatório o reclamante se apresentar no cartório ou secretaria, no prazo de cinco dias após a distribuição, sob as penas previstas no art. 731. Verbal ou escrito, o pedido traria apenas "breve exposição dos fatos", dispensando-se fundamentação jurídica.

Com o passar dos anos e o crescente número de dissídios individuais, a formalização dos atos processuais tornou-se necessária. A tomada por termo da reclamação praticamente desapareceu, por ser mais seguro fazê-la por escrito, com assistência de advogado.

Após cinco ou seis décadas de processos escritos, os avanços da tecnologia de informação e a necessidade de economia de espaço, tempo e dinheiro, conduziram à adoção do Processo Judiciário Eletrônico (PJE). Toneladas de papel datilografados deram lugar a textos digitalizados, liberando quilômetros de prateleiras atravancadas. A epidemia da covid exigiu o isolamento social. Dessa vez, porém, também os prédios foram esvaziados. Ministros, desembargadores, juízes, advogados, membros do Ministério Público do Trabalho, servidores se sentiram obrigados à rápida adaptação ao trabalho a distância. Os arquivos foram para as nuvens.

Peticionar, despachar, sentenciar, recorrer, por plataformas eletrônicas se integraram à vida diária dos escritórios de advocacia e dos gabinetes de magistrados. Habituados aos mistérios da informática, os jovens se adaptaram com facilidade. O mesmo não aconteceu com os idosos. Aprenderam datilografia na mocidade e relutaram em substituir robustas máquinas de escrever por ultrassensíveis computadores.

Com o trabalho a distância, a tomada de depoimentos nas varas do trabalho tornou-se menos formal. Quando a audiência não é presencial, mas virtual, se acentuam os perigos da falta de fidelidade dos depoentes aos fatos investigados. Compete ao juiz se valer dos meios de que dispõe para evitar interferências de terceiros. Nos tribunais, um dos problemas relevantes reside na sustentação oral. Fazer a defesa a distância é tarefa desafiadora ao mais experiente advogado. A ausência de contato visual direto entre advogado e desembargadores quase sempre transforma o breve discurso em algo como água potável: incolor, insípido, inodoro.

Os poucos minutos reservados à sustentação exigem objetividade e clareza. Tenho constatado que, em nome da economia de tempo, o relatório, peça obrigatória e fundamental do voto, corre perigo de desaparecer. Observo que, por mais complexo que seja o caso, não há votos divergentes.

O sistema de inteligência artificial denominado GPT-4 evolui de maneira assustadora. Pode ser programado para receber, assimilar e processar tudo quanto foi produzido pela inteligência humana. Já se sabe que são capazes de executar tarefas para as quais não foram preparados. No mundo do direito, a robotização é utilizada para auxiliar a confecção de petições, recursos, sentenças, acórdãos. Acredita-se que em breve teremos à disposição o GPT-4.

Se o PJE representou enorme avanço em relação ao obsoleto processo datilografado, é o caso de indagar como serão os julgamentos pela inteligência artificial interagindo com seres humanos? Acredito que por volta de 2040 o processo judicial terá outras características. A petição inicial será formulada mediante preenchimento de programa autoexplicativo, como na declaração de Imposto de Renda. Trará o CPF do reclamante.

Será remetida por e-mail e retransmitida ao reclamado, o qual preencherá planilha com os dados da defesa e documentação eletrônica, como os registros de ponto relativos às horas de trabalho. A inteligência artificial examinará o caso e imprimirá a decisão. Não haverá recurso. Se houver, será analisado por vias eletrônicas. As decisões serão imediatas, como os resultados eleitorais. Não haverá morosidade, acervo ou processos acumulados. O futuro chegou.

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