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Brics: expandir para quem e para qual propósito?

A agenda da expansão foi liderada, sobretudo, pela China e pela Rússia, evidenciando a influência dos dois países no bloco

MARTA FERNÁNDEZ

A 15ª Cúpula do Brics, acrônimo para grupo de países que inclui Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, chegou ao fim na quinta-feira, 24 de agosto, com a decisão de convidar Argentina, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Irã para se tornarem membros plenos do agrupamento a partir de 1º de janeiro de 2024. O fato de a Cúpula ter sido realizada na África do Sul ofereceu um terreno simbólico para expansão tendo em vista que a África do Sul foi a primeira beneficiária da expansão em 2011.

A agenda da expansão foi liderada, sobretudo, pela China e pela Rússia, evidenciando a influência dos dois países no bloco. O propósito central da expansão foi de ordem geopolítica e qualquer entendimento se revela incompleto sem levar em conta a guerra na Ucrânia. Apesar de ser um tema evitado pelo agrupamento tendo em vista que a Rússia, potência invasora, é um dos membros do Brics, a guerra na Ucrânia vem funcionando como uma agenda invisível.

Afinal, a guerra na Ucrânia não apenas vem contribuindo para o crescente isolamento internacional da Rússia como vem colocando combustível nas tensões entre Estados Unidos e China, que já vinham sendo imaginadas como resultando numa nova versão da Guerra Fria. Diante de tal cenário, ambos os países apostaram na expansão como uma forma de atrair aliados geopolíticos do Sul Global em oposição ao Ocidente e, sobretudo, aos Estados Unidos.

O fato de 23 países terem manifestado interesse em se juntar ao agrupamento, seja por razões econômicas ou ideológicas, vem revelando o capital político do Brics. Todavia, existiam dúvidas de como ordenar a entrada de novos membros sem que isso comprometesse a tão aclamada “unidade na diversidade” do bloco, além da previsão de que tal ampliação pudesse gerar problemas de coordenação política e dificultar a obtenção de consenso. Temia-se que adicionar novos letras ao acrônimo pudesse ter como efeito a diluição do protagonismo de países como Brasil, Índia e África do Sul, resultando num grande “plus” à exemplo do que havia ocorrido com o G77, grupo de países em desenvolvimento fundado em 1964.

Sabemos, contudo, por experiência em relação às demandas históricas do Brasil de reforma do Conselho de Segurança da ONU, que as justificativas sistematicamente oferecidas pelos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China) para adiar a reforma do órgão, como é o caso daquelas sobre a inviabilidade de angariar consenso com o aumento dos membros permanentes, embora façam sentido, foram mobilizadas para mascarar interesses políticos.

Nesse sentido, o Brasil se viu diante de um dilema. Afinal, não dava para reproduzir o mesmo discurso que ao longo do tempo vem obstaculizando sua inclusão como membro permanente do Conselho de Segurança. Por outro lado, a imposição de quaisquer freios à inclusão de novos membros sinalizaria que os Brics seriam mais do mesmo, ou seja, um clube exclusivista de gigantes econômicos, populacionais e geográficos, distante da autoproclamada família baseada na solidariedade e aberta à diferença.

Virar as costas para novos membros teria um alto custo político uma vez que tal movimento iria contra a própria razão de ser do agrupamento comprometido com a democratização do processo decisório internacional. É importante chamar a atenção para a centralidade dessa agenda para o próprio governo do presidente Lula que entende os Brics como um agente crucial para promoção de um mundo menos desigual e excludente baseado numa ordem multipolar e num sistema de governança inclusivo.

Por outro lado, o presidente Lula entendeu que poderia obter dividendos em relação à expansão do Brics, não apenas devido à incorporação da Argentina, parceiro importante do Brasil na América do Sul, mas também devido à busca de reciprocidade por parte da China e da Rússia que implicaria que tais potências cedessem à pretensão do Brasil de integrar o Conselho de Segurança como um membro permanente. De fato, a Declaração da Cúpula deixou claro o apoio do Brics à reforma do Conselho de Segurança para aumentar a representação dos países em desenvolvimento, incluindo Brasil, Índia e África do Sul.

Embora China e Rússia tenham liderado a agenda da expansão movidas por considerações geopolíticas, o Brasil foi hábil o suficiente em abrir espaço para acomodar suas demandas em meio a um cenário internacional cada vez mais polarizado e enrijecido.

MARIA FERNÁNDEZ, professora do Instituto de Relações Internacionais da PUC-Rio e pesquisadora do Brics Policy Center

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