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Meio Ambiente

Artigo: Educação por um mundo com Amazônias

O fim da floresta parece algo distante, mas não será se continuarmos na mesma toada

Diálogos Amazônicos: Belém recebe evento sobre soluções e desenvolvimento sustentável
 -  (crédito: Govbr/Divulgação)
Diálogos Amazônicos: Belém recebe evento sobre soluções e desenvolvimento sustentável - (crédito: Govbr/Divulgação)
postado em 16/09/2023 06:00

EDUARDO FISCHER e  PAULO ANDRADE

Como seria o mundo sem a Amazônia? Seria um mundo mais quente e seco: somente no Brasil, a temperatura subiria 0,25° e haveria 25% menos chuvas, segundo uma estimativa feita em 2019 pelos pesquisadores brasileiros Adalberto Veríssimo, Tasso Azevedo e João Biehl, e o americano Stephen Pacala, um dos maiores especialistas mundiais em mudanças climáticas. O fim da floresta parece algo distante, mas não será se continuarmos na mesma toada. Segundo o Imazon, o desmatamento no primeiro semestre de 2023 foi 60% menor do que no mesmo período do ano passado, mas a área destruída (1.903 km²) é a sexta maior desde 2008 - e equivale a mais de mil campos de futebol desmatados por dia.

O problema, porém, vai muito além do bioma. A Amazônia também é casa de uma enorme diversidade de pessoas, histórias e contextos, que, em comum, são marcados por uma imensa desigualdade. É o que apontam dados organizados pela rede Uma Concertação Pela Amazônia sobre a Amazônia Legal — território que compreende os 7 estados da região Norte, além do Mato Grosso, no Centro-Oeste, e parte do Maranhão, no Nordeste.

Enquanto o percentual de pessoas em situação de pobreza registradas em 2021 na Amazônia Legal é 45%, no restante do Brasil é 26,9%, segundo o IBGE. Nesse mesmo ano, a renda domiciliar per capita foi R$868, na região, e R$1.431, nos demais estados brasileiros. Informações do DataSUS apontam que a mortalidade infantil em 2021 na Amazônia Legal foi 14,4 para cada mil nascidos vivos - acima da média no resto do país, de 11,4. Já o Ideb, aferido pelo Inep, foi 3,4 no Ensino Médio dos estados da região, em 2021, frente a 4,1 no Brasil; e o percentual de jovens de 25 a 29 anos com Ensino Superior completo 22,5, e 14,5%, respectivamente.

Se, por um lado, a redução do desmatamento tem relação com políticas públicas voltadas à conservação da floresta, por outro essas mesmas políticas não têm sido capazes de, sozinhas, promover desenvolvimento sustentável que garanta floresta em pé e melhores condições de vida para todos que vivem na Amazônia.
Lidar com tantos desafios demanda medidas estruturais, e a Educação é uma das principais delas. Um caminho promissor é promover o desenvolvimento integral dos jovens — em suas dimensões cognitiva, social, emocional, cultural etc. — para que possam fazer escolhas conscientes sobre sua vida e a participação que querem ter no meio em que vivem.

Indivíduos que hoje estão no Ensino Médio e já são agentes de transformação. Indivíduos que, amanhã, ocuparão os espaços do mundo acadêmico, do trabalho e de lideranças econômicas, políticas, sociais e culturais. Cidadãos que vão atuar pela continuidade de políticas públicas e ações concretas de promoção do desenvolvimento sustentável. Nesse sentido, conhecer todas as Amazônias, suas histórias, desafios e potencialidades pela voz de quem vive no território é fundamental para que os estudantes possam se conectar com esse conhecimento e transformá-lo em consciência cidadã, agindo para transformar o mundo.

É isso que se pretende com o Programa Itinerários Amazônicos, realização conjunta do Instituto iungo, do Instituto Reúna e da iniciativa Uma Concertação pela Amazônia, em parceria e com investimentos do BNDES, Fundo de Sustentabilidade Hydro, Instituto Arapyaú, Movimento Bem Maior e patrocínio da Vale.
A iniciativa tem como objetivo promover a Amazônia — em sua complexidade ambiental, social, histórica, cultural e econômica — nos currículos de ensino médio. Ele consiste em ofertar às redes de ensino materiais pedagógicos e formação docente para que os jovens do ensino médio possam aprender, em profundidade, sobre mudanças climáticas, questões sociais, culturais e econômicas da região e os valores tradicionais dos povos da região favoráveis à conservação da floresta. Para isso, alia temáticas que refletem a vida em território amazônico às competências previstas na legislação de serem desenvolvidas pelos alunos em matemática, linguagens, ciências da natureza, ciências humanas, projetos de vida e educação profissional e técnica.

Como não poderia deixar de ser, o programa foi feito com a participação ativa de pessoas que conhecem profundamente todas as Amazônias do Brasil: mais de 120 educadores, técnicos de secretarias de educação, lideranças e jovens amazônicos, além de especialistas de todo Brasil. Ele oferece um material que é, ao mesmo tempo, aprofundado e flexível, pois permite que as redes de ensino o incorporem da forma que for mais adequada à sua realidade educacional, respeitando a autonomia e particularidades de cada estado. E também promove a formação continuada para professores e gestores das escolas públicas da região, por meio de parceria com as redes de ensino estaduais do Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Roraima e Tocantins.

Formação docente para discutir em profundidade a Amazônia nas salas de aula é essencial para ampliar o conhecimento dos estudantes. Reforçar a Amazônia nos currículos é necessário pois pensar seu desenvolvimento sustentável é papel de todos. Mas ela não é responsabilidade apenas dos governos.
Diante do alerta da ONU para o risco do não cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) até 2030, a parceria entre governos e sociedade civil é apontada como essencial para alavancar as ações rumo a essas metas nos próximos sete anos.

São vários os ODS que se relacionam diretamente com o desenvolvimento sustentável da Amazônia: combater a mudança climática; proteger, recuperar e promover o uso sustentável dos ecossistemas terrestres; garantir água potável para todos; erradicar a fome e promover a agricultura sustentável. A Educação de qualidade é um objetivo essencial para avançarmos em direção às metas e nos mantermos na rota de cuidar da vida terrestre.

Mesmo que o cumprimento integral dos ODS seja pouco provável no prazo definido pelas Nações Unidas, e ainda que o desmatamento irreversível de partes da Amazônia não tenha sido completamente evitado, agir para alcançar o máximo de resultados é fundamental para evitarmos uma catástrofe ambiental e social. Promover uma educação capaz de possibilitar que os jovens do ensino médio de todo o Brasil conheçam e ajam a favor da Amazônia é cuidar do planeta.

EDUARDO FISCHER, CEO da MRV&CO, presidente do Instituto MRV e líder de impacto pelo Pacto Global da ONU Brasil; e PAULO ANDRADE, presidente do Instituto iungo

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