DIANA QUINTA
Sócia no Brasil da Fragomen e vice-presidente da Associação Brasileira dos Especialistas em Migração e Mobilidade Internacional (Abemmi)
A competitividade do mercado de trabalho por talentos cresce de forma globalizada e o Brasil está ficando para trás nessa disputa. A procura dos brasileiros por experiências internacionais nunca foi tão grande e esse desejo está cada vez mais possível com países criando novos vistos ou flexibilizando regras para migração de profissionais especializados. A possibilidade de imigração para profissionais de tecnologia sempre foi mais conhecida, mas hoje a procura é estendida para profissionais de STEM (em português, Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), além da área da saúde. Alemanha e Canadá, por exemplo, estão facilitando a imigração e oferecendo emprego e benefícios para enfermeiros, inclusive os brasileiros.
As oportunidades são mais abundantes conforme o nível de especialização dos candidatos. Quanto mais especializado e experiente, melhores as chances de obter um visto e até incentivos fiscais, como bolsas de estudos. A este fenômeno damos o nome de fuga de cérebros porque perdemos profissionais brilhantes em busca de uma vida melhor em outros países.
Além da consolidação do trabalho remoto que impulsionou mais de 40 países a criarem um visto para receber profissionais nômades digitais, que têm emprego e renda, mas querem ter experiências de viver em outro país, o envelhecimento da população também tem movimentado as políticas migratórias. As taxas de fertilidade globais diminuíram para metade nos últimos 70 anos, enquanto as populações continuam a viver mais tempo. Essas alterações demográficas em um mundo globalizado impactam internacionalmente o mercado de trabalho. O mundo está cada dia mais conectado e há mais possibilidades para que as pessoas circulem entre países e impulsionem a economia.
Isso se agrava com o cenário nacional de emprego para profissionais qualificados. O Brasil pode ter perdido cerca de 6,7 mil cientistas nos últimos anos, segundo estimativas do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, vinculado ao Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. Um dos motivos é a falta de emprego. Segundo o CNPq, o país forma hoje 24 mil doutores por ano, mas as ofertas de emprego e concursos públicos não passam de mil.
Segundo dados da Fragomen no Brasil, empresa especializada em imigração, somente em 2022 o número de brasileiros que aplicou para um visto de emprego e residência para Portugal aumentou 200%. Para os Estados Unidos, o crescimento foi de 114% e, para Austrália e Nova Zelândia, chegou a 567%. Nos últimos dez anos foram registrados crescimento dessa demanda, com exceção do período de fronteiras fechadas na pandemia.
Em outubro de 2022, o Datafolha divulgou uma pesquisa revelando que 76% dos brasileiros diziam ter alguma ou muita vontade de deixar o país. Quanto mais jovens, maior o desejo, fruto da interação do Brasil globalmente nos últimos anos e o acesso crescente que os brasileiros têm tido à uma cultura mais global. Por outro lado, a falta de incentivos e estímulo à volta desses profissionais que adquiriram uma relevante experiência no exterior gera um problema no longo prazo para o Brasil ao se tornar um país onde os nossos grandes talentos apenas passam férias.
Apesar de tantos casos de sucesso e da demanda por bons profissionais brasileiros, trocar de país não é uma garantia de um bom resultado. Migrar requer muitos cuidados, e é preciso estar com toda a situação documental regularizada, o que abre portas. Se chegar de maneira irregular, a experiência de morar em outro país já poderá começar com frustrações. São muitos os desafios da vida de um imigrante, como o domínio de outra língua, as diferenças culturais, climáticas e mesmo a saudades do Brasil, que também tem muito a oferecer e deve buscar formas e oportunidades para reter quem ainda está no país e atrair aqueles que partiram.
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