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Bem-estar

Artigo: Desapegos, uma boa ideia

O desapego é um conceito que tem origem na filosofia e nas tradições espirituais. Os ensinamentos budistas sobre o desapego podem ser aplicados no cotidiano

A prática de atenção plena ajuda -  (crédito: LAURENE BECQUART)
A prática de atenção plena ajuda - (crédito: LAURENE BECQUART)
ISAAC ROITMAN, professor emérito da UnB e pesquisador emérito do CNPq - Opinião
postado em 27/10/2023 06:00 / atualizado em 27/10/2023 16:23

O sentimento de apego faz parte da experiência humana e pode se manifestar de várias formas ao longo da vida. Pode se manifestar em várias dimensões, como o apego aos pais, familiares e amigos, como também aos bens materiais, ao poder e a crenças e ideias. Em muitos casos, o excesso de apego pode levar a problemas emocionais, relacionais e físicos. A prática do desapego envolve aprender a liberação de apegos que não estão contribuindo de forma positiva para sua vida ou para o seu bem-estar. Ele pode ser individual ou coletivo.

O desapego é um conceito que tem origem na filosofia e nas tradições espirituais. É um princípio importante no budismo, na fé Bahá"i, no hinduísmo, no catolicismo, no jainismo, no estoicismo e no taoísmo. Rajneesh Chandra Mohan Jain (1931-1990), também conhecido como Bhagwan Shree Rajneesh ou Osho, foi um líder espiritual indiano, que assim se expressou: "Todas as nossas misérias e sofrimentos não são nada mais do que apegos. Toda a nossa ignorância e escuridão é uma estranha combinação de mil e um apegos. Nós estamos apegados a coisas que serão levadas no momento da morte, ou mesmo, talvez, antes. Pode estar muito apegado ao dinheiro, mas pode ir à bancarrota amanhã. Pode estar muito apegado ao seu poder e posição, mas eles são como bolhas de sabão. Hoje, eles estão aqui; amanhã, eles não deixarão nem um traço".

Entre as décadas de 1950 e 1960, o psicólogo britânico John Bowlby tinha interesse em compreender a ansiedade de separação e o estresse sentido pelas crianças quando essas estavam distantes de seus pais ou cuidadores. De acordo com Bowlby, o apego seria um fenômeno que surgiu em um contexto evolutivo, tendo em vista que o cuidador proporciona segurança à criança.

Sendo assim, o apego seria uma característica que melhora significativamente a chance de sobrevivência da criança. Por isso, quando a criança está com medo ou sentindo alguma emoção negativa, ela tende a ir atrás do seu cuidador primário em busca da sensação de segurança. Esse processo de formação do apego gera registros afetivos que influenciam as pessoas em fases posteriores de sua vida. Assim, Bowlby explica que a família tem o papel fundamental na sensação de estabilidade dos laços afetivos desenvolvidos pela criança que as levaram para o resto da vida.

Na infância, na adolescência e mesmo na vida adulta, podemos desenvolver apegos a bens materiais, a competição, a sensação de poder, a prazeres sensoriais, a ideologia, ao egocentrismo, a um partido político ou a um time de futebol etc. Qualquer que seja a dimensão do apego, ele nunca leva à plena felicidade. De acordo com os ensinamentos budistas, o apego é uma das principais causas do sofrimento humano, juntamente com a aversão e a ignorância e a superação do apego seria o caminho para alcançar a iluminação e para a libertação do sofrimento.

Os ensinamentos budistas sobre o desapego podem ser aplicados no cotidiano, independentemente de alguém ser ou não budista. Algumas práticas e atitudes que podem ajudar a desenvolver o desapego incluem: 1) Praticar a atenção plena: Incorporar a atenção plena em atividades diárias, como meditação, respiração consciente e observação das emoções e pensamentos, pode ajudar a desenvolver uma maior consciência do apego e promover o desapego; 2) Cultivar a gratidão: Praticar a gratidão diariamente pode ajudar a desenvolver uma atitude de apreço e contentamento, em vez de se concentrar no que está faltando ou no desejo de possuir mais; 3) Desenvolver a compaixão: Praticar a compaixão pelos outros e por si mesmo pode ajudar a reduzir o foco no ego e nos desejos pessoais, promovendo uma maior conexão e empatia com os outros; 4) Simplificar a vida: Reduzir o apego material pode envolver simplificar a vida, desapegando-se de posses desnecessárias e priorizando experiências e relacionamentos significativos; 5) Aceitar a impermanência: Reconhecer e aceitar a natureza impermanente da vida, das emoções e das relações pode ajudar a desenvolver uma atitude de desapego e a apreciar o momento presente.

Ao incorporar essas práticas e princípios do budismo, é possível desenvolver uma maior consciência e habilidade para lidar com o apego, levando a uma vida mais equilibrada, feliz e significativa. Assim, aderir aos desapegos, julgo ser uma boa ideia.

 


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