ANDRÉA DUARTE NASCIMENTO JÁCOMO, pediatra, membro do Departamento de Pediatria Ambulatorial da SBP/SPDF e professora de medicina do Ceub
Setembro, além de marcar o início da primavera no nosso país, tem várias cores de acordo com o calendário das campanhas de conscientização do Ministério da Saúde: verde, dourado e amarelo. O texto de hoje traz uma reflexão sobre essas cores e o impacto na vida das crianças.
Nem só agosto é dourado, sabiam? Setembro dourado marca o mês com ações de conscientização sobre o câncer infantil — sim, infelizmente, crianças também desenvolvem vários tipos de câncer e, assim como nos adultos, o reconhecimento precoce e o acesso ao tratamento adequado fazem toda a diferença na vida dos pequenos e das famílias que atravessam essa dura jornada.
Setembro também é verde quando se fala da conscientização e do incentivo à doação de órgãos, tarefa árdua para médicos de todas as gerações, mas fundamental para a sobrevivência de quem lida com doenças graves e precisa de órgãos dos que já se foram para continuar vivendo. O verde, cor da esperança, tenta transformar a dor do luto e ressignificar a continuidade da existência para quem doa e quem recebe em todas as idades.
Por fim, setembro também é amarelo, e é dessa cor que quero me estender mais um pouco. O décimo dia do mês de setembro marca o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio e, desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria tem a campanha Setembro Amarelo, que abre espaço para diálogo sobre esse tema tão difícil, doloroso e cercado de tabus.
No mundo inteiro, se ouve falar sobre a "epidemia de transtornos mentais que atingiu jovens de vários países ao mesmo tempo," documentada no livro A geração ansiosa, do psicólogo social Jonathan Haidt. Os dados do pesquisador apontam um aumento assustador das taxas de atendimento nos serviços de emergência dos Estados Unidos tanto por automutilação quanto por suicídio na faixa etária de 10 a 14 anos, principalmente a partir de 2010.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), em relatório de março de 2025, destaca que, todos os anos, 727 mil pessoas tiram a própria vida e que há um número muito maior que tenta, figurando como a terceira causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. No Brasil, são cerca de 14 mil registros todos os anos, sendo reconhecido como um problema de saúde pública com impactos diretos sobre a saúde mental da família atingida, mas também indiretos sobre escola e comunidade.
Quando se trata da saúde mental da infância e da adolescência, é fundamental entender primeiro que a genética importa. Alguns transtornos têm incidência aumentada e se repetem na família. O ambiente social também é importante: com quem e como se convive influenciam o modo de pensar e o comportamento, principalmente quando o cérebro ainda está se desenvolvendo e a capacidade de julgamento crítico está menos amadurecida que a das emoções e impulsividade.
Falar sobre saúde mental nas consultas de pediatria hoje em dia é mais comum que antigamente, mas ainda é uma abordagem cercada de mitos que dificultam o reconhecimento e a prevenção. Acompanhar o crescimento e o desenvolvimento das crianças e suas famílias nos dá a oportunidade de contribuir para um ambiente mais saudável a cada fase. Desde a primeira consulta do recém-nascido e dos recém-papais e mamães até as fases mais desafiadoras da primeira infância, da alfabetização aos anos finais, quando escolhas importantes são tomadas, passando pela adolescência, que é justamente quando pode começar a se manifestar alguns dos sinais de ansiedade e depressão.
Crescer e adolescer sem adoecer mentalmente tem sido um desafio para essa geração: de um lado, se observa uma cobrança excessiva dos próprios adolescentes e das famílias em relação à performance intelectual ou esportiva com metas inatingíveis ditadas pelas redes sociais abarrotadas de filtros que distorcem a realidade; do outro, a ausência da família que deveria zelar, mas acaba, por uma série de razões, ou mesmo sem razões, terceirizando as funções e, depois, espera que a criança se vire na adolescência e chegue à vida adulta o mais rápido possível.
Principalmente nessa, mas em todas as fases, o olhar cuidadoso para enxergar se as mudanças são as esperadas ou se podem indicar um pedido de ajuda faz toda a diferença. Por isso, entre todas as cores que a primavera e setembro trazem, fica o alerta para uma atenção especial com o amarelo, que adverte sobre a importância de cuidar da saúde mental de quem cuida, dos pequenos e dos já não tão pequenos assim. E "se precisar, peça ajuda!", como diz o lema da campanha.
