San Antonio, Laredo e El Paso, Texas, e Santa Teresa, Novo México (EUA) — As pressões inflacionárias e a falta de crescimento econômico têm feito muitos brasileiros buscarem a sorte fora do Brasil e, para aqueles que pensam em se arriscar cruzando a fronteira do México ilegalmente, as autoridades norte-americanas fazem um alerta sobre os perigos da travessia. Com a chegada do verão no Hemisfério Norte, no último dia 21, as temperaturas na região da fronteira sudoeste são muito elevadas e podem custar a vida dos aventureiros, segundo os oficiais.
Conforme dados da Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA (CBP, na sigla em inglês), após a queda durante a pandemia de covid-19, em 2020, o número de imigrantes ilegais não para de crescer. Desde o início do ano fiscal de 2022 — em outubro de 2021 — até maio, foram encontrados 1.753.754 imigrantes ilegais. E o dado vem aumentando mês a mês, passando de menos de 200 mil, entre janeiro e fevereiro, para 261.890, em abril, e para 273.309, em maio. No quinto mês de 2021, esse volume foi de 198.459, ou seja, aumento de 37,7% nessa base de comparação.
Enquanto isso, o número de brasileiros ilegais somou 38.624 de outubro de 2021 a maio deste ano, próximo aos dados de ucranianos e indianos, de 38.098 e de 38.058, respectivamente. Já o México é a origem da maioria dos ilegais, somando 570.462 no mesmo período. Guatemala (com 156.462), Cuba (140.602), Honduras (138.961) e Venezuela (98.851) completam o ranking dos cinco países com maior número de imigrantes ilegais tentando entrar nos Estados Unidos neste ano fiscal.
De acordo com as autoridades dos EUA, a maioria desses ilegais tenta atravessar a fronteira pelo sudoeste do país. Em busca do famoso sonho americano, pagam coiotes, que fazem parte de organizações criminosas internacionais. Os oficiais contam que a exploração desses indivíduos é grande. Os cartéis cobram pedágio daqueles que conseguem chegar à fronteira. As taxas de acesso partem de US$ 1 mil a US$ 2 mil, dependendo da localidade, e podem passar de US$ 8 mil. Alguns coiotes garantem duas ou três entradas, caso o imigrante seja capturado pelas autoridades norte-americanas e enviado de volta ao México. Além disso, os carteis ameaçam parentes e exigem o carregamento de drogas durante a travessia daqueles que não têm dinheiro para as taxas.
A fronteira terrestre do Sul dos EUA com o México tem 1,9 mil milhas de extensão (3,2 mil quilômetros) entre os estados da Califórnia, do Arizona, do Novo México e do Texas, mas não é totalmente coberta pelo polêmico muro do ex-presidente Donald Trump. Em El Paso, por exemplo, o muro cobre menos de 70% das 264 milhas (426,5km) de fronteira. Conforme dados do CBP, 16.671 agentes atuam na fronteira com veículos, helicópteros, drones e até cavalos.
Além de El Paso, a também texana Laredo tem registrado um forte crescimento no fluxo em 2022. Segundo as autoridades, 60% dos imigrantes que tentam entrar nos EUA por esse ponto são deportados. As deportações, em grande parte, são feitas pelo Título 42 — implementado durante a pandemia da covid-19 e que prevê que indivíduos que cruzarem a fronteira sem autorização legal e sem uma base para permanecerem no país (como pedido de asilo válido) serão deportados prontamente e sofrerão as consequências da remoção, incluindo restrições de futuros benefícios de imigração.
Terreno inóspito
Essas duas cidades são cercadas pelo terreno inóspito do Deserto de Chihuahua que, nesta época, registra temperatura média superior aos 40°C. Na travessia, não é incomum o encontro com cascavéis, escorpiões, pumas e coiotes (de verdade), de acordo com os policiais que patrulham a fronteira. Eles alertam que muitas pessoas conseguem escalar o muro com escadas de corda improvisadas mas, quando chegam ao deserto, acabam morrendo por desidratação em poucas horas. Um trajeto que poderia ser feito entre 11 a 15 minutos correndo, em condições normais, pode levar mais de três horas — ou dias — devido à alta temperatura. Por isso, muitas pessoas acabam abandonadas pelo caminho. E, mesmo quando chegam a algum ponto onde é possível pedir socorro, este pode não chegar em tempo hábil.
"Algumas vezes, mesmo com helicópteros, dependendo do local onde a pessoa se encontra, a equipe de resgate pode levar de 30 minutos até três horas. E, em muitos casos, chegamos tarde demais", explica Efren Gonzales, diretor do Departamento de Operações Aéreas e Marítimas do CBP, responsável pelos resgates e segurança da fronteira em El Paso. A frota de helicópteros da divisão, segundo o oficial, é formada por três Black Hawk equipados com câmeras de visão noturna de longo alcance e autonomia de quatro horas de voo. Há também mais oito helicópteros de menor capacidade, o A-Star.
De acordo com a diretora do centro de operações do CBP em El Paso, Gloria Chavez, o fluxo de imigrantes tentando entrar ilegalmente nos EUA deve continuar crescendo nos próximos meses, porque o verão é a época em que há mais tentativas. Apenas em El Paso, o número de imigrantes ilegais caiu de 182 mil para 54 mil entre os anos fiscais de 2019 e 2020. E, neste ano fiscal, foram registrados 177 mil encontros de imigrantes ilegais na região até maio. Em todo o ano passado, foram 193 mil. "Em 2021, o número de imigrantes ilegais subiu demasiado e, agora, no ano fiscal de 2022, vamos chegar a mais de 200 mil pessoas no setor de El Paso, porque o fluxo está aumentando e encontramos de 700 a 1.000 pessoas ilegais por dia", informou.
A oficial conta que, entre os 69 países de origem desses ilegais, os que registram as taxas mais altas de imigrantes tentando entrar nos EUA pela região de El Paso são México, Guatemala, Haiti, Cuba, Turquia, Nicarágua, Honduras, Brasil, El Salvador, Equador, Colômbia, Chile, Peru, Rússia, Venezuela e Bolívia. Segundo ela, ocorreram 361 resgates neste ano fiscal e, nesse mesmo período, foram registradas 37 mortes na região, praticamente o mesmo número em todo ano fiscal de 2021.
Em Laredo, cidade a 250km de Santo Antonio, às margens do Rio Grande, desde outubro de 2021 até maio deste ano, 51 imigrantes ilegais morreram na travessia e ainda há 13 pessoas que não foram identificadas. Esse é praticamente o mesmo número de mortes registrado no ano fiscal de 2021, encerrado em setembro passado, de acordo com o chefe adjunto da divisão do CBP em Laredo, Greg Burnwell.
Desidratação
Os oficiais destacam os perigos que envolvem a travessia pelo Rio Grande e, depois, pelo deserto na região de Laredo e El Paso. "As pessoas acreditam que o corpo humano sobrevive três dias sem água, mas só em condições normais. No deserto, isso não acontece e, infelizmente, quando o resgate chega, há casos em que não encontra a pessoa viva", reforça Brunwell. Segundo ele, há muito poucos brasileiros tentando entrar ilegalmente nos Estados Unidos pela fronteira de Laredo.
Quando os imigrantes estrangeiros conseguem uma autorização temporária para ficar nos EUA, eles são encaminhados pelas autoridades a centros de acolhimento, como o administrado por Joe Barron, em Laredo, que recebe mensalmente, cerca de 7 mil pessoas encaminhadas pela patrulha de fronteira, em grande maioria, venezuelanos e haitianos.
Na antiga escola metodista instalada em 1845, os imigrantes são recebidos e encaminhados para outras cidades. Uma das pessoas é o venezuelano José Medina, 29 anos, que deixou a família no país de origem e caminhou com um grupo de amigos por dois meses, até chegar aos Estados Unidos para pedir asilo. Conseguiu permissão temporária até agosto. No centro de acolhimento, ele pediu ajuda para ir à capital, Washington, mas não tinha ideia da distância de Laredo até lá. "Quero trabalhar lá e ajudar a minha família", conta.
A fronteira Norte, com 8.891,6km de extensão e muito menos fluxo de imigrantes ilegais, conta com 1.929 agentes do CBP. Já a fronteira marítima, com 4.319km de costa, fica sob o monitoramento de 250 agentes.
*A jornalista viajou a convite da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil
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