A manutenção na Câmara do veto do presidente Jair Bolsonaro ao reajuste dos servidores em 2021 foi vista, por parlamentares e especialistas, como resultado do empenho do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e não exatamente de articulação do governo. A avaliação é de que a base do Executivo no Congresso segue mutante, e as negociações em relação às pautas de interesse do Planalto serão voto a voto.
O placar de 316 votos pela manutenção do veto, contra 165, mostrou, também, a capacidade de mobilização do Centrão. Ao lado dos partidos independentes — DEM, MDB e PSDB — e de Maia, o bloco parlamentar construiu uma maioria na Casa e salvou o Executivo de uma despesa extra no ano que vem. Apesar do alívio, esse episódio também reforçou a dependência do Planalto em relação à velha política da troca de cargos por apoio em votações.
O líder do PT na Câmara, Enio Verri (PR), está entre os que viram a manutenção do veto como um triunfo de Maia. O parlamentar destacou que a aliança com o Centrão ainda não está finalizada. “Eu não acho que o governo tenha consolidado a base. O que ocorreu foi uma demonstração de força do Rodrigo Maia, que é fiscalista. Ele tem essa preocupação equivocada de colocar o equilíbrio fiscal como uma coisa mais importante do que a vida dos trabalhadores”, ressaltou. “E, como ele tem o respeito dos deputados, mostrou o tamanho dele. Foi falar no plenário sem ser líder. Ele precisou dizer que apoiava a manutenção do veto para garantir os votos.”
O deputado Bibo Nunes (PSL-RS) discordou. Ele viu a participação de Maia como importante, mas acredita que a experiência do novo líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PP-PR), foi fundamental para conseguir reverter o veto. O que provaria, na visão do parlamentar, que o presidente da República está fortalecendo sua base entre os deputados. “Tanto que conseguiu reverter a votação do Senado com 316 votos, e demonstrou força. E a tendência é aumentar essa base. A articulação foi do líder do governo e de Maia”, frisou.
Bolsonaro aliou-se ao Centrão pouco mais de um ano e meio depois de insistir na opção de não compor uma base parlamentar que atuasse em coalizão com o governo. Com a vitória de quinta-feira na Câmara, o bloco parlamentar, que já ocupa um amplo espaço na máquina federal, pode aumentar o valor da fatura.
“Isso (a votação) mostrou o poder de fogo do Centrão, que tem meios de construir uma maioria. Mostra que o governo está longe de ter um controle sobre uma base e fará com que o preço da inclusão do Centrão aumente. Eles (os deputados) mostraram que o governo precisa deles. Agora, vai vir a fatura. É da natureza do presidencialismo de coalizão, em que o Executivo constrói uma maioria e, como contrapartida, libera verbas, recursos do orçamento e cargos de visibilidade. Um ministro tem visibilidade grande. Pode emplacar uma carreira de prefeito depois”, explicou Geraldo Tadeu Monteiro, cientista político e professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Para Ricardo Ismael, professor e pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), o governo ainda precisa concluir a construção dessa base para votar matérias mais complexas, “e evitar que o governo tome bola nas costas como foi a derrubada do veto” ao reajuste dos servidores no Senado, na véspera da votação na Câmara. “O presidente deve uma a Rodrigo Maia, que se empenhou para que a Câmara não aprovasse a decisão, mas isso mostra a dificuldade dessa base construída aos trancos e barrancos, com mudanças de liderança e liberação de verbas. Esse teste (da votação do veto) mostrou que a base é pouco orgânica. O governo seguirá negociando votação por votação”, avaliou.
A expectativa, agora, é em relação ao que o Planalto fará com os senadores aliados que ajudaram a derrubar o veto na quarta-feira. Vice-líder do governo no Senado, Izalci Lucas (PSDB-DF) deve perder o cargo nos próximos dias. Já os colegas Jorginho Mello (PL-SC), Soraya Thronicke (PSL-MS) e Daniela Ribeiro (PP-PB) devem sofrer retaliações em relação aos cargos que detêm no governo e à liberação de emendas.
Paulo Guedes na mira do Senado
Na terça-feira, o Senado pode votar um requerimento, apresentado pelo presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para convocar o ministro da Economia, Paulo Guedes, a dar explicações sobre a declaração de que os senadores cometeram “um crime contra o país”. Ele fez a crítica à Casa por ter derrubado, na quarta-feira, o veto do presidente Jair Bolsonaro ao reajuste salarial de servidores. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou, ontem, que a reação do ministro “não foi boa” e pode “ter custos”. Ele defendeu que Guedes se “antecipe” e peça uma reunião virtual com os senadores. “Acho que errou, não adianta negar. Gerou incômodo, mas temos que superar esse mal-estar, pelo bem da pauta de reformas”, frisou.
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