entrevista

"A gente deveria unir esforços pelo Rio", afirma Rodrigo Maia

Presidente da Câmara dos Deputados concede entrevista ao Correio e fala sobre a situação atual do seu estado, o Rio de Janeiro, e fala sobre os rumos na presidência da Câmara dos Deputados

Luiz Calcagno
postado em 30/08/2020 07:00 / atualizado em 30/08/2020 07:12
 (crédito: Antonio Cunha/CB/D.A Press)
(crédito: Antonio Cunha/CB/D.A Press)

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, assiste de longe e entristecido à decadência do estado do Rio de Janeiro, cujo povo representa no Congresso. A mais nova crise na política fluminense — o governador Wilson Witzel foi afastado por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) por suspeita de envolvimento em um esquema de desvio de verba na saúde em plena pandemia do novo coronavírus — deu a ele a certeza de que se não houver a união de esforços entre os setores público e privado, o Palácio Guanabara será um permanente núcleo de crises.

Leia a seguir os principais trechos da entrevista que concedeu ao Correio.

O senhor é deputado pelo Rio de Janeiro, em que mais um governador é afastado do poder acusado de corrupção. Como vê a atual situação do estado?
É grave. Chegou a ponto em que a gente deveria unir esforços pela recuperação. O Rio tem uma importância enorme para o Brasil, para a nossa economia, para a cultura. O Rio é muito importante e essa sequência de crises tira a autoestima do carioca, tira o interesse do investidor no Rio, na cidade e no estado. É uma região com muitas riquezas e belezas, e acho que estava na hora daqueles que têm responsabilidade, no setor público e no setor privado, unir esforços para construir uma saída para o nosso estado.

Como o senhor vê o período em que vivemos, talvez o mais conturbado desde a redemocratização?
É uma mudança de ciclo para a sociedade, em 2018, rejeitando a política. Elegeu um político, mas que representava essa crítica da sociedade. Esse ciclo devolveu espaço para um grupo que é minoritário dentro dos que acompanharam o presidente (da República), mas que é muito forte nas redes sociais, um grupo de extrema direita, que acabou gerando, no ano passado e no início da pandemia, muita instabilidade política. Mas acho que, nos últimos meses, tanto pelas decisões do Congresso quanto do Supremo (Tribunal Federal) e da própria postura do presidente,esse grupo foi perdendo espaço. E a gente voltou a ter as condições, por meio do diálogo, de tentar construir os caminhos daqui para frente, para esse final de pandemia e para o pós-pandemia, pois vamos ter, ainda, muitos desafios.

O que quer Rodrigo Maia?
(Risos) Eu cheguei à conclusão de que nós temos a obrigação de reformar e de modernizar aquilo que foi construído com muita boa intenção de todos, mas que, infelizmente, revelou-se, depois de 30 anos da nova Constituição, um Estado que acabou atendendo apenas, ou priorizando, poder e recursos para uma elite. Na elite do poder público, na elite do setor privado, e acho que chegou a hora de a gente modernizar o Estado, para que preste serviços de qualidade. Não estou discutindo se é pequeno ou grande. Estou discutindo serviços de qualidade, e quem decide o tamanho do Estado é a sociedade. Modernizar e melhorar a qualidade do ensino público para que não fique essa diferença tão grande entre o público e o privado. Temos um sistema tributário que beneficia quem tem mais. Tínhamos uma Previdência que beneficiava quem tinha mais. Temos uma administração pública que beneficia uma elite do serviço público concentrando renda nos Três Poderes. Temos um comércio fechado que beneficia empresas, muitas vezes, ineficientes. E R$ 350 bilhões de subsídios, muitas vezes para setores que não merecem e não precisam desses recursos. Vemos que, na União Europeia, impostos mais transferências reduzem as desigualdades em 40%. Na América Latina, 4%; no Brasil, 8%. Então, mostra a desigualdade que é o Estado. E o Estado existe exatamente para gerar o mínimo de equilíbrio nas relações e igualdade de oportunidade para todos. Acho que esse é o grande desafio, e é disso que eu quero participar.

O senhor não sente um certo pesar de pensar que, talvez deixando a presidência da Câmara, essas ideias não tenham a prioridade do seu sucessor?
Acho que não. Creio que o parlamento que representa a sociedade brasileira, de forma majoritária, defende essa minha visão de um Estado moderno. Tenho certeza de que, se a sociedade pensa majoritariamente assim, e isso está representado no parlamento, o próximo presidente, independentemente de quem seja, vai manter essa pauta de modernização do Estado brasileiro.

O senhor falaria em nomes (para a sucessão na Câmara)?
Não tem muitos e acho que todos os colocados são ótimos nomes. O importante é construir um que possa unificar a Câmara como, de alguma forma, eu consegui nos últimos anos.

O senhor é cobrado sobre uma possível reeleição à presidência da Câmara. Existem alguns fatores que provocam dúvida sobre sua postura. Um é o fato de o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), ter aberto o debate sobre o tema, outro, é a força que o senhor tem com os partidos na Casa. Um terceiro aspecto é a postura que o senhor tem em relação ao governo federal. Mesmo atacado, ajudou na manutenção do veto para o reajuste dos servidores, segurou o impeachment. Tudo isso não colabora para insistirem na sua reeleição?
Tenho o maior orgulho de presidir a Câmara, mas entendo, também, que alternância de poder e mudança de ciclos e de nomes ajudam a atrair, a agregar novas ideias, nova forma de pensar e de liderar a Câmara. Acho que tenho cumprido bem o meu papel, de forma republicana, defendendo o que acredito. Aliás, venho fazendo isso há muito tempo. No governo Dilma, o DEM, às vezes, brigava comigo, porque eu votava com o governo matérias econômicas que eu considerava importantes para o Brasil. Mantive a mesma postura à frente da presidência da Câmara e, a partir de fevereiro, eu, fora da presidência, vou continuar a defender aquilo que acredito, que defendo. É assim que acho que colaboro com o parlamento e com o país. Acredito que já passei um bom período na presidência. Acho que está na hora de escolher um novo nome, que possa agregar novas ideias e um novo debate para a Câmara.

Seus colegas dizem que o senhor passou a ler muito nos últimos tempos. O que tem lido?
Estou lendo o livro que a deputada Fernanda (Melchionna), do Psol, me emprestou, sobre a China, do Henry Kissinger. Retomei a leitura de um livro sobre a Dona Leopoldina, que foi uma grande mulher. E também tenho na minha cabeceira um livro do Henri-Benjamin Constant de Rebecque (escritor e político nascido na Suíça que fez feroz oposição a Napoleão Bonaparte). São os princípios para todos os tipos de governo; um clássico liberal, muito importante neste momento e que traz princípios muito importantes para o sistema democrático. Um clássico que nos ajuda a refletir sobre tudo que passamos no Brasil nos últimos anos. 

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