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Após afastamento de Witzel, Bolsonaro dá as cartas no Rio

Afastamento de Wilson Witzel e aproximação do governador em exercício, Cláudio Castro, com o clã tornaram-se um jogo de ganha-ganha. Se, de um lado, o interino obtém musculatura política, de outro, o presidente recupera a base eleitoral

O afastamento do governador Wilson Witzel, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), da administração do estado do Rio de Janeiro abriu uma avenida para que o presidente Jair Bolsonaro amplie a influência onde fixou sua base eleitoral e política e por onde dois dos seus filhos têm representação legislativa –– Flávio, no Senado, e Carlos, na Câmara dos Vereadores da cidade do Rio, ambos pelo Republicanos.

Além de dar o suporte político pedido pelo governador em exercício, Cláudio Castro, que também é investigado no processo que afastou Witzel do poder, Bolsonaro terá que decidir, até a próxima sexta-feira, 4 de setembro, se o Tesouro Nacional estenderá o programa de recuperação fiscal que garantirá a sobrevivência do Rio. Sem o suporte financeiro da União, o estado entrará em processo de falência. Witzel vinha pedindo socorro ao Palácio do Planalto, mas a resistência do presidente em estender a mão a ele era grande. Com Castro, o filme tenderá a ser diferente.

Pelos dados mais recentes do Tesouro, o Rio de Janeiro tem uma dívida consolidada de R$ 167,4 bilhões, representando quase três vezes a receita líquida anual do estado. Com o regime de recuperação fiscal, o Rio conseguiu a suspensão do pagamento de juros dos débitos, mas, ainda assim, não conseguiu se reequilibrar financeiramente. A expectativa é de que, agora, com Witzel fora do circuito e com grande chance de sofrer um processo de impeachment, a União conceda mais três anos de alívio dos juros. Bolsonaro, com isso, posará de salvador do estado. É assim que ele já se vê.

Não por acaso, Cláudio Castro deu início às manobras para se aproximar do clã Bolsonaro. Na última quinta-feira, mesmo antes da queda de Witzel, ele esteve em Brasília para encontros com pessoas próximas ao presidente. Político de pouca expressão, o governador em exercício precisa reconstruir as pontes com o Planalto. Ele sabe do tamanho da influência da família Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj), por onde passa a sua permanência no cargo. O processo de impeachment de Witzel está avançado e, dificilmente, será revertido. 

 

Vitória completa 

O afastamento definitivo do governador –– confinado no Palácio Laranjeiras por 180 dias, a menos que o STJ reveja a decisão dada pelo ministro Benedito Gonçalves –– será a maior vitória da família Bolsonaro no estado. Pelo roteiro que já vem sendo traçado, o governador em exercício trocará de partido, saindo do PSC do Pastor Everaldo, que está preso, e pousando no Republicanos. Consolidado esse momento, a legenda que abriga Flávio e Carlos Bolsonaro terá o governo do Rio e a prefeitura da capital caso Marcelo Crivella seja reeleito para a prefeitura da capital.

Cientista político e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Geraldo Tadeu explica que Cláudio Castro chegou à vice-governadoria por indicação do Pastor Everaldo, mas é distante da figura de Witzel, com quem não tem ligações pessoais. Ele avalia que não resta a Castro nenhuma outra alternativa a não ser se aproximar mais do presidente da República e dos filhos dele. “Não somente pelas características do vice-governador, mas pela situação do próprio estado. Não há outro caminho para ele. Mesmo na condição de interino, tem que tentar pacificar as relações com o governo federal e com a Alerj, que estavam desgastadas”, explica.

Para a família Bolsonaro, o ganho não será pequeno. Primeiramente, terá o bônus de manter, finalmente, uma relação de paz com o ocupante do Palácio Guanabara. Depois, no fim do ano, terá influência na indicação do novo procurador-geral de Justiça do estado, chefe do Ministério Público. Como no MP-RJ está a investigação que apura o esquema das rachadinhas do gabinete de Flávio Bolsonaro, quando era deputado estadual, é importante para o clã acompanhar com lupa a sucessão na procuradoria –– que ainda apura a suposta contratação de funcionários fantasmas no gabinete do vereador Carlos Bolsonaro.

“Ele (Bolsonaro) tem todo interesse de manter o Rio sob seu controle, até porque correm processos contra Flávio, e esse cargo (de chefe do MP-RJ) é estratégico”, aponta Tadeu.

Professor de Direito da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro (FGV-RJ) e cientista político, Michael Mohallem reforça que há mútuo o interesse no bom relacionamento de Castro com a família Bolsonaro, sobretudo, por causa da escolha da pessoa que comandará o Ministério Público do Rio. “Para o governador em exercício, um político sem expressão e sobre o qual também recaem suspeitas de envolvimento em esquema de corrupção, é uma forma de se manter e construir uma base. Ele precisa de um padrinho que lhe dê força política, que lhe dê sustentação”, salienta.

 

Auxílio não tem valor fechado

O presidente Jair Bolsonaro repetiu, ontem, que o governo pretende prorrogar o auxílio emergencial pago a informais e desempregados até o fim deste ano, com um valor menor do que os R$ 600 atuais, mas superior a R$ 200. Ele passou a semana em reuniões com ministros, incluindo o da Economia, Paulo Guedes, para tratar do assunto e também do Renda Brasil, programa que será lançado para substituir o Bolsa Família. O valor das próximas parcelas do auxílio deve ficar em torno de R$ 300. Bolsonaro participou da cerimônia, em Caldas Novas (GO), da inauguração de uma usina solar. 

Castro mantém reuniões

Em seu segundo dia como governador em exercício, Cláudio Castro deu expediente ontem no Palácio Guanabara, sede administrativa do governo estadual, quando se reuniu com o secretário de Estado de Saúde, Alex Bousquet. Na sexta-feira, ele ainda estava em Brasília quando foi comunicado da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de afastar o governador Wilson Witzel do cargo, investigado por suspeitas de integrar um esquema de corrupção.
A primeira reunião de Castro como governador em exercício, na tarde de sexta-feira, foi com a cúpula da segurança pública. Foi decidido que não haverá mudanças na área. Mas, amanhã, está prevista uma reunião dele com todo o secretariado.

Já a defesa de Witzel ainda analisa a melhor estratégia para contrapor decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo o advogado Ricardo Sidi, há tempo para entrar com recurso. O prazo mínimo é de cinco dias, que começam a contar a partir de amanhã –– ou seja, a defesa tem até próxima sexta-feira para fazê-lo. Dependendo da estratégia, o pedido pode ser via Supremo Tribunal Federal (STF) ou STJ. A Procuradoria-Geral da República investiga Witzel por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro.

Witzel, aliás, passou mal na manhã de ontem e procurou o Hospital Copa d’Or, em Copacabana, Zona Sul da capital fluminense. “Após ser atendido e passar por exames, foi diagnosticado com infecção, medicado e liberado em seguida”, disse a nota divulgada pelo PSC.