GOVERNO

Renda Brasil fora do Orçamento

Programa que substituirá Bolsa Família não é incluído na peça orçamentária porque falta definir valores e fontes de financiamento

» Marina Barbosa
postado em 01/09/2020 00:05
 (crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado - 12/12/19)
(crédito: Edilson Rodrigues/Agência Senado - 12/12/19)

O governo federal continua discutindo os valores e as fontes de financiamento do Renda Brasil — programa social que deve substituir o Bolsa Família em 2021, com o intuito de pavimentar o caminho para a reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Por isso, optou por deixar o programa de fora da proposta do Orçamento de 2021 e vai precisar cortar gastos ou remanejar recursos para conseguir implementar o Renda Brasil no próximo ano.

“Não temos no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) 2021 nenhum novo programa. Nós trabalhamos com programas já existentes. Mantemos o Bolsa Família, mas não temos previsão para novo programa”, afirmou o secretário da Fazenda, Waldery Rodrigues, ontem, ao ser questionado sobre o motivo de o governo federal não ter destinado nenhum recurso para o Renda Brasil na proposta do Orçamento de 2021.

Waldery frisou, por sua vez, que o Executivo não desistiu de implantar o programa. Ele disse que o “Renda Brasil está sendo discutido e, no momento devido, vai ser anunciado”. Também sugeriu que o projeto deve herdar o orçamento do Bolsa Família, que, por sinal, foi ampliado.

Segundo a proposta, o orçamento do Bolsa Família deve sair de R$ 29,4 bilhões em 2020 para R$ 34,8 bilhões em 2021. O aumento foi liberado porque o governo admite que a crise trazida pela pandemia da covid-19 deve aumentar a pobreza e, consequentemente, o número de famílias que têm direito ao Bolsa Família. A previsão é de que mais dois milhões de famílias passem a se enquadrar nos critérios do programa em 2021, elevando para 15,2 milhões o número de lares atendidos pelo Bolsa Família.

Essa suplementação, contudo, não será suficiente para bancar o Renda Brasil. Afinal, o governo quer que o novo programa social atenda os atuais beneficiários do Bolsa Família, mas também parte dos invisíveis que foram encontrados pelo auxílio emergencial. Além disso, a promessa é ampliar o valor médio do Bolsa Família, que, hoje, é de R$ 191. O presidente Jair Bolsonaro quer levar esse benefício para R$ 300, apesar de o ministro da Economia, Paulo Guedes, dizer que o cabe no Orçamento é um auxílio de R$ 247.

Economistas consultados pelo Correio calculam que o Renda Brasil pode custar até R$ 95 bilhões por ano, o que exigiria a liberação de pelo menos mais R$ 60 bilhões do Orçamento. E a saída para conseguir essa verba, avisou Waldery, vai ser cortar e remanejar as despesas já previstas no PLOA 2021. É que o Orçamento já está no limite do teto de gastos, e os programas sociais não estão isentos do cumprimento dessa regra fiscal. Além disso, a peça orçamentária também não prevê outras medidas que foram apontadas pela equipe econômica como uma forma de liberar os recursos necessários para o Renda Brasil, como a revisão do abono salarial e o fim das deduções do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). “Para ter o atendimento do teto de gasto, a nova despesa primária terá de ter, na proporção de um para um, a redução de outra despesa primária”, avisou o secretário da Fazenda.

Auxiliares do ministro da Economia, Paulo Guedes, dizem que esse impasse deixa clara a necessidade de revisar as regras orçamentárias por meio dos “3 Ds”: desindexação, desobrigação e desvinculação de receitas. “Cerca de 75% do Orçamento primário é indexado. Mais de R$ 700 bilhões estão ligados a alguma indexação. Se atuarmos com a indexação, será um avanço enorme”, reforçou Waldery. A proposta, por sinal, vem sendo discutida pela equipe econômica com o relator do Orçamento, senador Marcio Bittar (MDB-AC), que também tratou do assunto com Bolsonaro ontem. Na reunião, o presidente teria dado aval à proposta, que deve ser contemplada pelo relatório de Bittar.

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Previsão de deficit de R$ 233,6 bi

O presidente Jair Bolsonaro corre o risco de terminar o mandato sem nenhum ano de superavit primário, mesmo se for reeleito em 2022. É que a crise causada pela pandemia deve deixar as contas do governo central deficitárias até 2026 ou 2027, segundo as projeções do próprio Executivo, que prevê um deficit primário de R$ 233,6 bilhões só em 2021.

Segundo o Tesouro Nacional, o rombo do governo central deve superar os R$ 800 bilhões neste ano, batendo o recorde de 11% do Produto Interno Bruto (PIB), devido ao aumento dos gastos públicos e à redução de receitas provocada pela crise do novo coronavírus. E expectativa é que as contas continuem no vermelho até pelo menos 2026, perfazendo um total de 12 anos de deficits primários.

“Tomando como hipótese as projeções do Focus em relação a juros e ao crescimento e o cumprimento do teto, a gente imagina que entre 2026 e 2027 ainda tenha deficit, ou seja, vire para superavit no final do próximo mandato ou no início do outro”, declarou o secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, na apresentação da proposta de Orçamento de 2021.

O projeto, por sinal, piorou a meta fiscal prevista para o próximo ano: deficit de R$ 233,6 bilhões para o governo central em 2021. Um rombo que representa 3% do PIB e é R$ 84 bilhões pior que o imaginado pelo governo na apresentação da Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO), em abril: um deficit de R$ 149,6 bilhões, ou 1,8% do PIB.

A meta primária de 2021 é resultado da diferença entre a receita líquida prevista de R$ 1,283 trilhão e das despesas de R$ 1,516 trilhão imaginadas para 2021. E, segundo o governo, representa uma projeção conservadora, que não considera a arrecadação de receitas extraordinárias que podem ser obtidas no próximo ano com concessões e privatizações. Se confirmado, porém, será o segundo maior da série histórica, perdendo apenas para o rombo previsto para este ano. E esse deficit ainda chega a R$ 237,3 bilhões quando se considera o resultado primário previsto para as estatais, os estados e os municípios.

A equipe econômica pediu rigor no cumprimento das regras fiscais e o avanço nas reformas. Para auxiliares do ministro Paulo Guedes, essa é a forma de reverter o quadro de deficits sucessivos e criar uma trajetória fiscal sustentável. Tanto que a proposta de Orçamento prevê “deficits persistentes, porém cadentes, devido ao teto dos gastos” nos próximos anos. A expectativa é de que, se mantido o teto de gastos, o rombo do governo central passe a R$ 185,5 bilhões (2,3% do PIB) em 2022 e R$ 153,8 bilhões (1,8% do PIB).

“A gente precisa muito andar nessa agenda de consolidação fiscal, em ações que prevejam uma melhora fiscal não só para 2021 e 2022, como para os outros anos pela frente. Só isso pode melhorar o nosso cenário”, defendeu Funchal, dizendo que “a consolidação fiscal vai acelerar a retomada do superavit primário”. (MB)


Leia mais sobre Orçamento nas páginas 4,6 e 7

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