Discursos de Bolsonaro e Lula levam soberania para o centro do debate

Tanto o atual quanto o ex-presidente falaram, no 7 de Setembro, em defender a soberania nacional. A expressão, porém, tem sentido muito diferente para os dois

Humberto Rezende
postado em 08/09/2020 08:20 / atualizado em 08/09/2020 08:23
 (crédito: AFP)
(crédito: AFP)

Nos discursos que o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva transmitiram no feriado de 7 de Setembro, um termo merece especial atenção dos interessados em acompanhar os rumos da política nacional: soberania.

"Bolsonaro aproveita o sofrimento coletivo para, sorrateiramente, cometer um crime de lesa-pátria: abrir mão da soberania nacional. Não foi por acaso que escolhi para falar com vocês neste 7 de Setembro, dia da Independência do Brasil, quando celebramos o nascimento do nosso país como nação soberana", discursou Lula. "No momento em que celebramos essa data tão especial, reitero, como Presidente da República, meu amor à Pátria e meu compromisso com a Constituição e com a preservação da soberania, democracia e liberdade, valores dos quais nosso País jamais abrirá mão", falou Bolsonaro.

Tudo isso é mais que coincidência, obviamente. Tanto para o lulismo quanto para o bolsonarismo, a forma como o Brasil se posiciona em relação aos demais países é um ponto chave. A novidade parece ser que o atual e o ex-presidente agora fazem questão de deixar isso mais claro ao eleitorado.

Tal movimento ocorre no PT porque, desde a prisão de Lula, fortaleceu-se nos círculos petistas a tese de que a Operação Lava-Jato, o impeachment de Dilma Rousseff e a condenação do ex-presidente fazem parte de uma orquestração que vai muito além das fronteiras nacionais. Os Estados Unidos e seus principais aliados não viam com bons olhos a política externa empreendida pelo PT, que passava pela aproximação de Rússia e China, por meio dos Brics; o apoio à expansão de empresas brasileiras, como a Odebrecht, no mercado exterior; e o controle do pré-sal nas mãos da Petrobras e longe das empresas americanas e europeias. Para interromper esse caminho, os americanos apoiaram e forneceram informações à Lava-Jato com o objetivo não de ajudar o Brasil a combater a corrupção, mas para colocar no poder outro governo.

O importante, para esta análise, não é debater se essa tese encontra respaldo na realidade ou não, mas saber que, para os petistas, ela é mais que um discurso. É uma certeza. Por isso, Lula acredita que o projeto político a ser defendido hoje é "a construção de uma nação inserida numa nova ordem internacional baseada no multilateralismo, na cooperação e na democracia, integrada na América do Sul e solidária com outras nações em desenvolvimento".

Da mesma forma, certo ou não, Bolsonaro parece acreditar no que disse em seu discurso no 7 de Setembro. O presidente já declarou repetidas vezes, mesmo muito antes de chegar ao cargo que ocupa hoje, que a ditadura militar salvou o Brasil do comunismo. No pronunciamento da segunda-feira, dosou as palavras, mas não deixou de mencionar a década de 1960 e a "sombra do comunismo": "Nos anos 60, quando a sombra do comunismo nos ameaçou, milhões de brasileiros, identificados com os anseios nacionais de preservação das instituições democráticas, foram às ruas contra um país tomado pela radicalização ideológica, greves, desordem social e corrupção generalizada". Evitar que o Brasil corra risco semelhante e promover não uma nova ordem multilateral, mas um alinhamento estreito com os Estados Unidos num contexto bipolar, mais semelhante ao da Guerra Fria, faz parte da agenda internacional bolsonarista.

Defender a soberania nacional, portanto, tem um significado muito diferente para Lula e Bolsonaro. E a se julgar pelos discursos dos dois no Dia da Independência, essa diferença será cada vez mais ressaltada por ambos, na tentativa de convencer os brasileiros de qual deve ser o caminho a ser empreendido pelo Brasil no tabuleiro da política internacional.

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