Fraude

Contratos no DF com esquema de fraude semelhante ao praticado no Rio chegam a R$ 123 milhões

Receita importada do Rio rende investigações sobre uma suposta organização criminosa que se instalou na Secretaria de Saúde do DF durante o governo de Agnelo. À frente, um notório conhecido da Justiça fluminense: o empresário Miguel Iskin

Ana Maria Campos
postado em 11/09/2020 06:00
 (crédito: Pedro França)
(crédito: Pedro França)

Uma receita importada do Rio de Janeiro tem rendido investigações de esquemas de corrupção no Distrito Federal. Um velho conhecido da Justiça fluminense, o empresário Miguel Iskin, é apontado como o mentor de uma organização criminosa que se instalou na Secretaria de Saúde do DF durante o governo de Agnelo Queiroz (PT). É o foco da Operação Gotemburgo, deflagrada ontem pelos promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), em conjunto com a Coordenação Especial de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Cecor), da Polícia Civil do DF, para apurar fraudes em contratos que chegam a R$ 123 milhões.

A investigação teve origem no compartilhamento de provas obtidas pela força-tarefa da Lava-Jato no Rio com o Gaeco em Brasília. As supostas fraudes envolvem adesões a atas de registros de preços do Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), no governo de Sergio Cabral, que estavam direcionadas para atender a interesses e negócios do grupo chefiado pelos empresários Miguel Iskin e Gustavo Estellita, condenados por lavagem de dinheiro, e pelo apontado lobista Cláudio Haidamus.

No DF, segundo os investigadores, os contratos irregulares ocorreram durante a gestão do médico Rafael Barbosa, na Secretaria de Saúde. Ele foi um dos alvos dos mandados de busca e apreensão autorizados pela 1ª Vara Criminal de Brasília, que também mirou o ex-secretário de Saúde Elias Miziara.

Foram cumpridos 46 mandados de busca e apreensão no DF, no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Goiás, para apurar fraude em licitação, peculato, corrupção ativa e passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro no âmbito dos processos de contratação das empresas Maquet e Med Lopes Comércio de Material Médico Hospitalar Ltda., conduzidos pela Secretaria de Saúde do DF.

Durante as investigações, a Maquet e outras empresas envolvidas fecharam acordos de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e com o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro. Vários investigados também formalizaram acordos de delação premiada, que permitiram desvendar as fraudes.

As investigações apontaram uma parceria entre servidores públicos da Secretaria de Saúde do DF, do Into, empresários e funcionários. O objetivo era adesões às atas do instituto, que já eram fraudadas no Rio.

Esquema internacional


Segundo o Ministério Público e a Polícia Civil, o dinheiro desviado foi transferido para o exterior — Suécia, China, Estados Unidos, França e Polônia —, com pagamentos em euro e dólar, efetuados via carta de crédito pela Secretaria de Saúde, para contas bancárias de empresas pertencentes ao Grupo Getinge (unidades da Maquet espalhadas pelo mundo) ou para a Moses Trading, sediada nos EUA, num suposto esquema internacional de lavagem de dinheiro.

Em seguida, segundo a investigação, havia repasse de elevado percentual do valor final amealhado nas vendas dos contratos para offshores ligadas a Miguel Iskin. Depois dessa transação, o dinheiro era distribuído como propina.

Ainda de acordo com a investigação, havia a participação, no esquema criminoso, de funcionários e sócios de outras empresas, por meio de falsas disputas nas licitações para justificar as compras fraudadas de equipamentos médico-hospitalares.

Iskin já foi denunciado sete vezes pela Lava-Jato no Rio por fraudes em contratos na saúde. Em duas denúncias, foi condenado a mais de 47 anos de prisão. Há ainda uma oitava ação penal em curso, na qual ele é réu, a partir do compartilhamento de provas com o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Seu sócio nos negócios, Gustavo Estellita foi condenado a nove anos e dez meses de prisão pelos mesmos crimes.

Segundo o Ministério Público Federal, desde 1996 Iskin chefiava o cartel de fornecedoras de materiais hospitalares no Rio, com prejuízos aos cofres públicos de mais de R$ 600 milhões. Em junho, ele foi preso em casa, na Zona Sul no Rio.

Camas cirúrgicas feitas da Suécia

O nome da Operação Gotemburgo faz alusão à segunda maior cidade da Suécia, onde está localizada a sede do Grupo Getinge, do qual faz parte a Maquet, empresa que foi agraciada com a maioria dos contratos formalizados com a Secretaria de Saúde –– e é a líder mundial na fabricação de camas cirúrgicas.


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