Judiciário

Ministro Luiz Fux inicia gestão do STF querendo discutir temas controversos

No início da gestão na Presidência do STF, Fux quer debater prisão em segunda instância, defendida pelos procuradores da Lava-Jato. Depoimento de Bolsonaro na PF está na pauta

Renato Souza
postado em 20/09/2020 06:02
 (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Com apenas duas semanas no comando da mais alta Corte do país, o ministro Luiz Fux deixa claro que haverá uma mudança profunda na maneira de gerir o Supremo Tribunal Federal (STF). Seu primeiro ato foi restringir uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que orientava magistrados de todo o país a afrouxar as penas de detentos em razão da pandemia de coronavírus, que se espalha pelo mundo, inclusive entre o sistema penitenciário brasileiro. A restrição foi aplicada a autores de crimes hediondos, ou seja, contra a vida, e para envolvidos em corrupção, que praticaram atos previstos na Lei das Organizações Criminosas, como lavagem de dinheiro. A conduta do presidente do Supremo mostra semelhanças com ideais e perfis de integrantes da Operação Lava-Jato.


Ainda em seu discurso de posse, Fux afirmou que não aceitaria retrocessos no combate à corrupção, e citou a Lava-Jato. A decisão de restringir a liberação de presos não deve ser a primeira alinhada com os interesses de integrantes da operação. O magistrado demonstrou que a prisão em segunda instância, que atualmente está proibida por decisão do plenário, pode ser revista. Na época do julgamento do tema pelo Supremo, procuradores pró-Lava-Jato em diversos estados criticaram a derrubada do dispositivo, alegando que poderia representar o fim das ações contra crimes de colarinho-branco.


A possibilidade de retorno ao debate sobre a prisão antes do fim do processo levantou reações entre os integrantes do plenário. O ministro Marco Aurélio Mello, que, na época, era relator das ações que questionavam a prisão em segundo grau de Justiça, enviou ofício a Fux, destacando que houve ampla base jurídica para a decisão do plenário, que, na ocasião, seguiu, por maioria, o voto proferido por ele. “Faço-o por dever de ofício, porquanto autor do voto condutor”, escreveu Mello no documento encaminhado ao colega. Fux não respondeu formalmente sobre o tema.


O cientista político Leonardo Queiroz Leite, doutor em Administração Pública e Governo pela Fundação Getulio Vargas (FGV), destaca que, embora tenha começado a gestão com assuntos controversos, a posição de Fux não representa uma surpresa. “A postura do ministro Fux é claríssima. Ele é muito alinhado a essa corrente, chamada de lavajatista. A prisão em segunda instância foi um dos pilares que viabilizou o sucesso da Lava-Jato. A posição dele, como presidente do STF, pode influenciar, especialmente, pelo poder de controlar a pauta dos julgamentos. Se o presidente entender que se criou um movimento favorável para derrubar a decisão atual, ele pode colocar na agenda e fazer valer esse poder de controlar o julgamento. Vai haver mais embate e discussão sobre esse tema, que não é simples”, destaca.


O mandato de Fux começou em meio a um capítulo marcante da história. Ele ascende ao cargo em meio à maior pandemia da história, que também cria desafios jurídicos e sociais. A cerimônia de posse, no dia 10 deste mês, tornou-se um foco de disseminação do coronavírus no Poder Judiciário. Além dele, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e outros três magistrados testaram positivo após participar do evento. Partiu dele a decisão de realizar um ato presencial.

Interferência

Antes de completar o primeiro mês no cargo, Fux tem uma grande saia justa para resolver. Na semana passada, o ministro Marco Aurélio Mello atendeu a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) e suspendeu a tramitação de um inquérito que corre na Corte contra o presidente Jair Bolsonaro. Ele é suspeito de tentar interferir na Polícia Federal para beneficiar parentes e amigos. Ao decidir sobre o caso, Marco Aurélio também revisou a decisão anterior do decano, Celso de Mello, que determinou que a oitiva do chefe do Executivo fosse realizada presencialmente.


Bolsonaro alega que tem direito, em razão do cargo, a prestar esclarecimentos por escrito, como ocorreu no caso do ex-presidente Michel Temer. Marco Aurélio mandou o assunto para ser decidido em plenário, sobre a forma de coleta do depoimento. No entanto, Celso de Mello deve retornar dia 26 e, caso a ação seja pautada antes do retorno dele, será criado um clima de acirramento no tribunal. Interlocutores do presidente do Supremo afirmam que ele deve ouvir o colega informalmente, antes que a licença médica termine.

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