Entrevista

"Qualquer país precisa de programa de assistência", diz relator do Fundeb

Veja o ponto a ponto com Flávio Arns, Senador, relator da PEC do Fundeb no Senado

Bruna Lima
postado em 30/09/2020 06:00 / atualizado em 30/09/2020 14:16
 (crédito: Beto Barata/Agência Senado)
(crédito: Beto Barata/Agência Senado)

A proposta

Considero um absurdo absoluto. Não existe algo mais importante para o Brasil do que a educação. Depois da pandemia, é prioridade absoluta. Tirar recursos da área é impensável. Temos que pensar no desenvolvimento econômico com base na educação. Mais da metade da população do Brasil não tem ensino básico completo. Nas populações mais vulneráveis, apenas 6% têm acesso às creches. O período integral também não é uma realidade ampla. Pensar em retirar recursos da educação quando muitas escolas não têm sequer saneamento básico, água potável, um banheiro, acesso à internet... A população mais vulnerável, que mais precisa, é a mais beneficiada com o novo aporte de recursos do Fundeb.

Problemas fiscais

Há dois problemas na proposta do governo em termos fiscais. O Fundeb está fora da Lei do Teto. Se na Lei do Pacto Federativo se alterar o Fundeb para permitir esse tipo de recurso — o que já se tentou fazer e foi barrado na Câmara — criaria-se um problema judicial, pelos desvios de gastos com assistência. Outra questão é o remanejamento dos gastos com precatórios, com a tentativa de postergar o pagamento de dívidas. Isso significa apenas que o governo está jogando uma dívida para frente. As duas situações são ilegais, inconstitucionais e podem ser interpretadas até no sentido de roubar uma verba para outra finalidade, o que mais parece ter um cunho eleitoral.

Presente e futuro

Investir na educação também é para o agora. O futuro se constrói já. Temos que cuidar bem da criança na creche, no ensino fundamental, médio, superior. É a ótica de investimento. Um ensino de qualidade, com alimentação, assistência psicopedagógica, material didático, acesso a internet, uma boa biblioteca, equipamentos… Ter uma escolas bonitas, acolhedoras, de qualidade, tudo isso é essencial e não se pode substituir por uma atitude eleitoreira. Não tenho dúvida disso. É necessário ter programas sociais. Qualquer país do mundo, por mais desenvolvido que seja, precisa de programas de assistência. Mas, veja, os recursos precisam partir da assistência social. Usar a educação é um dano irreparável. Torna-se ainda mais impensável ao avaliar que, há um mês, a PEC do Fundeb foi promulgada, e o governo já está querendo mudar tudo. É um absurdo.

Outras fontes

Foi levantada uma proposta no Senado em que apontamos como uma das fontes de arrecadação o tributo de lucros e dividendos de pessoa física que ficam acima de R$ 300 mil mensais. Pelos relatórios da Receita Federal, cobrar essa arrecadação no Brasil, o que é comum no cenário internacional, poderia reverter em verba aos estados e municípios para recursos não só para o Renda Cidadã, mas para vários programas que o Brasil precisa.

Desigualdade

Aprovar essa proposta seria reforçar ainda mais a desigualdade. A União complementa, justamente, a renda dos municípios mais carentes, que mais precisam. O Fundeb é o maior programa do Brasil e melhora agora com a reforma aprovada. Atualmente, cada aluno recebe R$ 3,7 mil por ano e, até 2026, quando toda a programação da reforma for cumprida, nenhuma criança ou adolescente receberá menos que R$ 5,6 mil, 5,7 mil/ano. Isso é trabalhar na redução das desigualdades. Este programa é um sucesso que está há 15 anos e foi aprimorado para que o dinheiro vá aos municípios mais pobres pelos critérios estabelecidos pela emenda constitucional. Sobretudo em um momento em que as arrecadações estão menores.

Aprovação

O Fundeb foi aprovado à base de um consenso. No Senado foi por unanimidade. Na Câmara, houve um debate e se chegou ao resultado. É uma construção de toda uma sociedade, instituições da área, secretários, governo. Um avanço, ainda que a disponibilização de recursos seja pouca comparada ao que países desenvolvidos empregam. Mas é o caminho certo para uma redução das desigualdades, para garantir uma educação boa, com merenda, transporte, estrutura e qualidade. O consenso está a favor da Educação. Não observamos um movimento de manifestações que converge com essa ideia do governo.

Contra o país

O governo apresentou essa proposta mesmo sabendo desse grande consenso e da divergência da sociedade em tirar verba da educação para esse cunho. O que se está propondo é retirar dinheiro da área para burlar o teto de gastos, não faz sentido. Quem sugeriu isso deveria pedir demissão porque está trabalhando contra o Brasil.

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