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Bolsonaro fica irritado com críticas à indicação de Kassio Marques ao Supremo

Presidente se diz "chateado" com a repercussão negativa à indicação de Kassio Marques para a vaga no STF e mira, principalmente, o pastor Silas Malafaia, apoiador do governo, mas que classificou a escolha como "vergonhosa"

O presidente Jair Bolsonaro mostrou-se irritado com as críticas à indicação do desembargador Kassio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, para a vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), a ser aberta, neste mês, com a aposentadoria do ministro Celso de Mello. A apoiadores, na saída do Palácio da Alvorada, reclamou dos ataques que vem sofrendo pela escolha. “Ou confia em mim, ou não confia”, disparou.

O chefe do Executivo mirou, principalmente, as manifestações do pastor Silas Malafaia, que vem tecendo críticas, pelas redes sociais, a ele e à indicação que fez. Para o comandante do Planalto, Marques está sendo vítima de “covardia”.

“Lamento muito. Uma autoridade lá, no Rio, alguém que eu prezava muito, está me criticando muito, com videozinhos, e me xingando de tudo quanto é coisa porque eu escolhi (Marques) para ir para o Supremo”, frisou. “E está mantido, a não ser que haja um fato novo, gravíssimo, contra ele. E, pelo que tudo indica, não tem. Ele vai para o Supremo. Agora, é uma covardia o que estão fazendo com ele.”

Malafaia vem divulgando, em suas redes sociais, que é “uma vergonha e decepção geral” a primeira indicação de Bolsonaro para a vaga no STF. O religioso disse, ainda, que o escolhido foi nomeado pela então presidente Dilma Rousseff para desembargador do TRF-1 e que teria “posições socialistas”. O chefe do Executivo, porém, ressaltou que a indicação ao cargo cabe unicamente a ele e classificou a escolha como “crucial” para o governo.

“Essa infâmia que essa autoridade lá no Rio está fazendo contra o Kassio é uma covardia. Até porque, ele está fazendo porque queria que eu colocasse um indicado por ele. Com todo respeito, o presidente sou eu. Eu não tenho cabeça dura, não. Eu volto atrás em decisões minhas, mas essa decisão é crucial para mim”, justificou.

Bolsonaro aproveitou para alfinetar Sergio Moro, ex-ministro da Justiça que se tornou desafeto do governo. “Que tal eu indicar o Sergio Moro para o Supremo? Se ele não tivesse pedido demissão, e estivesse comigo até hoje, vários de vocês estariam falando: ‘Ou é o Sergio Moro para o Supremo ou não tem reeleição em 2022’. É ou não é? Ou vocês confiam em mim, ou não confiam”.

Defesa

Como fez na live de quinta-feira, Bolsonaro defendeu Marques das críticas por ter liberado, em maio de 2019, a compra de lagosta e vinho para eventos do STF, que havia sido impedida por uma juíza federal. De acordo com o presidente, isso não tira as qualificações do desembargador.

Ele admitiu estar aborrecido com as “calúnias” que tem ouvido contra Marques. “Quer me criticar? Critique, sem problema nenhum, agora, ir para a calúnia, igual esse cara (Malafaia) do Rio está fazendo covardemente, caluniando o cara...”, disse, irritado, acrescentando estar surpreso com a atitude do religioso. Embora não o tenha citado diretamente, disse que “o que mais dói” é que os ataques venham de “uma autoridade que diz que tem Deus no coração”.

O episódio sobre o terrorista Cesare Battisti também foi citado por Bolsonaro. Na época, Marques votou contra a deportação dele, pedida pelo governo italiano. “Culpar o desembargador pelo Battisti ter ficado no Brasil… É um covarde o cara que faz uma acusação dessas. Estou chateado, sim”, admitiu.

A indicação do desembargador foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) de ontem, com o encaminhamento para sabatina no Senado. Na mesma edição, o presidente concedeu a aposentadoria a Celso de Mello, a partir do próximo dia 13. O fato de Bolsonaro ter indicado o substituto de Celso de Mello antes de o decano deixar o STF também foi visto como uma deselegância.

 

Sabatina no Senado terá de esperar

A presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Simone Tebet (MDB-MS), avisou, ontem, que a sabatina do desembargador Kassio Nunes Marques, indicado ao Supremo Tribunal Federal (STF), não ocorrerá antes de 13 de outubro, quando o ministro Celso de Mello se aposenta. A medida, segundo ela, é uma forma de “respeito” ao decano da Corte.

A indicação de Marques pelo presidente Jair Bolsonaro foi publicada na edição de ontem do Diário Oficial da União. O escolhido ainda precisa ser sabatinado na CCJ e ser aprovado pelos senadores na comissão e depois no plenário.

A votação deve ser secreta e com a presença dos senadores em Brasília — desde o início da pandemia da covid-19, a Casa tem feito sessões virtuais. Para ter a indicação ao Supremo confirmada, Marques precisa do aval de 41 dos 81 parlamentares.

A tramitação da indicação depende de um ato da Mesa Diretora da Casa. Na prática, caberá ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), dar início à apreciação. “Vamos aguardar o despacho da Mesa Diretora e, em função da pandemia, a data dependerá de acordo com os líderes partidários, por se tratar de votação secreta e presencial”, afirmou a presidente da CCJ, em nota.

A escolha de Marques agradou a uma ala do Supremo e a políticos do Centrão, que querem enfraquecer a Lava-Jato, mas foi alvo de críticas por militantes bolsonaristas.

Dossiê

Senadores lavajatistas preparam um dossiê para levantar o histórico do desembargador, seus posicionamentos sobre temas polêmicos e envolvimento com investigados.

Os parlamentares querem saber, por exemplo, se o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) pode ser favorecido pelo candidato a ministro no STF. O filho mais velho do presidente é investigado pela prática da rachadinha no período em que foi deputado estadual no Rio de Janeiro. O caso é julgado no Tribunal de Justiça fluminense, mas há um recurso do Ministério Público que discute o foro do senador em análise pela Corte.