Campos renova domínio do PSB

Disputa familiar: deputado federal João Campos foi eleito prefeito ao ganhar uma acirrada disputa contra sua prima, a também deputada federal Marília Arraes (PT). Ele obteve 56,27% dos votos, ante 43,73% recebidos por ela

Bruna Lima
postado em 30/11/2020 00:14
 (crédito: Ana Leal/Estadão Conteúdo)
(crédito: Ana Leal/Estadão Conteúdo)

 

Uma das mais acirradas disputas por prefeitura entre as capitais brasileiras terminou com vitória do deputado federal João Campos (PSB) em Recife, com 56,27% dos votos. O resultado surpreendeu por ir de encontro às apurações do primeiro turno e às primeiras pesquisas do segundo, que apontavam preferência à também deputada federal e prima de Campos, Marília Arraes (PT).
Aos 27 anos recém-completados, o filho de Eduardo Campos — ex-governador de Pernambuco e candidato à Presidência morto em acidente aéreo durante campanha eleitoral de 2014 — é o prefeito mais jovem a assumir a liderança da capital pernambucana e também o mais novo entre os eleitos à prefeitura de uma capital brasileira. Em discurso de agradecimento, João prestou homenagens ao pai. “Não tem como vir aqui, hoje, celebrar essa vitória, e não fazer uma homenagem, lembrar, daquele que é referência da minha vida na política, como pessoa, como cidadão, que é o meu pai, Eduardo Campos”.
Ao se inspirar na trajetória do pai, João arrancou lágrimas da mãe, Renata Campos, em um discurso emocionado. “Meu pai me disse uma vez: sempre que puder ajudar uma pessoa, faça sem esperar nada em troca. E sempre que fizer alguma coisa na vida, faça bem-feito. É assim que vamos governar Recife”, completou.
Pelas redes sociais, o prefeito eleito aproveitou para agradecer o eleitorado. “Muito obrigado, Recife. Que caminhada incrível. A felicidade é muito grande por aqui, estamos juntos pelos nossos sonhos. O futuro começa agora”, escreveu. Ao lado de Campos, comemoraram o resultado a vice-prefeita eleita, Isabella de Roldão (PDT); o atual governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB); e a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP), namorada do prefeito.

Rixas

A disputa política e familiar foi marcada por acusações, interferência judiciais e grande rixas partidárias. Até as últimas pesquisas, os dois candidatos apareciam com empate técnico, acentuando ainda mais o tom agressivo para angariar vantagens na reta final para o segundo turno das eleições municipais.
Ainda na manhã das votações, o Partido dos Trabalhadores apostava em Marília Arraes para conquistar, pelo menos, uma capital brasileira, contando com pesquisas internas que apontavam vitória da petista. As expectativas foram frustradas, com diferença de 13 pontos percentuais, cerca de 100 mil votos de vantagem para Campos.
Entre os elementos apontados como cruciais para a reviravolta nos resultados foi o apoio do voto evangélico ao pessebista. Em ofensiva à prima, iniciou-se uma distribuição de material gráfico afirmando ter sido Arraes a responsável por tirar a Bíblia da Câmara Municipal quando ela foi vereadora e a associando com temas como ideologia de gênero, aborto e legalização de drogas, para angariar votos. A divulgação foi barrada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
A campanha da petista também perdeu espaço com o surgimento de denúncias sobre contratos de funcionários fantasmas quando Arraes era vereadora. Uma fala do deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE), divulgada pela revista Veja, foi a cartada final para desmoralizar a candidata. Em um áudio, o parlamentar sugere intenção da petista em montar caixa de campanha com salário de assessores. Gadêlha rebateu dizendo que a fala foi tirada de contexto, enquanto Marília disse não ter cometido crime.
A guerra entre os candidatos também foi marcada por desavenças familiares. Ex-pessebista, Arraes deixou o partido após ser preterida pelo primo Eduardo Campos na disputa por uma vaga na Câmara, em 2014. Quatro anos mais tarde, pelo PT, foi eleita deputada federal, enquanto o primo, João, também conquistou uma cadeira pelo PSB. O encontro de interesses no Executivo foi novamente chacoalhado neste 2020, com direito a pedidos da conselheira do Tribunal de Contas da União Ana Arraes, avó paterna de João e tia de Marília, por respeito às memórias de Miguel Arraes, ex-governador do estado, e de Eduardo Campos.
Após a caminhada marcada por intensa disputa partidária e familiar, João Campos amenizou a richa, em discurso unificador de vitória. “Meu coração, hoje, só tem dois sentimentos: gratidão e esperança. Quero agradecer aqueles que votaram em mim, mas, aqui, eu também quero agradecer a todos os recifenses porque, a partir de agora, fomos eleitos para ser o prefeito de todos os recifenses. Nós governaremos para todos”, destacou.
A vitória garante mais quatro anos de liderança do PSB na capital pernambucana, que já tem hegemonia há oito e cuja perpetuação partidária foi uma das principais fragilidades que quase conduziram Arraes à prefeitura. Com a derrota, o PT não comanda nenhuma capital brasileira e perde força em todos os principais colégios eleitorais.

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Paes: "vitória da política" e da diversidade no Rio

 (crédito: Wilton Junior/Estadão Conteúdo)
crédito: Wilton Junior/Estadão Conteúdo

Com 64% dos votos válidos, Eduardo Paes (DEM) voltará à prefeitura do Rio. Ele derrotou o atual prefeito, Marcelo Crivella (Republicanos), que tentava a reeleição com o apoio do presidente Jair Bolsonaro e ficou com 36%. Paes ganhou em todas as zonas eleitorais e teve o melhor resultado de um candidato em segundo turno desde a redemocratização. A abstenção de 35%, no entanto, superou até o número de votos do vencedor: 1,7 milhão de cariocas deixaram de ir às urnas, enquanto Paes recebeu 1,6 milhão de votos (leia mais na página 6)
Favorito desde o início da campanha, Eduardo Paes conseguiu manter a dianteira tanto no primeiro quanto no segundo turnos, e, em nenhum momento, se viu ameaçado. Durante a primeira etapa, ele priorizou as comparações entre seus mandatos anteriores e o de Crivella, que é altamente rejeitado pela população.
“Nós passamos os últimos anos radicalizando a política brasileira e contestando aqueles que exercem a atividade política, e os resultados desse quadro de extremos não fizeram bem aos cariocas nem aos brasileiros. Essa eleição manifestou uma força muito grande daqueles que exercem a atividade política, a gestão pública”, disse, na noite de ontem, no discurso de vitória. “O governo reacionário que tomou conta da cidade nos últimos quatro anos foi ruim na gestão, piorou a vida das pessoas e olhou a cidade com muito preconceito”.
Maior derrota

Sem uma marca clara, o atual prefeito apelou para a aproximação com o bolsonarismo e, no segundo turno, partiu para o ataque contra Paes, propagando fake news requentadas de 2018, como o suposto “kit gay”. Ele foi denunciado pela Procuradoria Regional Eleitoral por difamação e propaganda falsa.
A derrota do atual prefeito é a maior de um candidato em segundo turno no Rio desde a redemocratização. Antes, o recorde havia sido em 1996, quando Luiz Paulo Conde (PFL, hoje DEM) venceu Sérgio Cabral (PSDB) com 62% contra 38%. Crivella fez um pronunciamento, à noite, para agradecer o engajamento de seus eleitores, sobretudo os evangélicos. Sem citar o nome do adversário, falou por 10 minutos e não respondeu se havia ligado para cumprimentar o prefeito eleito.
“Quero agradecer a votação que fizemos. Os institutos de pesquisa falavam com convicção que não iríamos nem ao segundo turno”, disse e agradeceu o apoio recebido de Bolsonaro. “O presidente é um homem de convicções. Ele contrariou a maré por convicções”, afirmou Crivella, acrescentando que vai batalhar pela reeleição do presidente.

Vínculo

Eleito, agora, pelo DEM, Paes ocupou a prefeitura pelo MDB entre 2009 e 2016. Com o esfacelamento do partido no estado — motivado por escândalos de corrupção —, migrou para a atual legenda. Na eleição para vereador na capital, o DEM fez sete vereadores. Trata-se da maior bancada, empatada com PSOL e o Republicanos de Crivella.
Apesar de ser a maior vitória do DEM nas capitais, Paes não tem um vínculo partidário tão forte e se recusa a se apresentar como cabo eleitoral de qualquer projeto da legenda para o país em 2022. Diz sempre que só é “palanque” para o Rio, e que a cidade está abandonada demais para ele pensar em cenários nacionais. Um dos partidos que o apoiaram na eleição foi o PSDB, do governador e possível presidenciável João Doria.
Ao comentar a vitória do aliado, Rodrigo Maia (DEM) foi na mesma linha e tentou desvincular o resultado no Rio da disputa de 2022. “Não tem nada a ver com a eleição nacional. É uma vitória da política, e o Bolsonaro sempre fez política. É uma vitória daqueles que fazem política e administram com qualidade. É a vitória do Rio”, disse.

Menos dinheiro

Prefeito na época do Rio dos grandes eventos, especialmente a Olimpíada, Paes receberá, agora, uma prefeitura com situação financeira desfavorável. A tendência é de que seja feita uma gestão com menos obras e projetos de grande porte, que foram a marca de seus mandatos anteriores. Durante a campanha, o prefeito eleito focou em retomar serviços básicos que, segundo ele, foram sucateados com Crivella.

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