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Meta é fazer Câmara trabalhar

Passado o primeiro turno das eleições municipais, lideranças do governo tentam dar fim à obstrução da pauta, provocada pela disputa à presidência da Comissão Mista de Orçamento. Casa tem sessão marcada para hoje

Lideranças do governo trabalham para acabar com a obstrução da pauta da Câmara. Passado o primeiro turno das eleições municipais, há a expectativa de uma plenária, hoje, para votar o PL 4199/2020, que define um programa de incentivo à cabotagem e que tramita em regime de urgência, travando a pauta; e a Medida Provisória 993 de 2020, permitindo a prorrogação de contratos do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) por tempo indeterminado. O debate e a aprovação dos textos poderiam ajudar a mudar o rumo da disputa pela presidência da Comissão Mista de Orçamento (CMO), que tem provocado a paralisação dos trabalho.

A briga pela CMO envolve o grupo do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), respaldado por PSDB e MDB, defendendo o acordo feito em fevereiro para que o deputado Elmar Nascimento (DEM-BA) presidisse o colegiado, contra o grupo de Arthur Lira (PP-AL), formado também por PL, PP, PSD, Solidariedade e Avante, que são base do governo, a favor da deputada Flávia Arruda (PL-DF) para o cargo. O cabo de guerra envolve o poder sobre o orçamento do ano que vem e a corrida pela Presidência da Casa. O Centrão, de Lira, considera decidir a mesa do colegiado no voto.

Líderes do governo já falam em tom de solução e lembram que a política tem um tempo próprio. O senador Eduardo Gomes (MDB-TO) afirmou que, às vezes, uma disputa se prolonga, mas “a solução sai em 24 horas”. No grupo de Lira, há quem diga que não há mais clima para obstrução. Porém, muitos parlamentares ainda têm dúvidas de que impasse será encerrado. Especialistas apontam a possibilidade de o governo adiar a negociação, mas garantir um clima de boas pautas até o segundo turno das eleições municipais.

Para Ricardo Ismael, doutor em ciência política, professor e pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), o governo terá de enfrentar pautas negativas e impopulares em um período muito curto de tempo. Para ele, o Executivo não fará isso antes do segundo turno, que tem o PT na disputa em 15 cidades. Além disso, há Guilherme Boulos (PSol) e Manuela D’Ávilla (PCdoB) em busca de comandar prefeitura em São Paulo e Porto Alegre, respectivamente. Seria dar uma bandeira para a oposição, fortalecer essas candidaturas e sofrer ainda mais derrotas do que as vistas no primeiro turno.

Bolsa Família
Dessa forma, é importante para o governo (e sua base, o Centrão) limpar a pauta, ganhar fôlego e se preparar para voltar à briga. Tentar emplacar as matérias necessárias para garantir a expansão do Bolsa Família, com o objetivo de evitar que o presidente Jair Bolsonaro perca popularidade depois de dezembro, quando acaba o auxílio emergencial. “A questão é que muitas cidades vão ter segundo turno. Se começar, agora, uma pauta de maldades, de temas controversos, isso pode detonar candidatos apoiados por Bolsonaro e do Centrão. O PT está em segundo turno em 15 cidades com mais de 200 mil eleitores, e há a oposição em Porto Alegre e São Paulo”, ressaltou o cientista político. “Então, gera uma dúvida se vão acelerar a pauta, ou cozinhar em banho-maria mais 14 dias. Uma pauta negativa, que impacte o bolso do brasileiro, pode resultar em votos para a oposição.”

Entre as pautas negativas possíveis está a PEC Emergencial, que regulamenta o teto de gastos e cria cortes para financiar a expansão do Bolsa Família e um possível novo tributo. “Tem a reforma tributária, e Guedes (Paulo Guedes, ministro da Economia) quer aumentar imposto. Tem a questão da sucessão da Câmara e do Senado. A expectativa que eu tinha é de que o foco seria dividido em eleições municipais e Congresso. Mas, vai sair a rodada de novas peças, debate no Rio de Janeiro, em São Paulo, em Fortaleza, em Porto Alegre, no Recife, cidades que irradiam muito para o debate nacional. Portanto, tem um clima de banho-maria. E o governo sabe que terá de substituir o auxílio (emergencial). Se não criar uma alternativa, a popularidade vai cair.”

Sem acordo
O deputado Marcelo Ramos (PL-AM) disse não ver solução próxima para a CMO. “Acho que, em algum momento, vai ter de ir para o voto. O clima está muito acirrado, entre Lira e Rodrigo Maia, e isso não vai permitir um acordo na CMO. A pauta segue travada. Mas a pergunta é anterior: qual é a pauta do governo?”, questionou. “O governo tem dificuldade de estabelecer a pauta do país. Não há nenhuma mais urgente do que a PEC Emergencial, que o governo não inclui na pauta. Se o Brasil virar o ano sem essa proposta, sem LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), sem LOA (Lei Orçamentária Anula) vai ser difícil. Ou vai ter de romper o teto de gastos, sinal ruim para o mercado, com onda de retração econômica; ou ser rígido fiscalmente e pagará com uma impopularidade profunda”, avaliou.

Para Ramos, o governo deveria abandonar tudo e investir na PEC Emergencial, que tramita no Senado. Sem o apoio explícito de Bolsonaro, o parlamentar acredita que será difícil o texto avançar. “Ele quer que o desgaste seja nosso. Só que isso vai começar no Senado, e ele vai ter de dizer que é a favor de medidas duras. Vai entrar nisso com responsabilidade de ser líder maior do país, o que exige decisões impopulares, ou o Brasil vai entrar em uma crise muito grave”, alertou.

Vice-líder do bloco da maioria, o deputado Cacá Leão (PP-BA), por sua vez, vê a possibilidade de a questão se resolver “nos próximos dias”. “A Câmara chamou sessão para amanhã (hoje). Não sei se vai acabar a obstrução pela CMO, mas desejo um grande acordo, pois ela precisa andar, trabalhar”, destacou. “Sou contra a tese de o orçamento ser votado no plenário. É importante a instalação da comissão. Se houver disputa, vai para o voto. E o vencedor trabalha com o vencido, como deve ser na democracia.”

“A Câmara chamou sessão para amanhã (hoje). Não sei se vai acabar a obstrução pela CMO, mas desejo um grande acordo, pois ela precisa andar, trabalhar”
Cacá Leão, deputado