Favorito do governo para presidência da Câmara enfrenta problemas na Justiça

O parlamentar é tido como exímio articulador político e muito atencioso com os colegas. O líder do PP e do Centrão também tem fama de ser um rigoroso cumpridor de acordos

Jorge Vasconcellos
postado em 06/12/2020 06:00 / atualizado em 06/12/2020 09:10
 (crédito: Luis Macedo/Camara dos Deputados - 12/7/19 )
(crédito: Luis Macedo/Camara dos Deputados - 12/7/19 )

A disputa pela Presidência da Câmara tem atraído muitas atenções para o nome do deputado Arthur Lira (PP-AL), o candidato preferido do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para concorrer à eleição na Casa, em fevereiro. O líder do PP e do Centrão comanda uma bancada de cerca de 170 parlamentares e é um exímio articulador político. Em troca de apoio ao governo, ele negociou a nomeação de aliados para importantes cargos federais. Apesar de ser um dos integrantes mais poderosos do Congresso, sempre atuou nos bastidores. Discreto, avesso a holofotes, também é conhecido por, dificilmente, falar com a imprensa.

Lira é a personificação da chamada “velha política”, que Bolsonaro ameaçou de extinção durante a campanha de 2018. No comando do Centrão, o deputado esteve ao lado, também, dos governos dos então presidentes Michel Temer (MDB) e Dilma Rousseff (PT).

A promessa de Bolsonaro de acabar com o “toma lá dá cá” e outras práticas tradicionais da política brasileira, porém, não sobreviveu a um momento de forte isolamento político, vivido pelo presidente no início do ano. Acuado por investigações, alvo de dezenas de pedidos de impeachment na Câmara, o chefe do Executivo acabou se jogando nos braços do Centrão, ao qual assegurou, como fizeram Dilma e Temer, um amplo espaço de participação no governo.

Advogado, pecuarista e empresário, Lira, de 51 anos, é filho do senador Benedito de Lira. Com uma carreira política iniciada em 1993, foi vereador em Maceió e deputado estadual por Alagoas. Na Câmara, está no terceiro mandato consecutivo de deputado federal. Segundo parlamentares ouvidos pelo Correio, chama muito a atenção o profundo conhecimento que ele tem do Regimento Interno da Câmara, possivelmente fruto da formação em direito.

O deputado é visto pelos colegas como um político discreto, mas, ao mesmo tempo, muito divertido e generoso. Grande parte da influência na Câmara, ele conquistou ajudando seus pares em questões pertinentes ao dia a dia do mandato parlamentar. Aos que procuram os melhores apartamentos funcionais em Brasília, por exemplo, articula uma solução com o deputado André Fufuca (PP-MA), seu aliado, 4º secretário da Câmara, encarregado desse e de outros assuntos administrativos.

Um deputado que falou reservadamente com o Correio contou que, durante um bom tempo, Lira ficou conhecido como o “Eduardo Cunha 2.0”, ou seja, uma versão turbinada do ex-presidente da Câmara, que teve o mandato cassado e foi condenado à prisão, no âmbito da Lava-Jato. Cunha também lançava mão de uma série de artifícios, muitos deles questionáveis, para angariar o apoio dos colegas. A Polícia Federal descobriu, por exemplo, que ele usou R$ 30 milhões recebidos como propina da JBS para comprar apoio dos colegas na eleição para a Presidência da Câmara.

A identificação de Lira com Cunha era tanta que o líder do Centrão foi acusado de participar de infrutíferas manobras regimentais para tentar salvar o aliado da cassação do mandato. Em 2016, ao responder a uma consulta do então presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), sobre o rito do processo de cassação, o político do PP apresentou à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) um parecer propondo que fosse votado, no plenário da Casa, um projeto de resolução, e não o relatório elaborado pelo Conselho de Ética. O texto de Lira abria caminho para que Cunha, em vez de ser cassado, sofresse apenas uma pena alternativa.

Promessas cumpridas

O deputado é conhecido, também, como um rigoroso cumpridor de acordos. “Essa é uma das principais qualidades apontadas pelos colegas, porque tem muito político que promete que faz, mas não entrega. Então, isso o torna um líder benquisto pelos colegas. Se ele se compromete, entrega o que prometeu”, diz o cientista político André Pereira César, da Hold Assessoria Legislativa, conhecedor dos bastidores do Congresso.

“Então, isso é uma coisa que ele trabalha muito bem e que o ajudou a conquistar espaço na Câmara. Abre um leque de conversas tanto com a direita quanto com a esquerda. Claro que ele comete erros, como está cometendo, na nossa avaliação, e também de alguns colegas dele, na briga com Rodrigo Maia (DEM-RJ) pela presidência da Comissão Mista de Orçamento”, ressalta Pereira César.

O analista se refere à disputa que os grupos políticos do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e de Lira travam para colocar seus respectivos aliados no comando da poderosa comissão. Em razão dessa briga, o Centrão passou a obstruir as votações no plenário da Câmara, em outubro. O bloco decidiu suspender as obstruções em 18 de novembro, mas, desde então, poucas matérias relevantes têm sido aprovadas pelos deputados. “Nossa avaliação é que ele avançou muitos sinais, foi com muita sede ao pote e deve pagar algum preço por causa disso”, destaca o cientista político.

Como candidato à sucessão na Câmara, Lira tem dialogado com diferentes partidos, na tentativa de atrair votos na disputa contra o grupo de Rodrigo Maia. Nessas conversas, o grande desafio do líder do Centrão é convencer os colegas de que, apesar da proximidade com Bolsonaro, vai defender a autonomia do Legislativo e a independência em relação ao Executivo.


Rivalidade

Na disputa pela Presidência da Câmara, Arthur Lira rivaliza com o grupo do atual mandatário da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O político carioca pode tentar a recondução, se o Supremo Tribunal Federal avalizar — a Corte julga o tema e, por enquanto, há quatro votos favoráveis à permissão das reeleições na Câmara e no Senado. Caso o STF proíba a recondução, Maia tentará fazer seu sucessor.
O nome preferido dele é o de Baleia Rossi (MDB-SP)

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... e de várias denúncias na Justiça

Ao mesmo tempo em que desfruta de prestígio na Câmara, o deputado Arthur Lira recebe um tratamento bem menos acolhedor do Poder Judiciário. Em novembro, por exemplo, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou um recurso do parlamentar e decidiu mantê-lo como réu em um processo por corrupção.

Lira é acusado de ter recebido, em 2012, propina de R$ 106 mil do então presidente da Companhia Brasileira de Transportes Urbanos (CBTU), Francisco Colombo. Segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), Colombo queria que Lira articulasse apoio político no PP para mantê-lo no comando da CBTU. Conforme acusações dos procuradores, o dinheiro foi recebido no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, pelo assessor parlamentar Jaymerson José Gomes que, segundo apontaram as investigações, foi enviado à capital paulista por Lira. O assessor, de acordo com a PGR, escondeu o dinheiro nas roupas, mas foi descoberto e preso pela Polícia Federal.

Em junho de 2020, a PGR denunciou ao STF tanto Lira quanto o executivo da empreiteira Queiroz Galvão, Francisco Ranulfo, e os colaboradores da Justiça Alberto Youssef, Leonardo Meirelles e Henry de Carvalho. Eles são acusados de crimes de corrupção ativa e passiva, evasão de divisas e lavagem de dinheiro. Conforme a denúncia, em 2012, Lira recebeu R$ 1.588.700 provenientes de valores desviados de obras da Petrobras executadas pela empreiteira Queiroz Galvão.

Em abril, também em 2020, a 1ª Vara Federal de Curitiba decretou o bloqueio mensal de 10% dos salários de Lira e de outros parlamentares. Os recursos servirão de garantia do cumprimento de penas pecuniárias requeridas em ações de improbidade administrativa envolvendo irregularidades em contratos da empreiteira Queiroz Galvão com a Petrobras.

Petrobras

Lira também foi denunciado pela PGR, com o pai, em setembro de 2015. Eles são acusados dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por receberem propina no valor de R$ 2,6 milhões, nos anos de 2010 e 2011. Segundo os procuradores, pai e filho participaram de esquema relacionado à Diretoria de Abastecimento da Petrobras, na época chefiada por Paulo Roberto Costa, a partir de indicação política do PP.

Em maio de 2018, Lira foi acusado de comandar um esquema de “rachadinha”, à época em que era deputado estadual na Assembleia Legislativa de Alagoas. Conforme denúncia da PGR, as irregularidades ocorreram entre 2001 e 2007, causando prejuízo de R$ 254 milhões aos cofres públicos. O parlamentar foi acusado de ter um rendimento mensal de R$ 500 mil com o recebimento de parte dos salários dos servidores da Assembleia. Entretanto, o juiz Carlos Henrique Pita Duarte, do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ-AL), considerou as provas do processo ilegais e absolveu o deputado, em decisão divulgada na sexta-feira. O Ministério Público, porém, anunciou que vai recorrer da decisão. No mesmo dia, Lira tuitou: “A vida do homem público é um livro aberto e quem está nela precisa ter serenidade. Nada como um dia depois do outro”.

Procurado, o advogado de Lira, Pierpaolo Bottini, enviou a seguinte nota: “Dos cinco inquéritos que tinham, três foram arquivados. Os inquéritos contra o deputado são todos com base em delação do senhor Alberto Youssef, que já se colocou como um inimigo do deputado. A Justiça, com o arquivamento dos processos, está mostrando que todas as delações não têm provas nem fatos corroborados”. (JV)

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