A esquerda tenta se unificar para disputar mais espaços na Câmara, no lusco-fusco criado pelo veto do Supremo Tribunal Federal (STF) à reeleição dos atuais presidentes do Senado e da Câmara, mas não sabe ainda o rumo que vai tomar. Como havia uma expectativa de que a reeleição fosse aceita pela Corte, apesar de contrariar o texto constitucional, o líder do PP, Arthur Lira (AL), do Centrão, apoiado pelo presidente Jair Bolsonaro, trabalhava fagueiro a sua candidatura ao cargo, enquanto os aliados do atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que negava a pretensão de tentar ser reconduzido, esperavam o julgamento para decidir o que fazer. Agora, com o veto à reeleição, o Centrão tem um candidato único, apoiado pelo Palácio do Planalto, e Maia corre contra o prejuízo, formando um bloco de 147 deputados, com DEM, PSDB, MDB, PSL, Cidadania e PV, mas ainda não tem candidato. A esquerda tem deputados suficientes para desequilibrar o jogo e decidir a disputa, o problema é que está dividida entre Lira, o candidato governista, e o concorrente que vier a ser apoiado pelo grupo de Maia.
Nos bastidores da Câmara, Lira tem procurado as lideranças de esquerda oferecendo um pacote de vantagens que seduz boa parte dos deputados e até a cúpula de alguns partidos: nova legislação antiLava-Jato, que é música para os enrolados em escândalos; volta do imposto sindical, reivindicação dos sindicalistas dos partidos de esquerda, do Solidariedade e do PTB, que fazem parte do Centrão; participação na Mesa Diretora da Câmara, da qual o PT, por exemplo, está afastado desde a eleição de Eduardo Cunha (MDB-RJ); e acesso direto à Presidência da Casa, grande reclamação da maioria dos deputados do chamado “baixo clero”, que se ressentem da mediação feita pelos líderes de bancada junto a Maia.
“Lira quer o nosso apoio, mas acho isso impossível, mesmo que ele nos prometa mundos e fundos. Não podemos eleger um presidente da Câmara que, em nenhuma hipótese, colocaria na pauta o impeachment do presidente Jair Bolsonaro, que faz um desgoverno”, dispara o deputado Carlos Zarattini (PT-SP). O parlamentar integra a ala da bancada que deseja um entendimento com Maia para a eleição de um presidente da Câmara que garanta a independência da Casa, mas esse nome ainda não existe. A maior bancada da Câmara, com 54 deputados, está dividida. Alguns defendem o lançamento de uma candidatura de esquerda, num bloco que pode chegar a 122 parlamentares, com PSB (31), PDT (28), PSol (10) e Rede (1); e outros preferem um acordo com Lira, que lhes garantam cargos, comissões e relatorias. O assunto será a principal pauta da reunião de bancada do PT, marcada para hoje.
Em reunião ocorrida na sede do PSB, na terça-feira, que teve como anfitrião o presidente da legenda, Carlos Siqueira, e os presidentes do PDT, Carlos Luppi; do PT, Gleisi Hoffmann; e do PCdoB, Luciana Santos, bem que tentaram a formação desse bloco parlamentar, que unificasse a esquerda, mas não houve acordo nas bancadas. Todas as legendas estão muito divididas. Na quarta-feira, 18 deputados do PSB, em reunião de bancada, manifestaram apoio à candidatura de Lira. O prefeito eleito do Recife, João Campos, cuja mãe é uma eminência parda na legenda, defende abertamente a candidatura de Lira, que o apoiou na eleição. Ontem, o líder Alessandro Molon (RJ) teve uma discussão séria com Carlos Siqueira. É categoricamente contra a aliança com Lira.
Fantasma
O líder do PDT, Wolney Queiroz (PE), cuja bancada tem 28 deputados e também está dividida, bem que tentou articular uma candidatura alternativa à do líder do MDB, Baleia Rossi (SP), que enfrenta muitas resistências no campo da esquerda, principalmente por causa de suas ligações com o ex-presidente Michel Temer, mas não teve sucesso. Por incrível que pareça, o fantasma da ex-presidente Dilma Rousseff, por causa do impeachment, ainda ronda os bastidores da eleição na Câmara. A principal reclamação, porém, é o que os parlamentares chamam de “falta de carinho”: Baleia é pouco acessível. “Quando a gente pede apoio para um projeto, dificilmente ele assina”, queixam-se.
Entre os aliados de Maia, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Marcos Pereira (Republicanos- SP) têm mais trânsito na esquerda, mas também são nomes que apresentam dificuldades. Aguinaldo é um dissidente do PP, não tem como dividir a bancada de Lira profundamente e está sendo assediado pelo Palácio do Planalto, que acena com a Secretaria de Governo, que ocuparia no lugar do general Luiz Ramos, para ser o novo articulador político do governo. Marcos Pereira, pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, que sempre teve bom diálogo com a esquerda na vice-presidência da Casa, já pulou fora do bloco de Maia e lançou sua candidatura avulsa, na esperança de atrair os votos da esquerda.
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