Poder

Eleições no Congresso: governo monta as armas para ajudar a eleger Arthur Lira

Cargos no Executivo e liberação de emendas parlamentares fazem parte do arsenal do Planalto para convencer partidos a eleger Arthur Lira como novo presidente da Câmara. Mas conversas com MDB também podem levar à aproximação com Baleia Rossi

Luiz Calcagno
postado em 10/01/2021 06:00
 (crédito: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)
(crédito: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

Jair Bolsonaro tem em mãos duas armas importantes, que devem impor dificuldades a adversários na disputa pela presidência da Câmara: a caneta e o cofre. O presidente da República pode dispor de ministérios, de cargos, de empresas estatais, de conselhos e de emendas parlamentares para convencer deputados a votarem no líder do Centrão, Arthur Lira (PP-AL) para o comando da casa legislativa, em detrimento do candidato de Rodrigo Maia (DEM-RJ), Baleia Rossi (MDB-SP). Apesar de ter armas e não ter receio de usá-las, o presidente, ainda assim, terá que manter a cautela. Em caso de vitória do adversário, seria ruim para Bolsonaro fazer de Rossi um inimigo, como aconteceu com Maia.

Inclusive porque o MDB poderá se tornar um aliado caso o presidente alcance 2022 com força política para tentar a reeleição. Tirando o primeiro escalão, os cargos a serem distribuídos por Bolsonaro não devem ir diretamente para os deputados, mas para indicados. Há um número grande de vagas de cargos comissionados de direção e assessoramento superior (DAS). São 837 de número 5, os mais importantes, e 1.799 de número quatro (veja quadro). Claro que a distribuição das vagas ocorrerá com restrições. Primeiro porque não é comum o governo trocar todo o seu quadro; segundo, porque Bolsonaro ainda terá que atender às alas evangélica, militar e olavista.

Além desses cargos, o site Panorama das Estatais, do próprio governo, aponta que existem 197 empresas estatais que podem servir de atrativo para indicados que ampliem os poderes, a visibilidade e a influência de parlamentares do Centrão, grupo onde Bolsonaro se formou politicamente e ao qual estará atado até o fim do mandato. Para completar, embora o Orçamento de 2021 tenha 93,7% da despesa primária como obrigatórias e pouco espaço para investimento, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), A Fundação Nacional de Saúde (Funasa), o Fundo Nacional de Desenvolvimento em Educação (FNDE) e o Banco do Nordeste seguem atrativos.

Movimentação

Fundador da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco destaca que a totalidade de 2.636 cargos comissionados são categorias de interesse para negociação. “Além dos cargos de dirigentes de estatais, que os políticos fazem indicações, tem os conselhos de administração, fiscal, muitos deles com remunerações muito maiores que muitos salários da administração pública. Isso em termos de cargo que se pode fazer uso. Costumamos falar sobre emendas parlamentares, que são oficiais. Mas tem as informais. O orçamento da união não é totalmente detalhado por estados e municípios, têm programas com recursos que podem ser alocados”, elenca o economista.

O estudioso lembra que, no último caso, é comum que a liberação de emenda informal seja divulgada na imprensa, o que pode gerar desgaste para o governo. Ainda assim, a medida é uma vantagem sobre o candidato adversário, que não terá essa mesma facilidade. “O governo vai jogar pesado. A presidência da Câmara é o que ele espera em termos de poder, na melhor das hipóteses, para aprovar reformas e projetos, e se precaver contra eventual pedido de impeachment. Ele vai ter todo interesse em ter, no comando da Casa, um aliado. Vamos ver até que ponto ele estará disposto e vai usar essas armas”, avalia Castello Branco.

Jogo de xadrez

Para Ricardo Ismael, doutor em Ciência Política, professor e pesquisador do Departamento de Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), a atuação de Bolsonaro levará em conta não só a ambição pelo controle da Câmara, mas a movimentação dos adversários. Isso porque será importante atrair o próximo presidente da Casa, mesmo que seja um parlamentar do grupo de Maia. Baleia tem avançado nos movimentos e demonstra estar algumas jogadas à frente de Lira, embora, até fevereiro, o panorama possa sofrer alterações. Ainda assim, em primeiro momento, a estratégia deve ser a de recuperar espaço. “O Palácio do Planalto, em circunstâncias normais, ele pode usar a máquina. Fazer distribuição de cargos, ou prometer a partidos que apoiaram Lira o benefício nas reformas ministeriais”, pontua.

“Por outro lado, o Planalto terá que ter cuidado para não ultrapassar um certo limite. Baleia Rossi pode ganhar. E Jair Bolsonaro tem feito acenos para o MDB, conversando com Temer. O próprio Baleia não tem votado contra o governo. Transformá-lo em inimigo, como fez com Maia, não é estratégico. A legenda pode ser parceira para uma eventual candidatura de Bolsonaro à reeleição. O presidente da República pode ter munição, mas dentro de um certo limite”, completa Ismael. Outra variável no cálculo é o fôlego do governo até 2022. O país enfrenta uma crise econômica com fortes chances de agravamento e o aumento no número de mortes na pandemia do novo coronavírus.

As turbulências devem trazer desgaste ao chefe do Executivo, que também saiu derrotado das eleições municipais e ainda mais dependente do Centrão, o vencedor do pleito e o escudo contra os processos de impeachment. “O Baleia Rossi é um fato novo. O MDB, em 2018, saiu bastante machucado, com redução da bancada. Mas, agora, aparece com chance de assumir a presidência da Câmara e há conversas, também, no Senado. O Lira seria melhor para o presidente. Haveria uma alinhamento grande. Mas, mesmo que ganhe o Baleia, haveria condições de Bolsonaro, com o Centrão influenciar a pauta. Em 2022, porém, o Centrão estará com quem for competitivo. Não vai com Bolsonaro, se ele chegar machucado, enfraquecido”, avalia o cientista político.

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O cofre e a caneta

Confira as ferramentas de convencimento que o governo federal poderá usar para trazer vantagem ao deputado Arthur Lira (PP-AL) na disputa pela presidência da Câmara:

No atacado
O governo tem em mãos...
837 cargos comissionados de direção e assessoramento superior (DAS) de número 5.
Valor do salário: R$ 13.623,39
E 1.799 cargos DAS de número 4
Valor do salário: R$ 10.373,30
O governo tem poder para disponibilizar o comando de 197 empresas estatais e conselhos econômicos

No varejo
Aos partidos que apoiarem Lira, o governo ainda pode…
Oferecer ministérios. Embora importantes para a ala ideológica, nomes como Ricardo Salles, do Meio Ambiente, e Ernesto Araújo, das Relações Internacionais,
E ampliar o espaço com uma reforma ministerial já prevista para agregar os membros do Centrão.
Outra saída é a liberação de emendas parlamentares oficiais ou informais.

Outros atrativos
O governo ainda tem uma série de órgãos que despertam a cobiça de parlamentares. Segue uma pequena lista…
Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT)
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs)
Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf)
A Fundação Nacional de Saúde (Funasa)
Fundo Nacional de Desenvolvimento em Educação (FNDE)
Banco do Nordeste

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