Reinfecção pela nova cepa

Ministério já sabe que uma recidiva da covid-19 é pela variante do novo coronavírus, identificada primeiro por pesquisadores japoneses, mas originária do Amazonas. Estudiosos tentam detectar se esta mutação é um dos vetores do caos na rede de saúde do estado

Um dia depois de ver o colapso da rede de saúde e a crise da falta de oxigênio atingir a cidade de Manaus, o Ministério da Saúde informou que foi notificado, na última quarta-feira, pelo governo do Amazonas, sobre a confirmação de uma reinfecção de covid-19 pela nova cepa variante do novo coronavírus, identificada primeiro por pesquisadores japoneses, mas originária do estado. Segundo a pasta, na última terça-feira, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) identificou uma variante do vírus em uma mulher de 29 anos com sintomas leves da covid-19, diagnosticada em dezembro do ano passado. Ela já havia sido infectada pela covid-19 em março de 2020. Pesquisadores, agora, tentam detectar se a mutação é um dos vetores do caos no sistema hospitalar no estado, sobretudo em Manaus.

De acordo com o ministério, a “análise realizada mostrou um padrão de mutações, compatível com a variante do vírus SARS-CoV-2, identificada recentemente pelo Ministério da Saúde do Japão”. A informação, segundo a pasta, foi compartilhada com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e com a Rede do Centro de Informações Estratégicas e Resposta em Vigilância em Saúde (Cievs).

Até o momento, segundo o ministério, foram notificados no Brasil dois casos de reinfecção por esta nova variante, sendo uma delas na Bahia com a mutação identificada originalmente na África do Sul. A pasta informou que foram confirmados, ainda, três casos de reinfecção com linhagens já circulantes no país, sendo um no Rio Grande do Norte, outro em São Paulo e um terceiro caso no Rio Grande do Sul.

Evolução
Na última quarta-feira, a Fiocruz publicou uma nota técnica sobre a nova variante, apontando que “os estudos sugerem que as cepas, detectadas em viajantes japoneses que tinham passado pela região amazônica, evoluíram de uma linhagem viral no Brasil, que circula na Amazônia”. Existe uma preocupação de que o aumento de casos no estado tenha relação com esta nova cepa. O virologista e pesquisador Felipe Naveca, do Instituto Leônidas & Maria Deane, da Fiocruz Amazônia, informou que ainda não é possível afirmar qual o papel desta variante na explosão de casos recentes.

“A gente precisa sequenciar muitas outras amostras para ver a frequência dela, atualmente, mas eu acredito que ela seja um dos fatores. Os outros são: a temporada de infecção por vírus respiratórios, que é mais aumentada a partir de novembro, e também porque as pessoas não cumpriram o distanciamento na época das festas de final de ano. Então, a gente esperava um aumento de casos”, afirmou.

Naveca explicou que a evolução dos vírus é algo esperado, mas alguns aspectos surpreendem os especialistas. “Essa variante descoberta no Japão chama a atenção, assim como a inglesa e a africana, porque elas acumulam muitas mutações em pouco tempo, acima do que a gente estava vendo até o momento. É um vírus que acumulou muitas mutações em pouco tempo”, explicou.

Deter a transmissão é uma tarefa que requer a volta das medidas mais rigorosas. Isso porque é natural que as mutações, que infectam as células com rapidez e eficiência, se proliferem com maior frequência. É o que explica o pesquisador José Alexandre Diniz Filho, professor do Departamento de Ecologia da Universidade Federal de Goiás (UFG).

“Pelo que estamos vendo na Inglaterra, aparentemente, essa linhagem vai ter um potencial de transmissão mais alto. De modo que, para controlar a expansão, as medidas têm que ser mais rigorosas. Veja que a Inglaterra está em lockdown, mesmo já tendo iniciado a vacinação”, exemplifica. Para a linhagem de Manaus, segundo Diniz, o raciocínio deve ser o mesmo. “O problema é que temos efeitos simultâneos do aumento do contato social a partir do final do ano. Então, será difícil distinguir os dois fatores. Mas não há dúvida de que estamos vendo um recrudescimento da pandemia no Brasil”, alerta.

Panelaços contra descaso com covid
E pelo menos 19 estados, das cinco regiões do país, houve panelaços contra o presidente Jair Bolsonaro por conta do enfrentamento do governo federal à pandemia de covid-19 –– cujo auge chegou com a crise de abastecimento de oxigênio em Manaus. Em Brasília, foram ouvidos protestos no Sudoeste, na Asa Sul e na Asa Norte. Ontem, o Brasil alcançou a marca de 208.246 mortos pelo novo coronavírus, sendo que 1.151 aconteceram nas últimas 24h. O número de casos, de acordo com o Ministério da Saúde, é de 8.393.492 infectados, com 69.198 registrados de quinta para sexta-feira.