Anvisa: enquanto os papéis dormem, as pessoas morrem
O Brasil acaba de superar, lamentavelmente, a marca de 231 mil mortes pela covid-19, apesar de todo o esforço nacional para enfrentar a pandemia. Já no dia 2 de junho de 2020, o presidente Jair Bolsonaro autorizou a nossa participação no Acelerador de Vacina (ACT Accelerator), projeto internacional contra o novo coronavírus. Em seguida, firmamos o acordo para obter 100 milhões de doses da vacina de Oxford. O Brasil investiu R$ 1,9 bilhão nessa iniciativa.
Outro passo fundamental foi dado pelo presidente da República em 24 de setembro, ao editar a Medida Provisória (MP) 1003/20, que autorizou a adesão do País ao Instrumento de Acesso Global de Vacinas Covid-19 (Covax Facility).
O investimento para colaborar nesse esforço internacional foi de R$ 2,5 bilhões. Mais R$ 20 bilhões foram reservados em 17 de dezembro, por meio da MP 1015/20, para a compra e distribuição de toda e qualquer vacina disponível.
Ao aprovar, em 18 de dezembro, a adesão à Covax Facility, a Câmara dos Deputados incluiu um dispositivo de grande relevância, confirmado agora pelo Senado: é o que obriga a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a conceder, em cinco dias a partir do pedido, autorização de uso das vacinas já referendadas pelas autoridades dos Estados Unidos, União Europeia, Japão, China, Canadá, Reino Unido, Russia, Coreia do Sul ou Argentina.
Não houve, na época, nenhuma contestação judicial da Anvisa à fixação do prazo sugerido pela Câmara. Afinal, era evidente a necessidade de proteger os brasileiros da pandemia.
Aliás, eventuais críticas ao limite de cinco dias seriam despropositadas, pois a Lei 14.006, de 28 de maio de 2020, já previa um tempo ainda mais curto, de 72 horas, para a Anvisa liberar a distribuição de qualquer insumo essencial ao combate à pandemia. Foi uma forma de flexibilizar barreiras burocráticas, atendidos os requisitos de segurança, para agilizar o socorro aos cidadãos. Portanto, a Resolução - RDC 444 da Anvisa, que fixou 10 dias para análise, é ilegal, pois a lei em vigor dá 3 dias. Pedir o veto aos cinco dias é, na prática, tentar reduzir o prazo para o da lei vigente.
De que adiantaria termos investido R$ 524 bilhões em todas as frentes de combate à pandemia em 2020, conforme dados do Tesouro Nacional, para esbarrarmos agora, no momento decisivo da vacinação, em obstáculos burocráticos? A quem interessa esse tipo de protelação? São mais de mil óbitos por dia.
As recentes críticas da cúpula da Anvisa às demandas por agilidade, bem como a ameaça de recurso judicial contra o prazo fixado pelo Parlamento para a liberação de vacinas, não me parecem, infelizmente, motivadas por uma preocupação com a eficácia de processos. Na hipótese mais branda, poderíamos identificar uma preferência por regras internas, como o prazo de 10 dias. Ora, as leis aprovadas pelo Congresso Nacional têm, claro, precedência sobre regulamentos; portanto, quem enquadra a Anvisa é a lei.
O grande número de emendas à MP nº 1026/2021, que trata da vacinação, mostra a determinação do Congresso em estabelecer, em lei, mais regras para serem seguidas pela Anvisa, o que será uma legítima expressão da vontade do povo. Um enquadramento.
Prefiro não imaginar que o comando da Anvisa esteja preocupado com algum outro aspecto estranho ao seu escopo de atuação. Seria, talvez, um apego excessivo ao status de agência de excelência, o que é muito bom, mas não numa pandemia sem precedentes.
É revelador notar que, na gestão anterior da Anvisa, foi baixada a Resolução nº 203, de 26 de dezembro de 2017. Ela reduziu, de 10 dias para até 48 horas, o prazo de análise de importação, em caráter excepcional, de medicamentos durante emergências nacionais ou internacionais de saúde pública. Sim, 48 horas! Esse prazo garantia antes a análise de segurança e eficácia de medicamentos e foi aprovado pela própria Anvisa. O que explicaria, agora, tamanho incômodo com o limite de cinco dias concedido pelo Congresso? Teria a Anvisa ficado mais lenta?
O fato é que o Brasil só tem acesso, hoje, a duas das 11 vacinas aprovadas em agências reguladoras e em uso no mundo: EpiVacCorona; BioNTech/Pfizer; Moderna; CanSino; Sputnik V; Oxford/AstraZeneca; Covishield; Covaxin; Sinopharm; Sinopharm - Inativado; e CoronaVac.
Depois de a Anvisa se antecipar ao meu Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 8/21, que retira a exigência da terceira fase de testes, proposta agora apoiada por cientistas, já tivemos vários novos pedidos de registro de vacinas, provando que a burocracia era excessiva e o Congresso tinha razão.
O vírus não está disposto a acompanhar o ritmo da burocracia, e só a ampla imunização da população brasileira será suficiente para vencermos esta guerra. A História mostrará quem esteve do lado certo.
Deputado federal (PP-PR), é líder do Governo na Câmara dos Deputados
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