POLÍTICA

Resquício da ditadura, Lei de Segurança Nacional é questionada no Supremo

PSDB recorre ao STF para que a Lei de Segurança Nacional, usada pelo governo contra opositores, perca a eficácia. Agora, já são três ações nesse sentido. Ministro da Justiça também é alvo de queixa-crime por suposta intimidação a críticos de Bolsonaro

Augusto Fernandes
postado em 23/03/2021 06:00
 (crédito: PSDB/Divulgação)
(crédito: PSDB/Divulgação)

O Supremo Tribunal Federal (STF) tem recebido pedidos formulados por partidos e parlamentares para que a Lei de Segurança Nacional (LSN) — editada na ditadura militar — perca a eficácia. As solicitações estão sendo motivadas pelos recentes episódios de inquéritos instaurados a pedido do governo federal contra opositores do presidente Jair Bolsonaro que criticaram a atuação do mandatário no enfrentamento à pandemia da covid-19.

A mais recente ação foi protocolada, ontem, pelo PSDB. O partido quer a suspensão da LSN por entender que o uso da norma por parte do Executivo tem atentado contra a liberdade de expressão, o Estado democrático de direito, o princípio da legalidade, o direito de reunião e a liberdade de associação.

Um dos pedidos da sigla é para que o STF conceda, imediatamente, uma medida cautelar para sustar a eficácia da lei ou determine que o Congresso, em caráter liminar, edite uma Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito para substituir a LSN.

O PSDB ponderou que a LSN “é completamente incompatível com a ordem constitucional inaugurada pela Constituição Federal de 1988”. Na avaliação da legenda, a lei “tem sido usada não para proteger os Poderes constituídos da República, mas para proteger as pessoas que, temporariamente, ocupam cargos de alto escalão na República e blindá-las de críticas”.

O partido também alertou que “o Brasil jamais poderá se dizer genuinamente democrático enquanto continuar a perpetuar legislação cuja essência é restringir direitos constitucionais pétreos”. “Não se pode permitir que sejam instaurados inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional com a frequência que têm sido utilizados, como forma de contenção de críticas”, enfatizou a sigla. “A polarização política é da democracia, porém a criminalização da crítica legítima contra autoridades constituídas vai na contramão de medidas de necessária e imprescindível estabilização institucional.”

A legenda ainda solicita ao STF que Bolsonaro seja intimado para prestar informações a respeito do uso da LSN, bem como o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, José Levi Mello.

Agora, já são três ações contra a LSN no STF. PTB e PSB também recorreram à Corte. O ministro Gilmar Mendes será o relator.

Notícia-crime

Outro pedido entregue à Corte contra a LSN foi formulado pelo deputado José Guimarães (PT-CE), líder da minoria na Câmara. O parlamentar apresentou uma notícia-crime em desfavor do ministro da Justiça, André Mendonça, responsável por usar a LSN para solicitar investigações contra opositores de Bolsonaro. Guimarães sustentou que o ministro pode ter atentado contra a liberdade de expressão, pois “vem se utilizando do seu cargo para intimidar críticas da gestão do governo de Jair Bolsonaro à frente da pandemia”.

Além disso, o petista alegou que Mendonça pode ter cometido crime de responsabilidade ao direcionar o trabalho da Polícia Federal para conduzir os inquéritos. Guimarães solicitou ao STF o afastamento de Mendonça, caso sejam confirmadas as denúncias.

Outra notícia-crime contra o ministro foi apresentada pela deputada Natália Bonavides (PT-RN). Ela também acredita que ele pode ter cometido crimes de responsabilidade ao intimidar opositores do governo e vetar o direito à crítica. A parlamentar pede inquérito contra o titular da Justiça e que ele seja afastado do cargo para não obstruir as investigações.

Há, ainda, uma ação protocolada na Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos deputados do PT Gleisi Hoffmann (PR), Rui Falcão (SP) e Paulo Teixeira (SP) também devido à LSN. Eles pedem investigação de eventual abuso de autoridade cometido por Mendonça. “Parece insano que, no meio de uma pandemia que nos assola, a máquina pública tenha sido acionada para situações dessa natureza, apelando-se ao entulho autoritário da Lei de Segurança Nacional com a finalidade de censurar a crítica política”, diz o documento dos petistas. “Essas iniciativas parecem estar se avolumando, tendo o Ministério da Justiça, salvo melhor entendimento, se transformado em um órgão de censura, para cortar a fala de quem se dispõe a apresentar publicamente uma crítica ao chefe do ministro.” O Ministério da Justiça foi procurado para comentar o assunto, mas não respondeu até o fechamento desta edição.

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Bolsonaro diz que não mudará

Com mais de 295 mil mortes no Brasil por causa do novo coronavírus e o colapso em hospitais, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, ontem, que ainda não foi convencido a mudar a postura diante do avanço pandemia no país.

“Devo mudar meu discurso? Me tornar mais maleável? Devo ceder, fazer igual ao que a grande maioria está fazendo? Se me convencerem do contrário, eu faço. Mas não me convenceram ainda. Devemos lutar contra o vírus, e não contra o presidente”, frisou.

Ele retomou as críticas contra o fechamento de comércios. “Querem, alguns setores importantes da sociedade, que eu decrete um lockdown nacional ou um lockdown regional, porque eu devo seguir a ciência. Então, vou seguir a ciência. Declarou aqui David Nabarro, emissário da OMS (Organização Mundial da Saúde): ‘E, portanto, apelamos a todos os líderes mundiais: parem de usar o lockdown como seu método de controle primário”, citou. Ele completou: “Diz, então, a OMS, que a única consequência do lockdown é transformar as pessoas pobres em mais pobres. E alguns querem que eu decrete o lockdown? Me chamam de negacionista ou de ter discurso agressivo. Respeitem a ciência. Não deu certo”.

Na verdade, Nabarro defendeu que o retorno ocorresse em países onde a situação dos hospitais estivesse sob controle e em queda de casos da doença, o que não é a situação do Brasil. “Parece que só no Brasil está morrendo gente. Lamento o número de mortes. Não sabemos onde isso vai acabar, se vai acabar um dia. Vamos ficar fechados até quando?”, emendou Bolsonaro.

 

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