"TRATAMENTO PRECOCE"

Em viagem a Santa Catarina, Bolsonaro volta a defender "tratamento precoce" sem eficácia

Não há comprovação científica de eficácia dos remédios defendidos pelo presidente. Chapecó, cidade catarinense elogiada pelo presidente por conta do incentivo do prefeito ao kit cloroquina, aderiu ao lockdown por 14 dias, além de adotar medidas de distanciamento social, uso de máscara e álcool em gel

Ingrid Soares
postado em 07/04/2021 13:04 / atualizado em 07/04/2021 13:05
 (crédito: Evaristo Sá/AFP)
(crédito: Evaristo Sá/AFP)

O presidente Jair Bolsonaro desembarcou nesta quarta-feira (7/4) em Chapecó, Santa Catarina. Ao lado do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, o mandatário visitou o Centro de Eventos onde foi desativada uma unidade semi-intensiva para pacientes com covid-19. Durante discurso, Bolsonaro voltou a defender o que chama de “tratamento precoce” e criticou medidas de isolamento.

“O tratamento off label, fora da bula, é um direito, é um dever do médico. Ele tem que buscar uma alternativa. Ou até mesmo, se um paciente tem uma certa doença e não tem aquele remédio específico, comprovado cientificamente, ele tem que buscar uma alternativa”, alegou.

O chefe do Executivo comparou as mais de 337 mil mortes pela doença no país a baixas em meio a uma guerra, e usou uma passagem bíblica para dizer que a população precisa enfrentar o vírus. “Quantas vezes tivemos que decidir? E nós sabemos que pior que uma decisão mal tomada é uma indecisão. Ou vamos para lá ou vamos para cá. Se ficar parado, o pior pode acontecer. E tem uma passagem bíblica de Provérbios 24.10: “Se te mostrares frouxo no dia da angústia, a tua força será pequena”. Nós temos que unir força para vencer esse inimigo. Não podemos ficar em casa ad eternum esperando que a solução caia do céu. Lamentamos as mortes, é como num campo de batalha. Mas se nada fizermos, seremos derrotados”, apontou.

Bolsonaro ainda criticou a gestão do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e insinuou que as medidas defendidas por ele no começo da pandemia visavam a compra de respiradores superfaturados. Apesar de reconhecer que não possui certificado médico, o chefe do Executivo continuou a aconselhar o uso de remédios como cloroquina, ivermectina e nitazoxanida.

"No protocolo dizia que poderia ministrar tal medicamento somente em casos graves. Eu falei para ele: 'Não sou médico, mas se em estado grave segundo o seu protocolo pode dar certo, porque não começa no início?' Houve um problema entre nós. Eu não sei como salvar vidas, eu não sou médico, não sou enfermeiro, mas não posso tolher a liberdade do médico ou até mesmo do enfermeiro. Ele tem que buscar uma alternativa para isso. Será que o sentir falta de ar era para comprar respiradores a qualquer preço naquela época?", disparou.

Ao longo da declaração, o presidente afirmou que nunca foi favorável ao lockdown e destacou que a população não deve abrir mão da liberdade em troca de segurança, correndo o risco de ficar sem os dois futuramente.

"Apareceram as medidas restritivas, a gente nunca foi favorável a elas, a não ser numa emergência, naquele momento para melhor preparar as unidades de saúde. Lamentavelmente, isso continua valendo. Quem abre mão de um milímetro da sua liberdade em troca de segurança está condenado, no futuro, não ter segurança e não ter liberdade".

Kit cloroquina

Em alusão ao kit cloroquina, Bolsonaro disse que ao ser diagnosticado com o vírus no ano passado "tomou um medicamento que todo mundo sabe qual é e no dia seguinte estava bom". Na época, o presidente passou 15 dias em quarentena no Palácio da Alvorada.

"Lamentamos todas as mortes. Eu fui acometido com covid. Procurei não me apavorar, tomei uma medicamento. Todo mundo sabe qual foi, e no dia seguinte estava bom. Muitos fizeram isso. Agora, não podemos admitir impor limites a médicos. Se o médico não quer receitar aquele medicamento, que não receite. Se um cidadão acha que está errado, que não tem comprovação científica, que não o use. É liberdade dele. O off label é (entre) o médico e o paciente", justificou.

O mandatário completou que os médicos não devem ser tolhidos da liberdade de receitar medicamentos off label. "Hoje tem aparecido medicamentos ainda não comprovados que estão sendo testados. E o médico tem essa liberdade, tem que ter. É um crime querer tolher a liberdade de um profissional de saúde. Desde o começo, dizemos que temos dois problemas pela frente: o vírus e o desemprego. E as medidas ora anunciadas depois que o STF decidiu que cada estado, cada município pode tomar a medida restritiva que bem entender, essa medidas não podem ter efeito mais danosos que o próprio vírus".

Bolsonaro disse ainda ser "o único líder mundial que apanha individualmente", mas rebateu que o inimigo é o vírus e não o presidente. "O mais fácil é ficar do lado da massa, da grande maioria. Se evita problemas, não é acusado de genocida, não sofre ataques por parte de gente que pensa diferente de mim. O nosso inimigo é o vírus, não é o presidente, a governadora ou o prefeito", mencionou.

Ele ainda citou o remédio proxalutamida, indicado no tratamento de câncer de próstata e de mama. O fármaco também não possui comprovação de eficácia contra a covid-19.

"Não é tolhendo, censurando seja lá o que for, que nós vamos achar uma solução para esse grave problema que nós temos. Eu prometo não falar em proxalutamida porque vai ser criminalizada", ironizou.

Chapecó exemplo

O presidente também se reuniu com o prefeito de Chapecó, João Rodrigues (PSD), o qual havia elogiado no começo da semana por incentivar o uso do inexistente "tratamento precoce". Ele tomou posse em janeiro, e, segundo o mandatário, faz "um trabalho excepcional" em meio à pandemia e é um "exemplo a ser seguido" por conta da liberdade que tem dado aos médicos no tratamento off label.

"Quero que Chapecó seja uma cidade para ser olhada pelos demais 5.700 prefeitos do Brasil. Se bem que tem prefeito que está na linha de Rodrigues. Temos que estudar Chapecó. Temos que ver as medidas tomadas pelo prefeito nessa época toda".

Não há comprovação científica de eficácia dos remédios defendidos pelo presidente. A cidade catarinense aderiu ao lockdown por 14 dias, além de medidas de distanciamento social, uso de máscara e álcool em gel.

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