Enquanto a equipe econômica segue convicta de que o presidente Jair Bolsonaro precisa vetar ao menos parte do Orçamento para 2021 aprovado pelo Congresso, há duas semanas, cresce a insatisfação no Legislativo com o governo. Ontem, o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), atribuiu ao Executivo a responsabilidade pelo impasse ao Executivo e insinuou que o ministro da Economia, Paulo Guedes, fez promessas que não poderia cumprir — depois de negociar um acordo com deputados e senadores para que o texto fosse aprovado.
“A sanção é um ato que corrobora a aprovação do Congresso. Precisamos do Orçamento sancionado ou vetado. Isso foi feito entre Economia e Congresso. Quem excedeu no seu acordo vai ter que voltar atrás”, completou o parlamentar”, ameaçou Lira, que participou das tratativas com Guedes antes da aprovação do texto-base, há aproximadamente duas semanas. O presidente da Câmara tem feito pressão para que o presidente Jair Bolsonaro sancione a matéria sem os cortes exigidos pelo ministério.
O aviso de Lira pode ser a antessala de algum tipo de retaliação ao Executivo, caso a peça orçamentária não atenda ao pleito de deputados e senadores — incomodados com a mudança de comportamento da equipe econômica, pois garantem que o time de Guedes estava ciente das mudanças propostas no Orçamento que resultaram no cancelamento de despesas obrigatórias de caráter continuado para financiar o aumento de emendas parlamentares. Agora, no entanto, o ministro diz que essa manobra pode prejudicar Bolsonaro no futuro e ser a ponta de lança de um eventual processo de impeachment por crime de responsabilidade fiscal.
Sem problemas
“Todo acordo deve ser honrado na sua plenitude, de parte a parte. É de se exigir a responsabilidade de cada ente, para que resolva logo a posição que tem e que se tenha a sanção do orçamento. Continuamos sem orçamento e sem poder atender determinados programas”, cobrou Lira. Ao comentar a declaração de Guedes, no início da semana, de que “o que é politicamente mais conveniente pode ser juridicamente inconveniente, e vice-versa”, o presidente da Câmara negou inconsistências no Orçamento. Ele garantiu que “tecnicamente não tem nenhum problema para o presidente e nem para os órgãos que dele precisam para fazer a política pública se desenvolver no ano de 2021”.
O Tribunal de Contas da União (TCU) acompanha a polêmica, pois duas ações contestam a peça orçamentária. Uma é relatada pelo ministro Bruno Dantas, e foi apresentada à Corte por 21 deputados. Nesta semana, um relatório sobre a representação dos parlamentares alertou que, por mais que o Congresso seja “o local adequado para as escolhas alocativas em sede orçamentária”, essas escolhas “devem respeitar as limitações estabelecidas pela própria Constituição da República, assim como devem guardar afinidade lógica com a proposta original”.
Já o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público junto ao TCU, encaminhou um pedido à ministra-presidente da Corte, Ana Arraes, para que sejam apuradas responsabilidades da área técnica do Ministério da Economia que, eventualmente, contribuíram para a aprovação de um projeto de lei orçamentária com irregularidades. Furtado ainda solicitou que o TCU faça um alerta preventivo à Câmara e à Procuradoria-Geral da República (PGR) quanto a possíveis crimes de responsabilidade fiscal e comuns que podem ser cometidos por Bolsonaro caso sancione o Orçamento como está.
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Não dá para chorar o leite derramado, diz Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro voltou a desdenhar, ontem, das mortes provocadas pela covid-19, um dia depois de o Brasil ter alcançado a marca de 4.195 óbitos pela infecção do novo coronavírus — o país registrou, somente nas últimas 24 horas, 3.829 mortes e totalizou 340.776 óbitos causados pela covid-19. Ele disse que não adianta “chorar o leite derramado”, durante a cerimônia de posse do novo diretor-geral Brasileiro da Itaipu Binacional, João Francisco Ferreira.
“Não vamos chorar o leite derramado. Estamos passando ainda por uma pandemia que, em parte, é usada politicamente. Não para derrotar o vírus, mas para tentar derrubar o presidente. Todos nós somos responsáveis pelo que acontece no Brasil. Em qual país do mundo não morre gente? Infelizmente, morre gente em tudo que é lugar. Queremos é minimizar esse problema”, justificou-se.
Horas antes, em Chapecó (SC), Bolsonaro voltou a se manifestar contra a possibilidade de um lockdown nacional por conta dos altos números da pandemia. Segundo o presidente, a população não deve abrir mão da liberdade em troca de segurança, correndo o risco de ficar sem os dois futuramente.
“Seria muito mais fácil atender e fazer, como alguns querem, da minha parte, porque eu posso, um lockdown nacional. Não vai ter lockdown nacional, como alguns ousam dizer por aí que as Forças Armadas deveriam ajudar seus governadores nas suas medidas restritivas. O nosso Exército brasileiro não vai às ruas para manter o povo dentro de casa, a liberdade não tem preço”, disse, em Chapecó.
De acordo com Bolsonaro, por causa da defesa feita pelo prefeito do João Rodrigues do chamado “tratamento precoce” — que inclui medicamento sem efeito comprovado contra a covid-19, como a cloroquina e ivermectina —, ele acredita que a cidade catarinense é modelo para o país. Entretanto, Chapecó aderiu ao lockdown por 14 dias e às medidas de distanciamento social e adotou o uso de máscara e do álcool em gel.
“O tratamento off label, fora da bula, é um direito, é um dever do médico. Ele tem que buscar uma alternativa. Ou até mesmo, se um paciente tem uma certa doença e não tem aquele remédio específico, comprovado cientificamente, ele tem que buscar uma alternativa”, explicou, acrescentando que não tem nenhum interesse nas próximas eleições gerais, em 2022. “Estou me lixando para 2022”.
À noite, Bolsonaro particpou de um jantar com empresários, em São Paulo. O encontro, na casa de Washington Cinel, fundador da Gocil, uma das maiores empresas de segurança do Brasil, versou sobre vacinação, reformas e compromisso com o teto de gastos.
“Aqui só tem patriotas contribuintes, que têm interesse que o Brasil continue crescendo. O recado foi muito claro: eles estão muito satisfeitos com esse novo Congresso, com os presidentes Arthur (Lira) e Rodrigo Pacheco trabalhando em sintonia total com o presidente. Eles apoiam tanto o presidente quanto os nossos ministros, que têm feito um trabalho importante. Então o recado foi esse. No que depender deles, o governo vai poder contar com ajuda”, dsisse o ministro das Comunicações, Fabio Faria, negando que tivesse havido cobrança dos empresários para acelerar a vacinação.
Além de Faria, estiveram presentes o ministro da Economia, Paulo Guedes; da Saúde, Marcelo Queiroga; da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, além de empresários como André Esteves (BTG), Candido Pinheiro (Hapvida), Luiz Carlos Trabuco (Bradesco) e Flávio Rocha (Guararapes), entre outros.