Jornal Correio Braziliense

Nunes Marques sob pressão

Está nas mãos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques — o mais novo integrante da Corte, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro — um pedido do senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) para que o Senado dê andamento ao pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes, também magistrado do STF e grande desafeto do chefe do Planalto. Especialistas acreditam ser improvável que Nunes Marques acate a solicitação do parlamentar, visto que isso abriria um precedente perigoso, pois não é o único pedido de impedimento de Moraes. Além disso, ele iria se indispor de forma definitiva com seus colegas de tribunal.

Nunes Marques tem algumas opções. Uma delas é indeferir o pedido e devolver a responsabilidade para o Senado, sob o argumento de que o assunto deve ser resolvido na Casa. Isso porque, no caso de impeachment contra ministros do Supremo, o caso tramita todo no Senado, diferentemente de uma solicitação semelhante tendo como alvo um presidente na República, cuja admissibilidade do impedimento passa antes pela Câmara. Outra possibilidade é atender ao pedido de Kajuru e mandar o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), dar andamento ao processo. Uma terceira alternativa seria indeferir o pedido, destacando não haver fundamento para o impeachment do colega, e enterrar de vez a denúncia.

Professor titular de direito constitucional da Faculdade de Direito na Universidade de São Paulo (USP), Elival da Silva Ramos acredita mais na terceira possibilidade. “Fazendo isso, ele mata o pedido no Supremo e no Senado”, explicou, afirmando que deve haver uma pressão grande para que Nunes Marques encerre o assunto. Ramos argumentou que hoje o pedido de impeachment é contra Moraes, mas, amanhã, pode ser contra Nunes Marques e isso pesa na decisão. “Ele deve ouvir os colegas, o sentimento geral. Se mandar dar andamento, abre uma situação complicada, porque outros processos de impeachment podem ser abertos contra ministros”, disse.

Kajuru solicitou a abertura de processo de impeachment contra Moraes denunciando-o por crimes de responsabilidade. O parlamentar justificou que o magistrado cometeu agressões às garantias da liberdade de expressão e de imprensa e violou a imunidade parlamentar do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), preso no âmbito do inquérito que apura informações falsas e ofensas contra ministros do STF. A prisão do político carioca foi, entretanto, confirmada por unanimidade pelos integrantes da Corte, e isso também conta na decisão de Marques.

De acordo com Vera Chemim, especialista em direito constitucional, um magistrado “precisaria ser muito forte para se indispor com os outros ministros”. “A situação ficaria insustentável”, enfatizou. Na opinião dela, Marques deve devolver o caso ao Legislativo, alegando que é uma questão interna do Senado. Segundo a especialista, Marques também pode alegar não haver elementos robustos para autorizar a abertura de um processo de impeachment, permitindo que Pacheco use o entendimento para arquivar o pedido.

Recentemente, Marques deu ordens que atenderam aos interesses de Bolsonaro, como a decisão monocrática que liberou celebrações religiosas presenciais em meio ao recrudescimento da pandemia, ignorando decretos de medidas restritivas de estados e municípios — no plenário, porém, a determinação dele acabou derrubada.

“Pela lógica, ele deveria ir a favor do Bolsonaro (que já pediu processos de impeachment contra ministros do STF). Mas teria de ser muito poderoso para manter essa posição e saber que, a partir daquele momento, não teria mais ambiente no STF”, frisou.

Pressão

Kajuru apresentou denúncia contra Moraes, no Senado, em fevereiro, e pediu, agora, uma posição do STF, depois que o ministro Luís Roberto Barroso determinou a abertura de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) na Casa para investigar possíveis omissões do governo na pandemia. O parlamentar argumentou que, se o magistrado concedeu a liminar para instalação do colegiado, também deveria fazer o mesmo em relação ao pedido de impeachment de Moraes.

As duas questões, entretanto, não se misturam, como explicou o professor Elival Ramos. No caso da CPI, o presidente do Senado é obrigado a instalar, desde que preencha os requisitos constitucionais, como prazo certo e o número específico de assinaturas (27). Já no caso de um pedido de impeachment contra um ministro do STF, cabe ao presidente do Senado analisar se existem requisitos ou não para dar seguimento ao processo na Casa. Da mesma forma que essa atribuição cabe ao presidente da Câmara quando se trata de um pedido de impeachment contra o presidente da República.

Professor de direito constitucional da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo, Oscar Vilhena Vieira afirmou que, na prática, o Brasil não sabe como se dá um processo de impeachment contra um ministro do Supremo, pois isso nunca aconteceu.

Gargalhada

Na segunda-feira, o presidente Jair Bolsonaro soltou uma gargalhada ao ouvir de um apoiador que Nunes Marques tinha sido sorteado relator do pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes. “Caiu para o Kassio Nunes?”, respondeu o chefe do Planalto, antes de rir alto.