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Decisão do Supremo dá aval para Lula disputar eleição em 2022

STF anula condenações do ex-presidente Lula e o deixa livre para concorrer às eleições de 2022. Defesa do petista classifica decisão como "histórica". Corte ainda definirá o destino dos processos, que voltam à estaca zero, e a suspeição de Sergio Moro

Por 8 votos a 3, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) anulou as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva impostas pela 13ª Vara Federal de Curitiba na Operação Lava-Jato, deixando o petista livre para concorrer nas próximas eleições. No julgamento de ontem, os magistrados seguiram a decisão do ministro Edson Fachin, que, no mês passado, declarou a incompetência da Justiça Federal da capital paranaense para avaliar os processos. As ações contra Lula voltam, portanto, à estaca zero.

No voto, Fachin destacou que as condutas descritas nos processos relacionados a Lula não fazem referência restrita à Petrobras, objeto principal das diligências da Lava-Jato em Curitiba. “Nada obstante, ainda que as vantagens indevidas tenham origem na denominada ‘conta-corrente geral de propinas’ mantida entre o Grupo OAS e o Partido dos Trabalhadores, como afirma a Procuradoria-Geral da República nas razões recursais, a própria denúncia indica que tais recursos não eram originados exclusivamente de contratações celebradas com a Petrobras”, sustentou o ministro.

Nunes Marques, por sua vez, abriu divergência e entendeu que os processos devem ser mantidos na Justiça Federal de Curitiba. “Verifica-se que os fatos versados nas ações penais descritas estão, de fato, associados diretamente ao esquema criminoso de corrupção e lavagem de dinheiro investigado no contexto da Operação Lava-Jato, cuja lesividade veio em detrimento exclusivamente da Petrobras. E assim sendo, a competência, a meu sentir, é da 13ª Vara Federal”, afirmou.

Votaram para suspender as condenações, além de Fachin, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso e Ricardo Lewandowski. Foram conta Nunes Marques, Marco Aurélio Mello e Luiz Fux. Moraes, no entanto, defendeu que os processos sejam enviados a São Paulo, e não ao Distrito Federal, como determinou Fachin. Essa definição ficou para a próxima sessão do julgamento, marcada para a quinta-feira.

A Corte também precisa decidir se perde o objeto, ou seja, a validade, a decisão da Segunda Turma de que Sergio Moro, então juiz da 13ª Vara, atuou parcialmente nos processos e agiu para condenar Lula no caso relacionado ao triplex do Guarujá.

A defesa de Lula afirmou que o resultado do julgamento é “uma decisão histórica, que reforça o Estado de direito”.

O resultado repercutiu rapidamente nos Três Poderes. A presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, comemorou. “STF confirma direitos de Lula! Dia histórico. Demorou, mas chegou! Ainda tem muita coisa a ser colocada no lugar, mas a incompetência de Moro era o passo fundamental para isso, o primeiro pedido da defesa”, escreveu nas redes sociais.

O senador Lasier Martins (Podemos-RS) criticou a decisão. “O julgamento que anula a condenação de Lula, sete anos depois de iniciado o processo, faz acreditar na recompensa pelo aparelhamento do tribunal”, disparou. “O STF afronta a democracia. Lula não é inocente.”

Pendências

O advogado Daniel Bialski, membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), afirmou que a Corte ainda precisa definir a amplitude da decisão. “O Supremo Tribunal Federal vai examinar a questão da suspeição e também deve decidir, no seu pleno, dois temas principais: o primeiro deles, qual é a abrangência dessas decisões, quais estarão contaminadas pela nulidade decretada pela incompetência. E, num segundo momento, qual é o juiz competente que julgará esse processo, seja em São Paulo, seja em Brasília. Eu acredito que a Justiça tem recursos para dar um andamento célere ao processo, até pela praticidade virtual, hoje”, disse.

Cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo, Marco Antônio Carvalho Teixeira ressaltou que, com a ficha limpa, Lula é um candidato natural para o Planalto em 2022 e não deve abdicar da posição. “Com isso, Bolsonaro ganha um opositor muito forte; alguém que, de alguma forma, ressurge num contexto em que ninguém acreditava mais. Há um clima favorável à candidatura dele e o restabelecimento de um embate de 2018, que só não vai acontecer se Bolsonaro se enfraquecer demais”, avaliou. (Colaborou Sarah Teófilo)

Barroso vota do hospital

O ministro Luís Roberto Barroso votou no julgamento de ontem do STF usando um aparelho celular, enquanto estava num hospital. Ele acompanhava a esposa, que teve um problema de saúde. “As coisas estão sob controle, graças a Deus. Verifiquei que o julgamento avançou. Eu tinha intenção de fazer um voto um pouco mais elaborado, mas as circunstâncias não favoreceram, e achei que seria disruptivo eu não entrar, ainda que para um voto breve”, explicou, na sessão.

Bolsonaro vê Lula na disputa

O presidente Jair Bolsonaro usou a tradicional live de quinta-feira para comentar a anulação das condenações do ex-presidente Lula. “Vamos ter umas eleições pela frente. O Lula vai ser candidato, vai estar lá. Quem iria com ele para o segundo turno? É só fazer um raciocínio que vocês vão entender qual o futuro de cada um de vocês”, afirmou. “Eu já tenho 66 anos. Até lá, estou com 68, eu já estou no lucro. Estou mais para lá do que para cá, mas vejam qual futuro reserva pra vocês no Brasil, com o que está acontecendo e com essa decisão de hoje (ontem) do STF, tornando ele elegível.”

Bolsonaro comparou o resultado do julgamento a um filme de faroeste. “O que eu vi acontecer, agora há pouco, no Brasil, me lembrou do tempo de garoto, quando assistia no cinema do seu Lelê, em Eldorado Paulista (SP), a filme de cowboy. O cara assaltava algo na Califórnia e começava a cavalgada, uma desembalada, correr em direção ao México”, relatou. “Uma vez transpondo a fronteira com o México, estava tudo resolvido e não podia mais ser preso. Alguns torciam para o bandido, outros torciam para a patrulha, mas, aqui no Brasil, parece que a mesma coisa acontece hoje em dia.”

O chefe do Planalto ainda ressaltou que, caso Lula seja eleito, poderá escolher mais dois ministros da Suprema Corte. “Não estamos começando aqui uma campanha para 2022. Mas, pela decisão do STF, o Lula é candidato. Faça uma comparação dos ministros do Lula com os nossos ministros. E, se Lula voltar, pelo voto direto, pelo voto auditável, tudo bem”, destacou. “Agora, veja qual vai ser o futuro do Brasil, o tipo de gente que ele vai trazer para dentro da presidência. Em março de 2023, três meses depois que ele, porventura, assumir a presidência, vai escolher mais dois ministros para o Supremo Tribunal Federal. Mais dois, tá ok, pessoal? Acho que a conclusão cabe a vocês.”