INVESTIGAÇÃO

Confira os principais pontos do depoimento de Queiroga à CPI da Covid

Ministro da Saúde adota postura evasiva no depoimento ao colegiado e recebe críticas. O titular da pasta evita expor opinião sobre uso da cloroquina em pacientes com covid-19. A medida é defendida por Bolsonaro, apesar de o medicamento não ter eficácia contra a doença

Bruna Lima
Maria Eduarda Cardim
Israel Medeiros
postado em 07/05/2021 06:00
 (crédito: Reprodução/TV Senado)
(crédito: Reprodução/TV Senado)

o se esquivar de responder todas as perguntas dos senadores que pudessem comprometer a relação com o presidente Jair Bolsonaro, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, terminou a sabatina na CPI da Covid, ontem, fortalecendo o papel de aliado do governo em detrimento da carreira médica. Mesmo se posicionando a favor da ciência, em nenhum momento ele disse que o uso de cloroquina para tratar pessoas com a doença não possui eficácia comprovada, justificando que “não faz juízo de valor” às falas do mandatário, garoto-propaganda do medicamento.

A recusa em responder diretamente às perguntas irritou integrantes da CPI. Um deles foi o presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM). “Você está aqui como testemunha, estou aqui para lhe preservar. Não é achismo. É sim ou não”, frisou o senador. “Acho que o senhor não entendeu sua posição aqui. O senhor está aqui como ministro e médico. Senão, vamos encerrar a sessão agora.”

Para o vice-presidente da comissão, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), apesar da falta de objetividade de Queiroga ao responder questões, o posicionamento do ministro sobre tratamento precoce e o comportamento de Bolsonaro é claro. “O depoimento contribui. Ele tem feito um esforço (para proteger o governo), mas é difícil fazer esforço diante de fatos. O fato é muito mais forte”, enfatizou.

Rodrigues acredita que a grande contribuição de Queiroga foi a confirmação de que continua a existir uma espécie de “comando paralelo” no governo, levando em consideração o que os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich revelaram em seus depoimentos. “Qual foi a grande contribuição que o ministro Teich deixou para esta CPI? Foi dizer por que ele saiu e confirmar a tese de Mandetta sobre a existência de um comando paralelo, que, ao que me parece, continua existindo”, afirmou ao Correio.

O senador governista Eduardo Girão (Podemos-CE) avaliou o depoimento como importante, “embora acredito que o relator está sendo, de forma evidente, tendencioso, induzindo as respostas e, de certa forma, intimidando as testemunhas”, criticou à reportagem. Para ele, Renan Calheiros (MDB-AL) age com parcialidade e “já tem uma posição firmada, já diz quem é culpado ou inocente”. “Iss

o tira a credibilidade da CPI”, enfatizou. Calheiros sustentou que não há fulanização na CPI.
Para não responder diretamente às perguntas sobre a cloroquina, Queiroga usou da justificativa de que o tema ainda será deliberado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (SUS), que elabora um protocolo clínico, e que a figura do ministro da Saúde pode ser a última instância a deliberar sobre a formulação. Por falta de tempo hábil, a oitiva do diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, prevista para ontem, foi remarcada para terça-feira.

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Ponto a ponto — Marcelo Queiroga

 (crédito: Jefferson Rudy/AFP)
crédito: Jefferson Rudy/AFP

Aglomerações

“Nós temos, nesta segunda onda, a implicação de uma variante do vírus, essa P1, e têm sido alardeadas pelas autoridades sanitárias essas questões de aglomerações (...). Toda aglomeração deve ser dissuadida, independentemente de quem a faça.”

Uso de máscaras

“Desde de que assumi o ministério, tenho reiterado a importância do uso de máscara e das demais medidas sanitárias. Não é tarefa simples, porque depende da adesão da população. É por isso que precisamos passar uma mensagem uniforme.”

Cloroquina

“Não recebi nenhuma orientação do presidente nesse sentido. Eu não autorizei distribuição de cloroquina e não tenho conhecimento de que esteja havendo distribuição.”

“Há um agrupamento de colegas que defende fortemente esse chamado tratamento precoce com esses fármacos e há outros colegas que se posicionam contrariamente. O Ministério da Saúde quer acolher todos para que cheguemos a um consenso. Essa questão do tratamento precoce não é decisiva no enfrentamento à pandemia.”

Aconselhamento paralelo

“Não tenho conhecimento desse aconselhamento paralelo. Fico no Ministério da Saúde na maior parte do tempo e não tenho conhecimento da elaboração desse decreto, do mérito desse decreto.”

Autonomia na gestão

“Recebi uma única recomendação do presidente: para que todos os recursos públicos que chegassem ao Ministério da Saúde fossem revertidos em políticas públicas. Não tratei com o presidente acerca de protocolos, de medicamentos, não houve nenhuma conversa dessa natureza, e o presidente me deu autonomia para que eu constituísse uma equipe técnica. A nossa gestão é autônoma.”

Relação com a China

“Eu desconheço o indício de guerra química vinda da China. As relações com a China, pelo que eu entendo, são excelentes. Inclusive, o Brasil e a China são parceiros comerciais muito sólidos, participam de um bloco econômico importante, e a relação com o embaixador chinês tem sido muito boa. Naturalmente, essa é uma relação em que nós dialogamos quase que semanalmente, liderados pelo ministro das Relações Exteriores (Carlos França). (...) Vamos continuar trabalhando para manter as boas relações que o Brasil tem com a China. No que tange à questão da saúde, eu e o ministro Carlos França estamos trabalhando juntos. Amanhã (hoje), nós temos uma audiência agendada com o embaixador chinês. Eu estou com muitas esperanças de que consigamos ampliar essas ações com a China, independentemente de quaisquer fatos.”

Aceleração da vacinação

“Precisa um ativismo maior do nosso governo, o que tem ocorrido, sob a liderança do ministro das Relações Exteriores, Carlos França. Nós temos um diálogo permanente com a Embaixada da China, da Índia, do Reino Unido, dos Estados Unidos. Então, a parte de relações diplomáticas está fluindo de uma maneira satisfatória. Também temos dialogado com as farmacêuticas que produzem essas vacinas. Enfim, há essa dificuldade em obtenção de doses para acelerar o nosso programa, mas estamos trabalhando para trazer um maior número de doses para o Brasil.”

CPI desconfia de Pazuello

A visita feita pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, em Brasília, repercutiu mal na CPI da Covid. Durante a sessão que tomou o depoimento do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, senadores acusaram o general de agir de má-fé, por ter alegado que não poderia depor à comissão, na quarta-feira, porque esteve com dois servidores federais infectados pela covid-19 e, mesmo assim, se encontrou com Lorenzoni. Houve parlamentares, inclusive, defendendo que o ex-ministro passasse a ser tratado pela CPI como acusado e não mais como testemunha.
Um dos que defenderam uma resposta firme da CPI a Pazuello foi Jean Paul Prates (PT-RN). “Para quem está nos assistindo em casa, isso aqui é um inquérito parlamentar, todos nós sabemos. Mas se aplica o Regimento do Senado, e, subsidiariamente, plenamente, o Código Penal e o Código de Processo Penal. E, no artigo 342, está escrito crime de falso testemunho fazer acusação falsa ou negar ou calar a verdade como testemunha. Quero saber o que a gente faz diante disso”, afirmou o parlamentar.

Na sequência, o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), tentou minimizar a visita de Lorenzoni a Pazuello, ocorrida no Hotel de Trânsito dos Oficiais do Exército, no Setor Militar Urbano (SMU) de Brasília, onde o general mora. A visita ocorreu ontem, segundo revelou o jornal O Estado de S. Paulo.

“Primeiro, torcer para o ex-ministro Pazuello não estar com covid e não contaminar o Onyx. Essa é a primeira coisa. A segunda: não foi o ex-ministro Pazuello que foi ao Onyx. Foi o Onyx que foi fazer uma visita, e isso é uma questão pessoal deles. Ninguém pode proibir alguém de visitar alguém, mesmo que seja um suspeito de covid. Eu não tenho, nós não temos poder para isso”, defendeu. “Ele não está cometendo crime nenhum.”

Apesar da fala de Aziz, as pressões contra Pazuello continuaram. O relator do colegiado, Renan Calheiros (MDB-AL), disse que o general “continua equivocado” e que deve estar querendo ser tratado como acusado. “Nós o estamos tratando dignamente, como testemunha. Ele não é acusado de nada, ele não é investigado. Então, a sutileza da vinda dele como testemunha é muito mais digna. Se ele estiver querendo vir na condição de acusado, aí é uma outra questão”, enfatizou. O parlamentar, porém, descartou qualquer possibilidade de adoção de uma operação de busca e apreensão contra o ex-ministro da Saúde.

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), disse a Aziz que apoiava a fala do relator, sobre a possibilidade de Pazuello passar a ser tratado como acusado pela comissão. “O ex-ministro Eduardo Pazuello, parece-me, considera pedir um habeas corpus para não comparecer a esta comissão. Vossa Excelência não considera o que o relator coloca muito bem, mas isso pode provocar alguma mudança em termos de qualificação (de testemunha para acusado)”, destacou.

Marcos Rogério (DEM-RO), integrante da tropa de choque do governo no colegiado, afirmou que “esse alarde todo faz parecer que a CPI tem poderes para determinar, de maneira cautelar, a suspensão dos direitos civis de membros da sociedade ou de ex-integrantes do governo”. Segundo ele, “querer, neste momento, questionar se ele (Pazuello) recebeu (visita), se não recebeu, com todo o respeito, senhor presidente, isso não é papel da CPI”.
Por sua vez, Fabiano Contarato (Rede-ES), disse que o ex-ministro da Saúde pode ser alvo de uma condução coercitiva. “O comportamento dele foi de má-fé, contraditório. Isso viola a boa-fé objetiva, e uma comissão parlamentar de inquérito tem competência, sim, para determinar a condução coercitiva, caso reste caracterizada a má-fé, como ele está demonstrando”, disse. Calheiros, no entanto, afastou a possibilidade. “O Supremo desfez (condução coercitiva), ela não existe mais, é emblemática de uma época que ficou para trás”, disse o relator, em referência a uma prática muito adotada ao longo da Operação Lava-Jato.

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