Renan apontará culpados

Relator da CPI da Covid assegura que, se as investigações do colegiado confirmarem culpas e omissões pela disseminação da doença pelo país, não se furtará de apresentar seus nomes. Mesmo que entre eles esteja o do presidente Jair Bolsonaro

» Sarah Teófilo
postado em 08/05/2021 22:38 / atualizado em 08/05/2021 22:39
 (crédito: Jefferson Rudy/AFP)
(crédito: Jefferson Rudy/AFP)

O senador Renan Calheiros (MDB-AL), relator da CPI da Covid, afirmou ontem que, se a comissão de inquérito provar alguma responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro no agravamento das mortes pela infecção do novo coronavírus no Brasil, ele será responsabilizado. Até ontem, haviam sido registrados 421 mil óbitos pela doença no país.

“Eu espero que o presidente da República não tenha responsabilidade com o agravamento do morticínio do Brasil. Eu espero que a CPI não chegue a tanto. Mas, se a CPI chegar, não tenho nenhuma dúvida de que ele será responsabilizado, sim”, afirmou em transmissão ao vivo da Rede TVT e do grupo Prerrogativas. Governistas tentaram barrar judicialmente a indicação de Renan para a relatoria da Comissão, mas não conseguiram. Analistas políticos afirmaram que o governo deu um passo equivocado ao tentar vetá-lo, queimando pontes com quem deveria buscar boa relação.

Apesar de afirmar que não torce para incriminar ninguém, o senador criticou o papel do governo no colegiado. Conforme disse, “se o governo usasse melhor as suas energias para esclarecer os fatos, diferentemente do que está fazendo, facilitaria o trabalho da CPI”. Renan também afirmou que é preciso levar em consideração a maneira como o governo desprezou a pandemia. “E como o governo minimizou o papel da vacina, que é o único instrumento que pode resolver o problema, e fechou as portas para os produtores”, disse, citando a Pfizer, mas frisando que não foi só com esse laboratório.

“Fechou a porta para todos, porque o presidente disse várias vezes que não acreditava na vacina, muito menos na chinesa (CoronaVac), e quem ousasse tomá-la viraria jacaré. Não dá para comparar, por tudo isso, a circunstância do Brasil com a de qualquer outro país. Em nenhum outro lugar um chefe de Estado ou de governo esteve publicamente falando esses absurdos para os seus governados, para sua população”, frisou.

O governo federal recebeu ofertas para comprar 70 milhões de doses da vacina da Pfizer, sendo que a primeira proposta foi apresentada em agosto do ano passado. O Ministério da Saúde resistia por não aceitar uma das cláusulas que isentava o laboratório caso alguém que tivesse tomado uma dose apresentasse efeitos colaterais. A empresa, porém, afirmou que os itens apresentados estavam em linha com os acordos fechados em outros países. A situação só foi resolvida depois que o Congresso interveio e aprovou uma lei que autoriza União, estados e municípios a comprarem vacinas contra covid-19 e assumirem os riscos de possíveis efeitos adversos.

Apoio
Para o senador, as afirmações do presidente questionado a eficiência das vacinas são “de uma irresponsabilidade absoluta”, e é preciso investigar. Para isso, pediu também o apoio da sociedade para aprofundar as apurações, frisando que o governo não queria a criação da CPI, que seria em fevereiro, mas foi “arrastada” para abril depois de determinação do Supremo Tribunal Federal (STF).

Renan aproveitou para elogiar as Forças Armadas, dizendo que não é intenção da CPI investigá-las. “Não queremos investigar os militares. Esse não é o nosso papel. Eles não têm que ter nenhum receio. Quem tem que ter receio são os aliados do vírus, que vão ter que responder por tudo”, garantiu.

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello deveria ter ido depor na última terça-feira, mas adiou o depoimento para o dia 19, alegando que teve contato com pessoas que testaram positivo para a covid-19. Para Renan, o general está “criando uma crise nas Forças Armadas muito grande”. “Ele tem usado o fato de ser da ativa para ter o Exército, que é uma instituição respeitável, como biombo para que não vá depor na CPI”, acusou.

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Bolsonaro fará vídeo de "tratamento precoce"

 (crédito: Yuri Cougo Dias/ISHOOT/Estadão Conteúdo)
crédito: Yuri Cougo Dias/ISHOOT/Estadão Conteúdo

O presidente Jair Bolsonaro voltou ontem a insistir na existência de “tratamento precoce” e que, por causa disso, fará um vídeo com seus 22 ministros para relatar quais deles tomaram hidroxicloroquina numa suposta prevenção à covid-19 — ao menos 15 deles foram diagnosticados com o novo coronavírus. Tais drogas defendidas por ele, porém, não têm comprovação científica de eficácia contra a doença e tiveram o uso, com esse objetivo, desaconselhado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Bolsonaro ainda classificou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura os atos e omissões do governo na pandemia de “vexame” e que “só se fala em cloroquina”.

“Sempre perseverei, sempre lutei por aquilo que achava que está certo e continuo dizendo: só Deus me tira daquela cadeira (de presidente). Aquela CPI é um vexame, só se fala em cloroquina. Mas o cara que é contra, não dá alternativa. Tenho certeza que alguém aqui tomou hidroxicloroquina”, disse aos apoiadores na saída do Palácio da Alvorada.

De acordo com o presidente, uma forma de reforçar a campanha de que a cloroquina deve ser utilizada contra a covid-19 é que ministros deem exemplo assumindo qua a usaram contra a doença. “Ontem, eu estava retornando de Rondônia. No avião tinha alguns ministros. A gente vai fazer um vídeo, nesta semana. Vinte e dois ministros e todos aqueles que tomaram hidroxicloroquina vão falar: eu tomei. É a alternativa no momento”, desafiou.

“‘Ah, não tem comprovação científica’. Mas não tem nada cientificamente dizendo o contrário também”, acrescentou. Tal informação, porém, não condiz com o que preconizam órgãos de saúde, tais como a OMS, que se opõe à utilização da substância contra a covid-19.

Na CPI, os ex-ministros Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich manifestaram-se contrários à insistência de Bolsonaro no uso das drogas do “tratamento precoce”. Já o atual ministro da pasta, Marcelo Queiroga, esquivou-se e não tomou posição.

O presidente disse, também, que pedirá aos parlamentares governistas que compõem a CPI uma investigação sobre eventuais mortes por receituário de altas dosagens de cloroquina em Manaus. E reafirmou que será o último a tomar a vacina contra a covid-19. “Vou ser o último a tomar, quem quiser tomar, toma na minha frente. Acho que é um gesto de altruísmo da minha parte.”

Governadores
Bolsonaro criticou os governadores e prefeitos que aderiram ao lockdown e ao toque de recolher, na tentativa de conter a proliferação do novo coronavírus. Até o momento, o Brasil registrou mais de 421 mil mortes causadas pelo vírus. Segundo o presidente, “quem destruiu empregos não foi ele” e, atualmente, “tudo é covid”.

“Não está fácil emprego no Brasil, e quem destruiu não fui eu. Foram governadores e prefeitos, que fecharam tudo. Vou deixar bem claro: por mim, nada seria fechado, porque, se não trabalhar, vai morrer de fome. E tem que enfrentar o vírus. Lamento as mortes, dificilmente alguém não tem um amigo ou parente que não morreu de covid. Ou de suspeita de covid. Tudo é suspeita de covid”, desconfiou.

Ele destacou que o país “sofreu um baque na economia, mas que não foi grande”. “A política do ‘fique em casa’ gerou aumento de inflação e escassez de alguns produtos, mas dá para vencer. Já estamos vencendo”, salientou.

Ele ainda comentou a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello, em julho, no Supremo Tribunal federal (STF). Ele confirmou que escolherá para a vaga um nome “terrivelmente evangélico” e que já tem um favorito, embora recuse-se a dizer o nome. A indicação necessita do aval do Senado.

“Em 5 de julho, 4 de julho, vai ser um terrivelmente evangélico. Já tem um cotado aí, por enquanto é ele, mas não está batido o martelo”, salientou.

Um dos nomes mais fortes da lista é o do advogado-geral da União (AGU), André Mendonça, que também é pastor presbiteriano. Bolsonaro ainda sugeriu que o STF deveria iniciar as sessões com uma oração. “Imagina o STF começando a sessão com orações por parte desse ministro?”

Negação de racismo

O presidente Jair Bolsonaro comentou, ontem, com apoiadores que sempre questionou as cotas raciais — dispositivo pelo qual vagas em universidades e concursos são destinadas a candidatos declarados não brancos —, mas que não é racista. A observação foi por conta da ironia que fez, no último dia 6, com um apoiador que foi cumprimentá-lo na saída do Palácio da Alvorada e tinha um “black power”. Bolsonaro disse que estava vendo uma “barata” na cabeça dele — uma insinuação de que aquele tipo de penteado era sinônimo de falta de higiene.

“A imprensa toda contra, os mais variados rótulos. O que mais pegou foi o racismo, e a gente demonstra que não existe isso para mim. Até digo: somos todos iguais. Sempre questionei a questão de cotas. Acho que a cota eleva o homem pela cor da sua pele como subalterno ao outro de cor de pele diferente. Somos iguais. O meu sogro é o Paulo Negão”, justificou.

Bolsonaro tentou afastar o rótulo de racista citando o episódio no qual foi receber, ao desembarcar no último dia 5, o motorista Robson Nascimento, que trabalhava para Fernando — meio-campista que atuava no Spartak de Moscou e que hoje está no Beijing Guoan, da China —, e ficou dois anos preso por mais de dois pela acusação de tentar entrar ilegalmente na Rússia com um medicamento legalizado no Brasil, mas proibido em território russo, o Mytedon (Cloridrato de Metadona).

“Essa semana, o afrodescendente Robson veio da Rússia. Um trabalho longo para a gente trazer de volta um inocente”, disse. (IS)

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