CLOROQUINA

CPI da Covid: Nise Yamaguchi terá que explicar gabinete paralelo

Senadores pretendem inquirir a médica Nise Yamaguchi sobre a articulação, no Palácio do Planalto, para modificar regras da Anvisa a fim de adotar a hidroxicloroquina. Mas governistas não esperam maiores danos com o depoimento

Luiz Calcagno Sarah Teófilo
postado em 01/06/2021 06:00
 (crédito: YouTube/Reprodução)
(crédito: YouTube/Reprodução)

A Comissão parlamentar de Inquérito da Covid ouve, a partir das 9h de hoje, a médica e pneumologista Nise Yamaguchi, entusiasta da hidroxicloroquina, medicamento sem eficácia comprovada contra a doença. Os senadores de oposição vão focar o depoimento em perguntas sobre o gabinete paralelo. O depoimento de Nise não é visto como decisivo, mas importante para “amarrar pontas soltas”, possibilitando a coleta de mais elementos sobre a sua existência e sobre os integrantes. O gabinete seria um assessoramento paralelo que alimentaria o presidente da República com informações negacionistas no combate à pandemia de coronavírus.

Ela também deverá responder questionamentos sobre o uso de cloroquina no tratamento de pacientes com covid-19. Não existe comprovação científica de que o remédio tenha eficácia comprovada contra a doença, apesar de ter sido amplamente indicado pelo presidente Jair Bolsonaro e por outros integrantes do governo no chamado “tratamento precoce”, algo que também não existe em relação à covid. Assim, as informações básicas a serem exploradas hoje devem girar em torno da participação dela no gabinete, com informações sobre uso de cloroquina, tratamento precoce, e a participação de Nise no processo de convencimento de integrantes do governo; além de quem participava das reuniões.

Os questionamentos virão, principalmente, pelo depoimento do presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Barra Torres, que afirmou ter participado de uma reunião no Palácio do Planalto para discutir um possível decreto para mudar a bula da cloroquina. Na ocasião, Torres afirmou que Nise se encontrava e que ela pareceu estar “mobilizada”com a possibilidade. Nise, por sua vez, afirmou que “já existem evidências científicas comprovadas para o uso de medicações que possam auxiliar no combate às fases iniciais da covid-19”. O nome do tenente-médico Luciano Dias Azevedo, da Marinha, já foi apontado como o possível autor da referida minuta da mudança da bula.

A reportagem apurou que no Palácio do Planalto, não existe uma preocupação grande com o depoimento da médica. A ideia é que ela, como profissional, deve focar seu depoimento no lado médico, esquivando-se das perguntas sobre o gabinete e indicando que foi apenas convidada a algumas reuniões. Eles avaliam esta semana como tranquila e já se prepararam para eventuais depoimentos de governadores. A preocupação, nesse caso, é que os gestores consigam suspender as convocações no Supremo Tribunal Federal (STF) e que acabem indo à CPI como convidados os governadores contrários ao governo federal.

“História ridícula”
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) afirma que Nise Yamaguchi e a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Mayra Isabel Correia Pinheiro, são figuras chave para comprovar a existência do gabinete paralelo. “A fala dela vai nos esclarecer, vai confirmar aquilo que a gente já veio trazendo. A existência do gabinete. O governo não assumiu a permanência (dos membros do gabinete) em cargos, mas buscou orientação na condução da política pública. Deixou de lado a ciência. Quantas vezes ela sentava, como se dava esse gabinete?”, questionou.

O principal defensor do governo no colegiado, Marcos Rogério (DEM-RO), minimiza a ida da médica à CPI. Ele destaca que a oposição “forçou” a convocação de Yamaguchi à CPI para tentar comprovar a existência de um gabinete paralelo e a participação da pneumologista no grupo. “Essa história de gabinete paralelo, respeitosamente, chega a ser hilária, ridícula. O presidente consulta a quem quer, ouve a quem quer”, argumentou. 

 

Gabinete paralelo

Confira momentos em que a suspeita sobre a existência de um gabinete paralelo de aconselhamento ao presidente apareceu ao longo da CPI: 

Luiz Henrique Mandetta - 4/5
O ex-ministro da Saúde revelou a existência de uma “assessoria paralela” de aconselhamento do presidente Jair Bolsonaro e disse que o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro (Republicanos), filho do presidente, costumava participar de reuniões ministeriais no Palácio do Planalto. “Testemunhei várias vezes reunião de ministros em que o filho do presidente, que é vereador do Rio de Janeiro, estava sentado atrás dele tomando notas. Eles tinham reuniões dentro da Presidência”, afirmou.

Nelson Teich - 5/5
O ex-ministro da Saúde disse que saiu da pasta por falta de autonomia, em especial quanto ao uso da cloroquina no tratamento da covid-19; "Minha convicção pessoal, baseada em estudos: naquele momento não existiam evidências de eficácia para liberar. Existia um entendimento diferente por parte do presidente, amparado na opinião de outros profissionais"

Barra Torres - 11/5
Diretor-presidente da Anvisa afirmou que a proposta de mudanças na indicação da hidroxicloroquina foi apresentada pela médica Nise Yamaguchi, presente em uma reunião no Planalto. Segundo ele, também participaram um médico, sentado ao lado de Yamaguchi, e o general Braga Netto, então ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República e coordenador do comitê interministerial criado para coordenar as ações federais na pandemia. “O documento (minuta de decreto tratando de alterações na bula da hidroxicloroquina) foi apresentado pela doutora Nise Yamaguchi, o que provocou uma reação deselegante minha."

Carlos Murillo - 13/5
Presidente da Pfizer na América Latina afirmou que o vereador Carlos Bolsonaro participou de uma reunião da Pfizer, no Palácio do Planalto, em dezembro do ano passado. A reunião, no dia 7 de dezembro, havia sido lembrada pelo ex-secretário de Comunicação Fábio Wajngarten, mas ele não citou o filho do presidente.

 

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