O presidente da Argentina, Alberto Fernández, afirmou, ontem, que os mexicanos vêm de indígenas, brasileiros da selva e argentinos da Europa. Durante encontro com o presidente espanhol, Pedro Sánchez e empresários, na Casa Rosada, o mandatário disse ser “europeísta”. “Sou alguém que acredita na Europa, porque Octavio Paz (escritor mexicano) escreveu uma vez que os mexicanos vieram dos índios, os brasileiros vieram da selva, mas nós argentinos viemos dos navios. Eram navios que vinham de lá, da Europa. E é assim que construímos nossa sociedade”, destacou.
Diante da repercussão negativa, Fernández se desculpou pelo Twitter. “Na primeira metade do século XX, recebemos mais de 5 milhões de imigrantes que conviveram com nossos povos nativos. Nossa diversidade é motivo de orgulho”, enfatizou. “Eu não queria ofender ninguém. Em qualquer caso, quem se sentiu ofendido ou invisível, desde agora minhas desculpas.”
O vídeo com a polêmica declaração já havia se tornado viral, com fortes reações negativas, inclusive no Brasil. A senadora Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, foi às redes sociais. “Não vou comentar o que vomitou o Bolsonaro Portenho. Brasil e Argentina estão padecendo da mesma moléstia. Só loucura e preconceito”.
O deputado Aécio Neves (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores na Câmara, também se manifestou. “É lamentável a declaração preconceituosa feita pelo presidente Fernandéz. O tom depreciativo que reproduz uma visão colonialista, atrasada e superada da história merece repúdio”, disse. Arlindo Chinaglia (PT-SP) também repudiou a atitude do presidente argentino. “O primeiro atingido foi ele (Fernández), que se comportou como bajulador em frente a outro governante. Se colocou na condição de bajulador de governante europeu.”
Sem citar o colega argentino, o presidente Jair Bolsonaro publicou, em uma rede social, foto com indígenas em São Gabriel da Cachoeira (AM). O chefe do governo brasileiro escreveu a palavra “Selva!”, saudação militar que significa “tudo bem”.
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MPF denuncia assessor de Bolsonaro
O Ministério Público Federal (MPF) denunciou, ontem, o assessor especial para Assuntos Internacionais da Presidência, Filipe Martins, por fazer um gesto com conotação racista durante sessão do Senado, em março. Na avaliação do órgão, o assessor “agiu de forma intencional e tinha consciência do conteúdo, do significado e da ilicitude do seu gesto”.
Ele responderá segundo a lei de crimes raciais por ter praticado e induzido a discriminação e o preconceito de raça. Pode ser condenado à prisão, ao pagamento de multa mínima de R$ 30 mil e à perda de cargo público.
O denunciado alegou que o movimento seria apenas para arrumar a lapela do terno, mas uma perícia minuciosa concluiu que as ações foram incompatíveis com um possível ajuste da roupa. A ação foi enviada à 12ª Vara de Justiça Federal e contou com informações reveladas por inquérito conduzido pela Polícia Legislativa do Senado.
A denúncia apontou que Martins apresenta padrão de comportamento e de difusão de ideias ou de símbolos extremistas. A peça cita diversos tuítes postados por ele em redes sociais contendo frases e citações com referências históricas utilizadas por militantes racistas e assassinos.
“Não é verossímil nem casual que tantos símbolos ligados a grupos extremistas tenham sido empregados de forma ingênua pelo denunciado, ao longo de vários meses em que ocupa posição de poder na estrutura da administração pública federal, nem que sua associação a grupos e ideias extremistas tenha sido coincidência em tantas ocasiões”, argumentam os procuradores na denúncia.
De acordo com o MP, a ação de Martins se enquadra no chamado dog-whistle politics. O termo faz referência a uma mensagem codificada, que é transmitida por meio de gestos, palavras ou imagens, discretos ou dissimulados, e a princípio insuspeito, cujo sentido implícito, contudo, é facilmente compreendido por um determinado grupo de indivíduos, mas não pela generalidade da população. Em outras palavras, para a população em geral, não passará de conteúdo inofensivo ou “inocente”.
No início de maio, a Polícia Legislativa do Senado decidiu indiciar o assessor — que dá expediente no Palácio do Planalto e integra a ala ideológica do governo Bolsonaro —, enquadrando-o no artigo 20 da Lei 7.716, que trata dos crimes de preconceito de raça ou de cor. Foi com base nesse inquérito que o MPF enviou a denúncia à 12ª Vara da Justiça Federal do DF.